Novo premiê canadense herda disputas tarifárias com Trump e ameaças de anexação
Mark Carney terá que lidar com país vizinho enquanto tenta amenizar crescente descontentamento da população com situação econômica

O partido Liberal do Canadá anunciou, no domingo, 9, que Mark Carney será o substituto de Justin Trudeau no cargo de primeiro-ministro do país. Uma vez no comando do governo, ele terá que lidar com uma crescente guerra tarifária iniciada pelo presidente americano, Donald Trump, ameaças de anexação por parte dos vizinhos e crescente descontentamento da população com a situação econômica.
Carney contou com 86% dos votos dos cerca de 152 mil votantes. O ex-membro do banco central já era considerado o favorito na corrida, com apoio da maior parte dos 400 mil membros do partido com direito de voto, além de ter levantado a maior quantia de dinheiro para a sua campanha. Ele disputava contra a ex-vice-primeira-ministra Chrystia Freeland, a parlamentar Karina Gould e o empresário Frank Baylis.
Carney, 59 anos, é originalmente da área das finanças e nunca ocupou um cargo eletivo. Em 2019 foi nomeado enviado especial da ONU para Ação Climática e Finanças, fazendo da energia limpa, das políticas climáticas e da prosperidade econômica para o Canadá algumas das peças centrais de sua campanha — também focada em seu papel em ajudar o governo a lidar com a dívida durante a crise financeira de 2008, quando era chefe do Banco do Canadá.
Ele prometeu acabar com um imposto impopular sobre o carbono para o consumidor, interromper um aumento planejado no imposto sobre ganhos de capital e prometeu remover barreiras ao comércio dentro do Canadá. Ele prometeu dobrar o ritmo de construção de novas moradias ao longo de 10 anos e limitar os níveis de imigração, uma mudança na política iniciada por Trudeau em resposta a uma reação negativa sobre a escassez de moradias e os altos preços.
Apesar da expertise econômica, Carney terá o desafio intenso de lidar com o governo Trump, em meio à guerra tarifária e as ameaças do presidente americano de ter o Canadá como o 51º estado americano.
“Os americanos querem nossos recursos, nossa água, nossa terra, nosso país… se eles tiverem sucesso, eles destruirão nosso modo de vida”, disse Carney em seu discurso de aceitação no domingo à noite. “O Canadá nunca, jamais, fará parte da América de nenhuma maneira, forma ou formato”, disse o novo premiê, na prática mostrando que quer diminuir a dependência em relação a Washington.
Durante a campanha, ele já havia se mostrado como um defensor ferrenho de tarifas retaliatórias dólar por dólar que atingiriam duramente os EUA, mas teriam impacto mínimo no Canadá.
Os Estados Unidos devem aplicar uma tarifa de 25% sobre o aço e o alumínio canadenses na quarta-feira. Ottawa impôs uma tarifa de 25% sobre mais de 20 bilhões de dólares em importações dos EUA quando Trump anunciou seus planos tarifários iniciais no mês passado. Ontário, a mais populosa das 10 províncias canadenses, deve anunciar nesta segunda-feira que está impondo uma sobretaxa de 25% sobre as exportações de eletricidade para Nova York, Michigan e Minnesota.
Em entrevista recente, Trump reforçou que leva a sério o interesse de que o Canadá se torne o 51º estado dos Estados Unidos, distorcendo números para tentar justificar uma anexação ao país vizinho.
“Acredito que o Canadá estaria muito melhor como o 51º estado porque perdemos 200 bilhões de dólares por ano com o Canadá. E não vou deixar isso acontecer”, afirmou. “Por que estamos pagando 200 bilhões de dólares por ano, essencialmente um subsídio, ao Canadá?”
Washington, claro, não subsidia o Canadá. Ao invés disso, os Estados Unidos compram produtos canadenses, incluindo commodities, como o petróleo. Os EUA importam mais produtos canadenses do que exportam ao norte da fronteira — um déficit comercial. Esses números são pequenos em relação ao cerca de 1 trilhão de dólares em bens e serviços que cruzam a fronteira nos dois sentidos a cada ano. Também são menores em comparação a outros mercados. Dados do U.S. Census Bureau mostram que o déficit comercial dos EUA com o Canadá foi apenas o décimo maior em 2023.
Embora o déficit comercial em bens tenha aumentado nos últimos anos, chegando a 72 bilhões de dólares em 2023, ele reflete em grande parte as importações de energia canadense pelos EUA.