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O Brasil não tem liderança nenhuma, diz ex-embaixador sobre Venezuela

Rubens Barbosa afirma que governo brasileiro caiu na própria armadilha ao se intrometer nas eleições no país vizinho e manter relações ideológicas com Maduro

Por Laryssa Borges Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 17 ago 2024, 13h42
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  • Embaixador do Brasil em Londres (1994-1999) e em Washington (1999-2004), o diplomata Rubens Barbosa é uma das vozes mais eloquentes na análise sobre a infrutífera postura do governo brasileiro diante de todos os indícios de que a reeleição do ditador Nicolás Maduro, na Venezuela, foi fraudada. Por vezes contemporizadora – como quando o presidente Lula disse que não via “nada de anormal” no processo eleitoral ou quando afirmou que não via no país vizinho uma ditadura –, por vezes com ares de intromissão, quando o petista sugeriu a convocação de novas eleições, as atitudes de Brasília são, na avaliação de Barbosa, evidências de que o Brasil perdeu há tempos a liderança que uma dia teve na América Latina. Para o diplomata, porém, nem tudo está perdido. A seguir os principais trechos da entrevista.

    Como o senhor avalia a postura do presidente Lula de estender a mão a Maduro mesmo com evidências de fraude nas eleições? Há uma visão ideológica em tudo que está acontecendo na postura do Brasil em relação à Venezuela. O governo brasileiro caiu na própria armadilha que armou. Lula ficou falando o tempo todo da eleição na Venezuela. Naquilo que é importante e que foi ressaltado em uma carta pessoal de 23 presidentes a ele, que é a defesa dos direitos humanos e da democracia na Venezuela, estamos calados. O recado era: ‘Lula, você deve defender fora os mesmos valores que você defende dentro do Brasil’.

    O Brasil tem a relevância que acha que tem na América Latina? O Brasil deveria ser muito mais relevante na América Latina. Nos últimos governos, o continente foi deixado de lado, em segundo plano, e não temos hoje liderança nenhuma. Na eleição da Venezuela, por exemplo, o primeiro grupo que se manifestou sobre a preocupação de como a eleição seria apurada foi liderado pelo Uruguai, e não pelo Brasil.

    Somos hoje uma voz menor hoje nas negociações sobre o futuro da Venezuela? No caso da Venezuela, perdemos a liderança porque nada que o Brasil está propondo avança de fato. Por uma série de razões, temos limites na política externa. Não tem como querermos ser o patrocinador da paz na Ucrânia ou em Gaza e fazer mediação na Venezuela sem sequer falar com a principal líder da oposição a Maduro.

    No cenário ideal, qual deveria ser a postura do Brasil em relação à Venezuela? Não consigo entender por que o Brasil continua a interferir nos assuntos internos da Venezuela. A Venezuela é importante para o Brasil por questões de fronteira, crimes transnacionais, dívida, refugiados. O Brasil tem muitos interesses e não podemos romper relações, mas tampouco podemos servir de manobra dos Estados Unidos e da Europa, que agora dizem como o país deve se portar no caso Maduro.

    Em relação à relevância do Brasil como ator de peso na América Latina, o que é possível esperar para o futuro? Estamos vivendo um ponto fora da curva. Isso não é historicamente a posição do governo brasileiro. O governo brasileiro liderou tudo na região e estava na linha de frente de ações como o Mercosul, a integração regional, o tratado de defesa. Tínhamos que liderar a integração plena na América Latina, mas não há uma coordenação interna da região por falta de liderança do Brasil. O Brasil está perdendo hoje a capacidade de influir nos rumos econômicos, políticos e financeiros da região. Mais à frente, no futuro, poderemos voltar ao nosso papel.

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