A sensação de déjà vu em Israel não é à toa. Pela quinta vez em quatro anos, o país vai às urnas nesta terça-feira, 1, para definir os 120 assentos do Knesset, o parlamento israelense, e, por tabela, o primeiro-ministro, líder do partido que obtiver a maioria dos assentos. Até os principais candidatos são os mesmos: os favoritos para liderar o governo são o ex-primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, e o atual premiê, Yair Lapid.
Outra constante nas eleições de Israel é que o cenário está extremamente fragmentado, com 13 partidos políticos disputando o Knesset. Se uma legenda obtiver uma maioria simples de 61 assentos, poderia formar um novo governo, mas pesquisas recentes mostram que nenhuma deve conquistar o mínimo necessário.
Como tem sido de praxe nos últimos anos, o líder do partido que ganhar mais votos precisará formar um governo de coalizão – suscetível a colapsos. Se o partido mais votado falhar na missão, o vice-campeão terá uma chance de negociar com outras siglas para formar um governo.
O ex-premiê, que foi forçado a deixar o cargo no ano passado após 12 anos no poder, está pedindo aos eleitores israelenses mais uma chance, apesar de enfrentar um julgamento por corrupção. Lapid espera, por outro lado, que seu breve período como chefe do governo interino, que assumiu quando Netanyahu foi deposto, tenha provado suas habilidades como líder.
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O país está preso em um impasse político sem precedentes desde 2019, quando Netanyahu, apelidado de Bibi, seu líder mais longevo, foi acusado de suborno, fraude e quebra de confiança, o que ele nega. Depois que deixou o cargo em 2021, o centrista Lapid formou uma surpreendente coalizão no estilo da “geringonça” de Portugal, com partidos liberais, de direita e árabes, unidos pela oposição ao líder de direita de saída.
O governo superou muitas expectativas, mas, fiel à tendência dos últimos anos, finalmente entrou em colapso em junho. A diferença da atual corrida eleitoral é que, mais do que nunca, Israel pende perigosamente para a direita radical.
O novo impulso de Netanyahu provém de um acordo entre o seu Likud e o partido de extrema direita Sionismo Religioso, que teve um forte aumento na popularidade. Seus líderes, Itamar Ben-Gvir e Bezalel Smotrich, são supremacistas judeus declarados. O primeiro também era seguidor do explicitamente racista e ultranacionalista Meir Kahane, já falecido, cuja organização foi classificada como um grupo terrorista pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos.
Críticos de Netanyahu levantam preocupações de que, se seu bloco vencer, a inclusão de ultranacionalistas em um novo gabinete pode prejudicar os laços com países ocidentais e árabes com os quais Israel tem novas relações, bem como com os palestinos. Também há temores de que isso pressionará o sistema legal de Israel para impedir a condenação de Netanyahu.
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Se eles conseguirem formar um novo governo de coalizão, poderá ser um desafio para os aliados internacionais de Israel. As últimas pesquisas, na sexta-feira 28, indicaram o bloco de Netanyahu – que também inclui os partidos judeus ultraortodoxos Shas e o Judaísmo da Torá Unida – pode ficar com 60 assentos, apenas um a menos que a maioria absoluta.
Enquanto isso, o bloco rival, anti-Netanyahu, terá 56 assentos. A aliança Hadash-Taal, liderada pelos árabes, que descartou a possibilidade de se juntar a uma coalizão, deve obter quatro.
Durante a corrida eleitoral, Lapid, líder do Yesh Atid (Há um futuro), parece ter tentado transmitir a imagem de um estadista. Durante seus últimos quatro meses no cargo, comentaristas concordam que ele acertou ao receber o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, supervisionar um bombardeio de três dias contra militantes da Jihad Islâmica, em Gaza, e assinar um acordo de fronteira marítima com o vizinho Líbano, um estado inimigo.
No entanto, como aconteceu nas quatro eleições anteriores, a disputa parece ser muito menos sobre Lapid ou qualquer outro candidato que não Netanyahu.
A votação tem cara e cheiro de um referendo sobre o ex-premiê, em vez de uma decisão sobre quem é a melhor figura para gerir as questões de segurança e diplomacia de Israel, principalmente as ambições nucleares do Irã e o conflito com os palestinos. A divisão tradicional entre esquerda e direita, que costumava ser sobre a questão palestina, foi colocada de escanteio por causa do embate entre os pró-Bibi e anti-Bibi.
Enquanto, matematicamente, Netanyahu parece estar em uma situação melhor do que Lapid – seu bloco de centro-esquerda está muito mais dividido – a pergunta de um milhão de dólares é qual será a participação dos eleitores em um país onde o voto não é obrigatório.
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Até agora, com tanto em jogo, a participação geral permaneceu relativamente alta (67,4%) em 2021. No entanto, a votação entre árabes israelenses, ou cidadãos palestinos de Israel, que representam cerca de um quinto da população, foi de apenas 44,6% no ano passado. A perspectiva de Ben-Gvir entrar no governo – quando ele já havia pedido a expulsão de cidadãos árabes “desleais” – deve aumentar a participação árabe apenas um pouco, segundo projeções.
Com uma disputa tão acirrada, é improvável que o resultado final da eleição fique claro imediatamente após o fechamento das urnas. Após a experiência dos últimos anos, poucos estão prontos para descartar a perspectiva de outro impasse, o que pode significar que Israel iria às urnas mais uma vez.