O avião russo pousou no aeroporto de Pyongyang em torno das 3 da madrugada de quarta-feira 19 de junho — e, apesar do horário, alta madrugada, lá estava o séquito de burocratas do governo da Coreia do Norte diante do imenso tapete vermelho estendido. A visita de Vladimir Putin a Kim Jong-un, os mais novos amigos de infância, representa um passo geopolítico — ou mera provocação — que deixa o mundo em estado de alerta. A parceria dos dois ditadores parece inaugurar um novo momento de uma guerra fria que não para de esquentar. Remonta, apesar das diferenças, ao tempo, antes da queda do Muro de Berlim, em que União Soviética, China e norte-coreanos davam as mãos contra o Ocidente capitalista. Para os Estados Unidos, o namoro de agora restabelece um outro “eixo do mal”. Os interesses são evidentes. A Rússia, depois da agressão contra a Ucrânia, está isolada. A Coreia do Norte se autoimpôs o afastamento da civilidade já faz muito tempo, sentada na bomba atômica, de dentes cerrados contra a vizinha ao sul. Do ponto de vista prático, a dupla selou um “acordo de associação estratégica” que inclui um pacto de “defesa mútua em caso de agressão”. O neoczar de Moscou, ao lembrar que os americanos ofereceram jatos F-16 para as tropas ucranianas, ressaltou não excluir a possibilidade de “cooperação técnico-militar” com os colegas orientais. Kim, com desfaçatez, disse ter assinado um documento “estritamente amante da paz e defensivo”. Acredite quem quiser.
Publicado em VEJA de 21 de junho de 2024, edição nº 2898