“Por causa da pressão, escapar de um submarino é a última opção”
Especialista em medicina hiperbárica explica que, caso tripulantes houvessem sobrevivido, a única opção teria sido aguardar um resgate
Até esta quinta-feira, a sociedade argentina parecia viver um transe: apesar de o submarino ARA San Juan haver desaparecido no oceano há quinze dias e de todos os indícios apontarem para uma explosão como a causa do sumiço, poucos no país ousavam em cogitar a possibilidade de que os 44 tripulantes a bordo da embarcação pudessem ter morrido. A fé em um milagre improvável desafiava a racionalidade.
O início do fim para a negação coletiva e a constatação de que provavelmente não se encontrarão sobreviventes veio no início da noite com uma declaração do porta-voz da Marinha argentina, Enrique Balbi, de que o foco das buscas deixaria de ser a busca pelos marujos ainda com vida.
Antes disso, o médico Gustavo Mauvecino, especialista nos efeitos da pressão sobre o corpo humano, conversou com Veja para explicar quais seriam as chances de se escapar de um submarino sob a violenta pressão do oceano a pelo menos 250 metros de profundidade. Ele não chega a dizer abertamente que todos os tripulantes do submarino desaparecido estariam necessariamente mortos. O que ele demonstra cientificamente, porém, é que a sobrevivência dos marinheiros sem um resgate especializado seria quase impossível.
“Com a pressão, não acontece nada com a parte líquida e sólida. O problema é na parte onde tem ar, como ouvidos e pulmões, que vão se contraindo”, diz Mauvecin, que também é diretor do centro de medicina hiperbárica de Mar del Plata e que chegou a ser convocado pelas Forças Armadas nos primeiros dias das buscas.
E quanto mais fundo, maior é a força que o peso do oceano, com toda sua pressão, exerce sobre os corpos. Na parte interna do submarino, a pressão é mantida artificialmente no mesmo nível que à superfície. Contudo, uma tentativa de fuga em grande profundidade seria fatal. “Escapar é sempre a última opção. O que os tripulantes fazem é esperar pelo resgate. O trabalho está em conseguir fazer o oxigênio durar mais tempo”. Quando a embarcação desapareceu, o cálculo é que se tinha entre sete e oito dias de ar.
Segundo Mauvecin, que trabalhou por 18 anos na base naval e esteve muitas vezes no ARA San Juan, o maior escape já registrado foi feito por três ingleses a 120 metros abaixo d’água. “E todos saíram com problemas”, lembra.
Um empecilho adicional: o oxigênio respirado dentro de um submarino é associado a outro gás, o nitrogênio, que se mistura aos tecidos e ao sangue, mas não é processado pelo organismo. “Em um ambiente de alta pressão, o nitrogênio tem no corpo humano efeito similar ao de uma pastilha efervescente”.
Caso a embarcação tenha descido ao fundo do mar com os tripulantes vivos, ainda haveria mais uma adversidade: a hipotermia. “Como a temperatura da água é de 5° C, o metal da embarcação conduz o calor para fora”, diz o médico.
“Não creio que haveria chance de escapar”, resume.