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Os efeitos do reconhecimento da Palestina por Espanha, Noruega e Irlanda

Medida abre caminho para a criação de um Estado palestino e aponta para erosão da influência americana no processo de paz no Oriente Médio

Por Amanda Péchy
Atualizado em 22 Maio 2024, 10h48 - Publicado em 22 Maio 2024, 10h17

Foi um movimento cuidadosamente coreografado. Na manhã desta quarta-feira, 22, em declarações quase simultâneas e após semanas de discussões, os governos da Noruega, Espanha e Irlanda afirmaram que pretendem reconhecer o Estado da Palestina.

Os fatos

A Noruega, antiga protagonista das negociações diplomáticas no Oriente Médio e patrocinadora dos acordos de Oslo na década de 1990, afirmou que a medida era necessária para apoiar vozes moderadas no meio da violenta guerra em Gaza, que já dura mais de sete meses.

“Devemos manter viva a única alternativa que oferece uma solução política tanto para israelenses como para palestinos: dois Estados, vivendo lado a lado, em paz e segurança”, afirmou o primeiro-ministro norueguês, Jonas Gahr Støre.

O premiê da Espanha, Pedro Sánchez, acusou seu homólogo israelense, Benjamin Netanyahu, de levar a cabo um “massacre” em Gaza e de pôr em risco a solução de dois Estados. “Temos que usar todos os recursos políticos à nossa disposição para dizer, em alto e bom som, que não vamos permitir que a possibilidade da solução de dois Estados seja destruída”, declarou.

Já o primeiro-ministro irlandês, Simon Harris, afirmou esperar que outros países também reconheçam um Estado palestino nas próximas semanas.

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O que acontece agora?

Noruega, Espanha e Irlanda afirmaram que reconhecerão formalmente a Palestina em 28 de maio. No entanto, pode não acontecer nada concreto por muito tempo.

Afinal, a Suécia tornou-se o primeiro país da União Europeia a reconhecer um Estado palestino há quase dez anos, em outubro de 2014. Na época, o ministro das Relações Exteriores sueco disse: “É um passo importante que confirma o direito dos palestinos à autodeterminação. Esperamos que isso mostre o caminho para outros países.”

Além disso, cerca de 140 dos 193 Estados-membros das Nações Unidas reconheceram a condição de Estado palestiniano desde 1988. E, até hoje, não há um país chamado Palestina. O Reino Unido também indicou que poderia considerar o reconhecimento da Palestina em meio a uma frustração mais profunda com Israel – sobretudo durante a era Netanyahu – por não avançar claramente no sentido de uma solução de dois Estados, ao passo que continua apropriando terras palestinas para colonização.

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O processo de paz pode acelerar – ou se deteriorar?

O grande mediador das negociações de paz entre israelenses e palestinos desde a fundação do Estado judaico em 1948 tem sido os Estados Unidos. Mas o tema deixou de ser prioridade na política externa americana na última década, especialmente durante o governo do ex-presidente Donald Trump, que decidiu fazer da aproximação com ricos países árabes um norte para a estratégia americana no Oriente Médio. Com os Acordos de Abraão, a ideia era normalizar relações entre americanos e Arábia Saudita, Emirados Árabes, Bahrein, entre outros, para obter bons negócios.

Nisso, a solução de dois Estados foi quase que caindo no esquecimento, em estado moribundo até a eclosão da guerra em Gaza, em outubro passado.

Nesse meio tempo, autoridades palestinas vêm desviando-se dos Estados Unidos e tentando angariar apoio em outro lugar – a Europa. Agora, o reconhecimento de um Estado palestino dá um passo tangível em direção a um caminho político viável que conduza à independência.

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Qual o impacto prático?

O reconhecimento da Palestina pode ser uma faca de dois gumes para a impopular, fraca e corrupta Autoridade Palestina (AP) de Mahmoud Abbas, que governa na Cisjordânia ocupada. Não há eleições legislativas desde 2006, e o próprio Abbas não tem mandato popular.

Por enquanto, a decisão da Noruega, Espanha e Irlanda não deve mudar nada na vida na Cisjordânia, onde aumentam os ataques das forças israelenses e dos colonos judeus contra a população e terras palestinas. No entanto, pode ajudar a revigorar uma sociedade civil palestina que foi sufocada na era Abbas. Talvez o mais importante seja algo menos tangível: uma indicação de que a Palestina tem direito à autodeterminação, e que isso não depende do “sim” ou “não” de Israel.

Para Israel, a medida surge logo após Netanyahu e o seu ministro da Defesa, Yoav Gallant, virarem alvo do procurador do Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia. O país também é investigado, a pedido da África do Sul, por acusação de genocídio na Corte Internacional de Justiça (CIJ). Os Estados Unidos, o Reino Unido e outros países começaram a impor um regime de sanções contra os colonos judeus e os grupos de extrema direita que atacam palestinos.

Ou seja, apesar de ter incontestáveis aliados, Tel Aviv tem sido cada vez mais tratada como pária, ficando mais isolada diplomaticamente. Isso não necessariamente ameaça o Estado de Israel, como diz Netanyahu, mas levanta sérias questões sobre quanto tempo seu governo pode sobreviver.

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