O indicado pela Casa Branca para a Suprema Corte, Brett Kavanaugh, negou veementemente aos senadores do Comitê de Judiciário ter tentado estuprar a professora de psicologia Christine Blasey Ford. Poucas horas antes, na mesma sala, ela havia declarado ter “100% de certeza” de ter sido vítima da tentativa de estuprá-la em uma festa em 1982.
Desde a acusação de Ford, há dez dias, duas outras mulheres declararam ter sido atacadas sexualmente pelo juiz da Corte de Apelação dos Estados Unidos, em Washington. “Eu sou inocente, sou inocente desta acusação”, afirmou o juiz, de 53 anos de idade.
Kavanaugh repetiu a mesma frase em diferentes maneiras e em vários pontos da audiência, tanto em sua fala inicial como ao responder a perguntas dos senadores. “Eu nunca tive relação sexual e nada perto disto durante a escola secundária e por muitos anos depois disto. Eu gostava de cerveja. Ainda gosto. Mas não tomei cerveja a ponto de perder a consciência e nunca ataquei sexualmente ninguém. Não (sou estuprador).”
Kavanaugh chegou a jurar por Deus, ao responder ao senador republicano John Kennedy, não ter cometido a tentativa de estupro de Ford “e de nenhuma outra pessoa”. “Estou 100% seguro disso.”
Ao final de quase quatro horas de audiência, os ânimos pareciam divididos no Comitê de Judiciário. Os senadores se reunirão amanhã para deliberar a questão. Se a maioria concordar com a indicação de Kavanaugh, o plenário do Senado americano deverá votar na semana que vem.
A insistência do presidente americano, Donald Trump, em manter a designação do conservador Kavanaugh para o lugar do ministro Anthony Kennedy na Suprema Corte, depois da denúncia de Ford, expôs o juiz a um dos inquéritos mais constrangedores desde os tribunais macartistas dos anos 1950. O mesmo ocorrera com a psicóloga Christine Ford horas antes.
A reputação de ambos, Kavanaugh e Ford, foi afetada pelas audiências. Ambos estremeceram em vários pontos dos seus interrogatórios e, com dificuldades, evitaram chorar diante dos senadores e das câmeras. Kavanaugh esteve a ponto de desabar, em especial quando mencionou a filha de 10 anos e as ameaças sofridas por sua mulher.
Kavanaugh, entretanto, começou seu discurso em tom de enfrentamento ao dizer que aquela audiência para confirmação de sua designação havia se tornado “uma desgraça nacional”. Acusou, em seguida, os senadores de terem substituído o “conselho e o consentimento”, na audiência, pela “perseguição e destruição”.
Também condenou os senadores democratas por terem procurado razões para “afundá-lo” e por terem se voltado a “acusações obscuras”, como para afogar as suas mágoas pela vitória de Trump nas eleições de 2016.
Em um dos momentos mais críticos da audiência, o senador democrata Dick Durbin desafiou Kavanaugh a voltar a Trump e pedir-lhe para retirar sua indicação, suspender a audiência no Senado e enviar o caso ao FBI para investigação. “Se suas alegações são verdadeiras, o FBI comprovará”, alegou Durbin.
Como Kavanaugh esquivava-se a dar uma resposta afirmativa à proposta, Durbin perguntou-lhe insistentemente por que ele resistia à abertura de uma investigação do FBI. Ao final, o juiz calou-se. “Eu acho que a investigação fará bem aos dois lados”, concluiu Durbin, cuja ideia foi apoiada pela sua colega democrata Amy Klobuchar.
Como já havia explicado antes, Kavanaugh insistiu que o FBI não chegaria a uma conclusão. Em vários momentos, alegou que se apresentava àquela audiência para limpar seu nome. “Eu nunca conseguirei minha reputação de volta”, lamentou-se.
Presidente do comitê, o senador republicano Lindsey Graham declarou ser aquela audiência “a coisa mais desprezível que vi em toda a minha vida política”. Graham esticou ainda mais a corda, com perguntas das mais constrangedoras para Kavanaugh, para extrair dele respostas diretas e claras.
“Você é um estuprador que atua em grupo?”, perguntou. “Não”, respondeu Kavanaugh. “Isto aqui não é uma entrevista para um emprego. Isto é o inferno”, afirmou Graham, para acusar em seguida os senadores democratas de “destruir a vida” do juiz.
Kavanaugh passara antes por vários dias de audiências no mesmo comitê, antes da denúncia de Ford. A disputa entre republicanos e democratas em torno da sua indicação mostrava-se dura. Seu voto na Suprema Corte tenderá a reforçar o caráter conservador do mais alto tribunal dos Estados Unidos – algo que os republicanos e o próprio Trump desejam e que os democratas querem evitar.