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O que significa a visita do papa Francisco ao Iraque?

Depois de duas décadas tentando levar um papa à terra natal de Abraão, Vaticano avança com a viagem mesmo com ameaças da pandemia e terrorismo

Por Amanda Péchy Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 mar 2021, 13h34 - Publicado em 4 mar 2021, 13h29
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  • Após muita controvérsia envolvendo possíveis surtos de coronavírus e o perigo do extremismo islâmico, o papa Francisco vai iniciar sua turnê pelo Iraque nesta sexta-feira, 5. Ilhado no Vaticano pela pandemia, esta será sua primeira viagem ao exterior em 15 meses, com objetivo de fornecer apoio moral às minorias cristãs sitiadas na região e construir pontes com o mundo muçulmano.

    Cristianismo no Iraque

    A visita de 5 a 8 de março se concretiza depois de duas décadas de tentativas de trazer um papa ao local de nascimento de Abraão, profeta considerado o patriarca do judaísmo, islamismo e cristianismo.

    De acordo com o Annuario Statistico, a publicação anual do Vaticano que acompanha o número de cristãos no mundo, havia cerca de 1,5 milhão de fiéis iraquianos em 2003, na véspera da invasão liderada pelos Estados Unidos. A derrubada de Saddam Hussein, e de seu regime essencialmente secular, desencadeou anos de caos e sectarismo no país – com cristãos frequentemente na linha de fogo.

    Entre 2003 e 2008, a população cristã do Iraque caiu pela metade. Mais de 65 igrejas foram atacadas e houve um êxodo em massa de refugiados para países vizinhos como Jordânia e Síria, ou mais longe, na Europa e Estados Unidos.

    Depois disso, em 2014, o jovem Estado Islâmico deu início ao apagamento de minorias religiosas, incluindo cristãos, no que foi classificado como genocídio pelas Nações Unidas. Entre as atrocidades cometidas no Iraque estão assassinatos, escravidão, deportações forçadas, prisões, tortura, sequestro de mulheres e crianças, exploração e violência sexual. O objetivo era aniquilar o pluralismo religioso e estabelecer uma região “puramente islâmica”.

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    Apesar da redução da influência da organização terrorista – que chegou a controlar cerca de 40% do território iraquiano e, agora, tem cerca de 2% –, minorias religiosas ainda sofrem as consequências dos ataques, esperando alguma forma de reparação ou medidas para garantir que tenham um futuro no país.

    Com a visita histórica, o Vaticano pretende mostrar que os cristãos que restaram não estão sozinhos. Mas ninguém sabe quantos cristãos se reunirão para testemunhar a visita histórica do papa, já que, atormentado por conflitos, o Iraque não realiza um censo desde 1997 e o Annuario Statistico não possui estimativas atuais.

    Risco epidemiológico

    Mesmo se as multidões de fiéis sejam menores que o esperado, especialistas em doenças infecciosas expressaram preocupação com a turnê, devido ao aumento acentuado das infecções pelo novo coronavírus no país – que, para completar, possui um sistema de saúde frágil por conta de anos de crise econômica. Os eventos podem gerar riscos de “superpropagação”, reporta o portal Politico.

    No domingo 28, o próprio embaixador do Vaticano no Iraque, acompanhante principal de Francisco na viagem, testou positivo para a Covid-19 e iniciou isolamento social. Além disso, estudos mostram que a maioria das novas infecções no país são pela variante do Reino Unido, mais contagiosa que a original.

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    O Ministério da Saúde tem notificado cerca de 4.000 casos por dia, mas suspeita-se que o número seja maior. O número de infecções em 24h dobrou em menos de uma semana e o governo impôs novas restrições, como toque de recolher e fechamento de escolas e mesquitas. Restaurantes podem funcionar apenas com serviço de entrega.

    Os organizadores da turnê prometeram impor a obrigatoriedade do uso de máscaras, distanciamento social e capacidades limitadas de lotação, assim como a possibilidade de aumentar os locais de teste. Enquanto isso, o Vaticano tomou suas próprias precauções, vacinando o papa de 84 anos, toda sua comitiva de 20 membros e os mais de 70 jornalistas que o acompanharão no avião papal.

    O problema é que os iraquianos que irão assistir às missas de Francisco, ouvir seus discursos e participar de suas reuniões de oração não estão vacinados. A campanha só começou na terça-feira 2, depois que a China presenteou a nação com 500.000 doses do imunizante da Sinopharm. A Organização Mundial da Saúde respondeu diplomaticamente à situação, dizendo que o governo deveria avaliar o status da pandemia para tomar decisões.

    O papa Francisco frequentemente faz discursos pedindo por uma distribuição igualitária de vacinas e o respeito às medidas sanitárias impostas pelos governos. Por meses, ele evitou até mesmo reuniões com distanciamento social no Vaticano, temendo o contágio. Contudo, ele afirmou que pretende ir ao Iraque mesmo que a maioria dos cidadãos tenha que assisti-lo pela televisão para evitar infecções.

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    Em entrevista ao Catholic News Service, Francisco disse que o importante é que “eles verão que o papa está lá em seu país”.

    Ameaça terrorista

    Além do coronavírus, o governo iraquiano prometeu alta segurança contra extremistas nas seis cidades que a comitiva visitará. Embora atentados com bombas e outros ataques violentos tenham diminuído nos últimos anos, pelo menos 32 pessoas foram mortas e mais de 100 ficaram feridas em um atentado suicida duplo em um mercado de Bagdá no mês passado.

    “A visita acarreta riscos, e o papa corre os riscos porque se vê como pastor, como pai, como aquele que vai a quem está em dificuldade. Quanto à segurança, acredito que o governo iraquiano tomará todas as medidas para garantir que a visita seja tranquila”, disse o cardeal Leonardo Sandri, da Congregação para as Igrejas Orientais do Vaticano, à revista America.

    A turnê começará em Bagdá com uma cerimônia no palácio presidencial e um encontro com o presidente Barham Salih e o primeiro-ministro Mustafa al-Kadhimi. O pontífice também se encontrará com bispos, padres e outras pessoas na catedral siro-católica de Nossa Senhora da Salvação.

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    No sábado, ele viajará para o sul, para a cidade sagrada de Najaf para encontrar o Grande Aiatolá Ali al-Sistani, influente clérigo xiita. Francisco é conhecido por construir relacionamentos sólidos com líderes muçulmanos, como a declaração histórica de fraternidade assinada em 2019 com o xeque Ahmed al-Tayeb, imã do Cairo e maior liderança sunita do mundo.

    Para a pequena comunidade cristã do Iraque, o destaque da viagem será a visita de Francisco ao norte do país, onde rezará em um memorial pelas vítimas do Estado Islâmico e visitará uma grande igreja em reconstrução.

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