Polícia abre investigação por insurreição contra presidente da Coreia do Sul
Após tentar impor lei marcial, Yoon Suk-yeol também corre risco de sofrer impeachment; seu partido, porém, diz que vai votar contra

A polícia da Coreia do Sul afirmou nesta quinta-feira, 5, que abriu uma investigação contra o presidente do país, Yoon Suk-yeol, por insurreição, após sua tentativa de impor uma lei marcial aos sul-coreanos. A medida, que essencialmente suspende direitos civis em situações de emergência (como guerras ou conflitos) e faz imperar uma gestão militar, foi revogada por parlamentares, que também apresentaram um pedido de impeachment contra Yoon. Seu partido, porém, disse que vai votar contra.
O líder do Partido do Poder Popular, Choo Kyung-ho, prometeu nesta quinta que os deputados da legenda, à qual o presidente é filiado, se “uniriam” contra o pedido de impeachment apresentado pela oposição — que precisa de oito votos da legenda no poder para aprovar a moção. Espera-se que a votação ocorra no sábado, 7.
Se o impeachment for aprovado, o tribunal constitucional da Coreia do Sul decidirá depois se mantém a decisão dos parlamentares — um processo que pode levar até 180 dias. Podem surgir complicações, já que a corte, que deveria contar com um número ímpar de nove juízes, só conta com seis atualmente.
“O povo e os assessores que protegeram o Parlamento nos protegeram com seus corpos. O povo venceu, e agora é hora de protegermos o povo”, disse o deputado Kim Seung-won, do Partido Democrata, principal legenda da oposição. “Yoon cometeu um crime histórico e indelével contra o povo, cuja ansiedade precisa ser acalmada para que possa retornar às suas vidas cotidianas.”
Investigações
Yoon tornou-se alvo de várias investigações após fazer imperar, por seis horas, a lei marcial no país. O procurador-geral da Coreia do Sul ordenou nesta quinta-feira que os promotores investiguem diretamente o presidente e outras autoridades importantes por suposta insurreição. A polícia está conduzindo uma investigação paralela e distinta, pela mesma acusação.
Na mira de ambos inquéritos estão o presidente, o ex-ministro da Defesa Kim Yong-hyun (que renunciou ao cargo na quarta-feira 4, sendo logo substituído pelo embaixador na Arábia Saudita, Choi Byung-hyuk) e o comandante da lei marcial Park An-su, entre outras figuras do governo. Os promotores já determinaram que Kim está proibido de deixar o país, após ser acusado de tentar fugir. Ele negou a alegação.
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Na Coreia do Sul, presidentes não têm imunidade ao crime de insurreição, que pode levar à pena de morte.
Tanto o gabinete do promotor quanto o alto escalão do escritório de investigação de corrupção estão revisando se têm jurisdição para investigar diretamente as alegações de insurreição, ou se devem transferir os casos para a polícia.
O que aconteceu
Yoon mergulhou o país no caos político na noite de terça-feira, depois de declarar lei marcial em um discurso surpresa em rede nacional às 22h30 (10h30 em Brasília). Ele justificou que a medida era necessária para proteger o país de “forças antiestatais” e “ameaças representadas pela Coreia do Norte”, sem dar detalhes.
Em poucas horas, ele foi forçado a rescindir a ordem, depois que centenas de parlamentares desafiaram um bloqueio militar à Assembleia Nacional e se reuniram para uma votação que rejeitou a lei marcial.
Nesta quinta-feira, mais detalhes surgiram da confusão que levou a um dos episódios mais dramáticos da história moderna da Coreia do Sul, que é a quarta maior economia da Ásia e uma importante aliada dos Estados Unidos.
Após a declaração, que em tese proíbe quaisquer atividades políticas e censura à mídia, militares tentaram forçar a entrada no prédio da Assembleia Nacional em Seul, para recuar apenas quando assessores parlamentares os pulverizaram com espuma de extintores de incêndio. Pessoas como o ex-apresentador de rádio Kim Ou-joon foram forçadas a se esconder depois que cerca de dez soldados foram enviadas para seu estúdio do YouTube, no centro de Seul.
O vice-ministro da Defesa, Kim Seon-ho, alegou que discordou da decisão de Yoon e que não havia sido informado com antecedência sobre os planos, acrescentando que a decisão de enviar o Exército ao Parlamento veio de seu ex-chefe, Kim Yong-hyun.
Desconforto no Ocidente
O vice-secretário de Estado dos Estados Unidos, Kurt Campbell, disse que Yoon havia “julgado muito mal” a decisão de impor a lei marcial, o que pegou a Casa Branca de surpresa. Mas não emitiu críticas duras. Segundo ele, a Coreia do Sul se encontra “em uma posição desafiadora” e a meta de Washington é deixar claro que sua aliança com Seul é “absolutamente sólida como uma rocha”.
Quando assumiu o cargo, Yoon foi acolhido por líderes no Ocidente como um parceiro no esforço liderado pelos Estados Unidos para unificar democracias contra o crescente autoritarismo na China, Rússia, Coreia do Norte e outros cantos do mundo.
Mas ele causou desconforto entre os sul-coreanos ao rotular seus críticos como “forças comunistas totalitárias e antiestatais”. Com baixa popularidade (em especial devido à postura linha-dura contra sindicatos trabalhistas), Yoon, junto à esposa, são alvos de acusações de tráfico de influência e mostrou resistência a pedidos de investigação por corrupção contra membros de seu governo.