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Presidente do Chile é processado por crimes contra a humanidade

Ação afirma que polícia e militares cometeram homicídios, torturas, restrições ilegítimas e abuso sexual

Por Da Redação
Atualizado em 7 nov 2019, 10h17 - Publicado em 7 nov 2019, 10h08

Um tribunal do Chile acolheu uma ação movida contra o presidente Sebastián Piñera por sua responsabilidade em supostos crimes contra a humanidade, ocorridos durante os protestos das últimas três semanas que mataram ao menos 20 pessoas.

A ação foi movida contra o presidente pela “responsabilidade que lhe cabe, como autor, como chefe de Estado e de todos os que resultem responsáveis como autores, encobridores e/ou cúmplices de crime contra a humanidade”, destacou o documento apresentado em um tribunal em Santiago por advogados representando organizações de direitos humanos.

“Se admite a tramitação da ação interposta; remete-se ao Ministério Público” para que se inicie uma investigação, indicou a resolução do juiz Patricio Álvarez, que iniciará agora a tramitação da ação judicial.

A ação afirma que a polícia e os militares cometeram pelo menos nove delitos – entre eles homicídios, torturas, restrições ilegítimas e abuso sexual – desde sexta-feira, 18 de outubro, quando o surto social começou e o presidente Piñera estabeleceu o estado de emergência, no qual entregou o controle da segurança de Santiago e outras cidades ao Exército.

Os protestos deixaram ao menos 20 mortos, cinco deles por ação direta de agentes do Estado. O Instituto Nacional de Direitos Humanos contabilizou até esta quarta-feira 1.778 feridos e cerca de 5.000 detidos.

Protestos chegam aos bairros ricos de Santiago

Os protestos chegaram nesta quarta-feira ao centro comercial Costanera Center, a porta de entrada para o distrito financeiro e as áreas mais abastadas de Santiago, que até então tinham ficado à margem das manifestações que abalam o país.

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Após duas semanas e meia do início dos protestos, centenas de pessoas – na maioria jovens – chegaram ao centro comercial, o maior da América do Sul e onde fica a torre mais alta da região, para protestar contra as reformas sociais e contra o governo.

Impedidos de avançar, os manifestantes se expandiram por vários pontos do bairro de Providência, porta de entrada para o setor financeiro e das regiões mais abastadas da capital chilena.

Fogueiras foram acesas, houve saques a uma farmácia e a pelo menos dois bancos e confrontos com a Polícia, além de sérios danos ao mobiliário público.

Desde cedo, a polícia isolou o local e a administração decidiu baixar as portas após o meio-dia. As lojas próximas protegeram suas vitrines com tapumes de madeira e ferro, e durante todo o dia um clima de tensão dominava todo o setor que cercava o Costanera Center.

“Estamos vivendo um nível de violência e destruição nunca antes vistos na comuna”, disse a prefeita de Providência, Evelyn Matthei.

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Mensagens anônimas nas redes sociais convocaram os protestos nos bairros ricos. “Chegou a hora de ir ao leste”, área rica da capital, dizia uma das postagens, indicando que era hora de “os empresários sentirem o descontentamento do povo” e a “união das classes”.

O batalhão de choque usou jatos d’água e gás lacrimogêneo para dispersar os manifestantes que se concentraram em vários pontos ao redor do centro comercial, um símbolo do progresso econômico de Santiago.

“As pessoas estão bastante tristes e com medo em relação à volta à normalidade no país”, disse Andrea Ortega, advogada de 43 anos que deixou seu escritório para buscar os filhos mais cedo do que o habitual na escola por medo de tumultos.

Para Arturo Donoso, de 40 anos, “é triste ver o país assim. A cidade está apagada e acho que todos entendemos que há uma demanda justa. Não é porque moramos aqui que não sabemos disso”.

Horas depois, milhares de manifestantes voltaram a se concentrar na Praça Itália, principal cenário dos protestos desde que começaram, onde foram registrados incidentes isolados.

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Para esta quarta-feira, também foram convocados protestos diante da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) das Nações Unidas, cuja sede no bairro de Vitacura representa um dos maiores ícones arquitetônicos da cidade.

“Isto tinha que acontecer e me comove que sejam nossos netos os que tenham tido a postura de lutar por um Chile que não merece essas injustiças”, relatou com um megafone Rebeca Pemjean, aposentada de 64 anos, exilada pela ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990).

Enquanto isso, na comuna de Renca, bairro popular do norte de Santiago, vinte pessoas atacaram um quartel da polícia, deixando cinco agentes feridos. Caminhoneiros e motoristas bloquearam algumas rodovias em protesto contra os pedágios urbanos.

‘Nada a esconder’

Juntamente com os protestos, há crescentes relatos de violações de direitos humanos por parte das forças de ordem.

Na terça-feira, dois alunos do Ensino Médio foram feridos com balas de borracha por policiais que entraram no prédio da escola onde estudam. Um dos agentes de segurança foi detido e será acusado do crime de coação ilegítima, informou a imprensa local.

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O Ministério Público informou que 14 policiais serão acusados de “tortura” contra duas pessoas, uma delas menor de idade, durante o estado de emergência decretado por Piñera e em vigor nos primeiros nove dias de protestos.

Diante esta onda de denúncias, Piñera afirmou nesta quarta-feira: “Estabelecemos total transparência nos dados (sobre a violência policial), porque não temos nada a esconder”.

O presidente disse que, com a mesma contundência, serão punidos os manifestantes que causaram distúrbios violentos, saquearam e danificaram mais de 70 estações de metrô no meio dos protestos, e que isso será feito com “qualquer excesso que tenha sido cometido” no uso da força.

A Justiça anunciou, por sua vez, ter acolhido uma ação para investigar o presidente Piñera por suposta responsabilidade em crimes contra a humanidade cometidos no contexto dos protestos sociais.

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) anunciou que fará uma visita ao país, juntando-se à missão do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, que já está no Chile. Nesta quarta, várias organizações internacionais, incluindo a Organização Mundial contra a Tortura, chegaram ao país para investigar as denúncias de excessos na repressão aos protestos.

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Ao lado de vários ministros na sede presidencial de La Moneda, Piñera assinou um projeto de lei que eleva – subsidiado pelo Estado – o salário mínimo para 467 dólares (350.000 pesos chilenos), conforme a agenda de medidas sociais para aplacar a revolta popular.

(Com AFP)

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