A capital francesa definitivamente não é um microcosmo a partir do qual a França pode ser estudada. Encontrar um eleitor da extrema direita é coisa rara. O debate em Paris se dá apenas no grau de entusiasmo com o qual se vai apoiar Emmanuel Macron no segundo turno: com convicção plena ou apenas para barrar a vitória de Marine Le Pen.
Jean-Michel Pace, um consultor de informática de 61 anos que mora no 18º distrito da capital, está no primeiro grupo. Apoiou Macron desde o primeiro turno e tenta convencer os amigos de esquerda menos entusiasmados com o candidato. “Talvez pelo passado revolucionário francês, falar em liberalismo por aqui assusta bastante. Principalmente quem é mais próximo do Partido Socialista“, afirma.
Jean-Michel sempre votou na esquerda, mas nesta eleição trocou o Partido Socialista por Emmanuel Macron. Ele faz parte da maioria de 34% dos parisienses que deu a vitória ao candidato do En Marche! no primeiro turno. “Macron propõe uma política aberta, uma sociedade apaziguada. Seu programa permitirá liberar as energias e fazer os franceses tomarem as rédeas de seu destino”, diz o consultor, usando um termo que faz parte vocabulário de Macron. “Liberar as energias” é o eufemismo do candidato para flexibilizar a lei trabalhista, uma das principais promessas de campanha.
Independentemente da ideologia, Macron se dá bem nos conglomerados urbanos, na França moderna. Venceu em quase todo o oeste do país, de regiões prósperas como a Bretanha. Um levantamento do instituto Ipsos indica que o eleitor de Macron não pertence a uma faixa etária específica, mas apresenta um padrão quando o quesito é escolaridade.
O candidato de 39 anos levou o voto de 34% dos dirigentes de empresas ou funcionários em cargos de chefia, mas apenas 17% entre os operários. Transformando o dado em dinheiro: ele obteve apoio de 32% dos que ganham mais de 3.000 euros por mês, mas apenas 14% entre os de salário menor que 1.250 euros.
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Ainda restam dúvidas sobre qual será a taxa de migração dos candidatos da direita conservadora, que votou em François Fillon no primeiro turno, rumo a Emmanuel Macron no domingo. Mas no primeiro turno, foi o voto de esquerda, como o do parisiense Jean-Michel, que inflou sua votação, levando 47% dos votos entre os que haviam apoiado François Hollande em 2012.
Le Pen e a França profunda
Euryanthe Mercier tem 22 anos e desde sempre apoiou Marine Le Pen. Ela integra a minoria de menos de 5% dos eleitores da capital que votaram na Frente Nacional. A grande ascensão do partido verificada nos últimos anos se dá principalmente em cidades do interior, principalmente vilarejos, incluindo alguns que historicamente eram de esquerda. É o caso de Mèze, no departamento de Hérault, que deu uma das mais fortes votações a Le Pen no primeiro turno, com 36%. Governado por um prefeito ecologista, o município deu uma guinada à direita.
O forte de Marine Le Pen são o norte do país e as zonas rurais, onde obteve impressionantes 26,7% dos votos, em média, nas cidades com menos de 2.000 habitantes. Em seu eleitorado se verifica um recorte mais claro por idade, levando 25,7% dos votos entre os eleitores de 18 a 34 anos. É o caso de Euryanthe, que se jogou completamente na campanha e tem a árdua tarefa de angariar votos para Le Pen entre seus amigos parisienses.
Estudante de Comunicação e garçonete, ela pertence ao pequeno grupo de jovens da capital a apoiar a Frente Nacional. Acredita que Le Pen é a única que poderá lidar com duas das questões que mais lhe inquietam: o terrorismo e a criminalidade. “Marine é a única com um discurso claro para restabelecer o controle das nossas fronteiras. Ela tem a coragem necessária e que muitos outros não têm”, diz Euryanthe. “Também me preocupo com a proteção da família”, afirma a jovem. “A grande diferença em relação à Macron é que ele quer destruir a família em todos os níveis. E Marine tenta proteger de todas as maneiras”, compara.
Embora pouco numerosos, os jovens parisienses que apoiam a Frente Nacional têm um discurso afiado. Eric Barbosa, um padeiro de 20 anos, é responsável pelo grupo Jovens com Marine, que distribui panfletos nas ruas e organiza pequenos encontros.
Nascido em Schiedam, na Holanda, Barbosa não vê contradição ao apontar a principal razão pela qual apoia a candidata da Frente Nacional: “Porque ela defende a identidade francesa”. “Queremos a França independente, que tenha seu caminho no mundo. O país vive uma crise democrática e econômica. E Macron não oferece nenhuma resposta à essa crise”, contou Eric, com discurso decorado e na ponta da língua, enquanto distribuía um panfleto que questionava: “Quem é o verdadeiro Macron?”.