Avatar do usuário logado
Usuário
OLÁ, Usuário
Ícone de fechar alerta de notificações
Avatar do usuário logado
Usuário

Usuário

email@usuario.com.br
Super BlackFriday: Assine VEJA a partir de 7,99

Plano dos EUA traz esperança para paz em Gaza — mas vem carregado de incertezas

O acordo aceito por Israel é mais completo e abrangente do que os anteriores. Resta ver se o Hamas aceitará — e se Netanyahu não mudará de ideia

Por Caio Saad Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Amanda Péchy Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 3 out 2025, 12h34 - Publicado em 3 out 2025, 06h00

Bem à sua hiperbólica moda, Donald Trump postou-se ao lado do primeiro-ministro israelense, Benjamin Neta­nyahu, no que definiu como “um grande dia, um dia maravilhoso, potencialmente um dos mais importantes dias da civilização”, para anunciar, na segunda 29, um acordo que pode levar à “paz eterna no Oriente Médio”. Excessos à parte, o ambicioso projeto de vinte pontos (veja no quadro os principais deles) foi recebido, de modo geral, como uma chance, real, embora longe de garantida, de pôr fim à guerra desencadeada por Israel contra o grupo palestino Hamas, em reação ao ataque surpresa em 7 de outubro de 2023 que resultou no massacre de 1 200 pessoas no lado israelense da fronteira com a Faixa de Gaza. O bombardeio sem trégua já matou mais de 66 000 pessoas e isolou o enclave de 2 milhões de habitantes, disseminando fome e doenças. O plano carece de detalhes e cronogramas, mas explicita com clareza pontos cruciais para as duas partes.

arte Israel

A papelada assegura que o território não será anexado por Israel e que seus habitantes não terão de ir embora — ambições da ala extremista do governo Netanyahu — e, ao mesmo tempo, dá à IDF, as forças de defesa israelenses, carta branca para “terminar o serviço” se a proposta, como outras antes dela, for por água abaixo. Boa parte das providências anunciadas já está na mesa há tempos e foi seguidamente sabotada por Israel e pelo Hamas, conforme seus interesses. As diferenças mais notáveis agora são a reunião de várias sugestões — dos Estados Unidos, de outras potências ocidentais, dos países árabes, de negociadores variados — em um documento único e o timing mais favorável: o Hamas, estrangulado, resume a resistência a atos esporádicos, sem chance de causar maiores estragos, e Israel enfrenta uma intensa campanha mundial de repúdio à matança de civis, com danos expressivos à sua reputação e ameaças de represálias internacionais. Fiando-se nesse cenário, Trump se apresentou como avalista-mor da concórdia. Sempre de olho no Nobel da Paz, claro — não ganhá-lo será “um grande insulto ao nosso país”, observou.

A primeira fase do acordo prevê a libertação, nas 72 horas depois da entrada em vigor do cessar-fogo, de todos os reféns israelenses — tanto os cerca de vinte ainda vivos quanto os corpos dos mortos — mantidos em Gaza há quase dois anos. Sem eles, o Hamas perderia sua única moeda de troca nas negociações atualmente. A contrapartida seria a libertação por Israel de 250 prisioneiros palestinos que cumprem pena de prisão perpétua e de cerca de 1 700 detidos depois do ataque de 7 de outubro. “Aceitar significa, na prática, a morte política do Hamas, a prova de que o grupo chegou ao limite. Esse plano representa um primeiro passo na direção da resolução do conflito”, afirma Luís Winter, professor de direito internacional da PUCPR. Ampliando a pá de cal, uma etapa posterior estabelece o desarmamento do grupo e sua remoção total dos destinos de Gaza.

SEM LAR - Cidade de Gaza sob ataque: moradores são obrigados a buscar refúgio em outras regiões
SEM LAR - Cidade de Gaza sob ataque: moradores são obrigados a buscar refúgio em outras regiões (Saeed M.M.T. Jaras/Anadolu/Getty Images)
Continua após a publicidade

Nos termos do acordo, a retirada das tropas israelenses será gradual, uma cláusula vaga que certamente causará fissuras, e mesmo depois de concluída Israel seguirá controlando uma “zona tampão” ao longo do perímetro do território “até que ele esteja devidamente protegido do ressurgimento de qualquer ameaça”. O dia a dia ficaria a cargo de um comitê “tecnocrático e apolítico” formado por “palestinos qualificados” e assessores internacionais, sob supervisão de um “Conselho de Paz” presidido por Trump em pessoa e integrado, entre outros, pelo ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair, autor de algumas propostas. O mesmo conselho deverá supervisionar a reconstrução do enclave em ruínas, com recursos provenientes sobretudo dos ricos vizinhos árabes e o impulso de um “plano Trump de desenvolvimento econômico” com vagas referências, como era de se esperar, a empreendimentos imobiliários. A linguagem, ao menos, é mais profissional do que na trégua abortada de fevereiro, quando o presidente americano acenou com a construção de uma risível “Riviera do Oriente Médio” no local. Em vez disso, segundo a nova proposta, o enclave estaria sendo controlado pela Autoridade Palestina, órgão que já administra partes da Cisjordânia, mas que seria “totalmente reformado”.

A segurança dentro de Gaza, segundo o plano, ficaria sob a responsabilidade de uma “Força Internacional de Estabilização”, que se encarregaria de treinar uma nova polícia local. A entrada de ajuda humanitária seria liberada e ficaria a cargo de agências da ONU e do Crescente Vermelho, a Cruz Vermelha muçulmana. “Os moradores de Gaza estão desesperados para que a devastação acabe. E o Hamas provavelmente sabe muito bem que o plano de Trump, por mais desfavorável que seja para a organização, é a melhor oferta que vai receber dos Estados Unidos e de Israel”, diz Julie Norman, professora de política e relações internacionais no University College London.

PRESSÃO - Manifestação em Tel Aviv: movimento pela volta dos reféns
PRESSÃO - Manifestação em Tel Aviv: movimento pela volta dos reféns (Yair Palti/Anadolu/Getty Images)
Continua após a publicidade

O texto é intencionalmente evasivo no que diz respeito à criação de um Estado palestino, assunto tabu para Israel. “O acordo nem toca nesse tema”, disse Netanyahu. Na verdade, um parágrafo cuidadosamente redigido reconhece a autodeterminação e a criação de um Estado para o povo palestino e sugere que as condições futuras podem abrir caminho nessa direção. Nada muito animador em um momento em que, reagindo à destruição promovida pelo governo israelense em Gaza, França e Reino Unido se uniram aos países — 157 dos 193 representados nas Nações Unidas — que reconhecem a Palestina como país soberano.

O Hamas não havia respondido formalmente à proposta até a quinta-feira 2, e esperava-se que procurasse ganhar tempo exigindo mudanças em alguns pontos. Netanyahu, por sua vez, precisará neutralizar a ferrenha oposição dos partidos religiosos radicais de sua coalizão a qualquer tipo de trégua, encabeçada por dois ministros: o das Finanças, Bezalel Smotrich, que qualificou o acordo de “um retumbante fracasso diplomático” que “terminaria em lágrimas”, e o da Segurança Nacional, Itamar Ben-Gvir, que ameaçou deixar o governo (o que já fez uma vez).

arte Israel

Continua após a publicidade

Depois de passar dois anos driblando cessar-fogos para impedir a implosão de sua maioria e a convocação de novas eleições, Netanyahu, sob pressão de Trump e da própria população israelense, pode agora — se o fim da guerra se concretizar — mudar de posição e tentar se reeleger, apresentando-se como o comandante bem-sucedido que “redesenhou o mapa” do Oriente Médio, com vitórias contra o Hamas em Gaza e o Hezbollah no Líbano, além de um ataque direto contra o arqui-inimigo Irã. Altamente mobilizada em prol da libertação dos reféns, com manifestações cotidianas nas ruas, a população parece ter aprovado a proposta, por falta de outra melhor. Na primeira pesquisa sobre o assunto, realizada no dia seguinte ao anúncio, 72% disseram sim ao acordo. “Há um ar de otimismo nas ruas, mesmo sabendo que a chance de paz é pequena”, disse a VEJA o premiado autor israelense David Grossman.

Enquanto se avalia a possibilidade de trégua, as forças israelenses seguem bombardeando a Cidade de Gaza, a maior do enclave, alvo de uma operação de destruição total desde setembro. Milhares de moradores foram forçados a deixar o local e o ministro da Defesa israelense, Israel Katz, afirmou que o cerco vai se apertar. “Esta é a última oportunidade para os moradores de Gaza irem para o sul e deixarem os integrantes do Hamas isolados”, disse em comunicado. “Quem ficar será considerado terrorista ou apoiador de terroristas.” A expectativa de um cessar-fogo que interrompa o drama dos palestinos deslocados está no ar, junto com o risco de enorme frustração se Trump não convencer o Hamas a aceitar o acordo e não persuadir a comunidade internacional de que, desta vez, controlará o incontrolável Netanyahu. A previsão para Gaza, neste começo de outono, é de rajadas de esperança, com nuvens carregadas de incerteza.

Publicado em VEJA de 3 de outubro de 2025, edição nº 2964

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

SUPER BLACK FRIDAY

Digital Completo

A notícia em tempo real na palma da sua mão!
Chega de esperar! Informação quente, direto da fonte, onde você estiver.
De: R$ 16,90/mês Apenas R$ 3,99/mês
SUPER BLACK FRIDAY

Revista em Casa + Digital Completo

Receba 4 revistas de Veja no mês, além de todos os benefícios do plano Digital Completo (cada revista sai por menos de R$ 7,50)
De: R$ 55,90/mês
A partir de R$ 29,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$47,88, equivalente a R$3,99/mês.