Romeu Zema: “Lula erra demais”
Prestes a lançar a pré-candidatura presidencial, o governador de Minas Gerais critica o governo petista e diz que a direita virá forte em 2026
Surpresa eleitoral em 2018, quando conquistou o governo de Minas Gerais logo em sua estreia nas urnas, o empresário Romeu Zema, reeleito em 2022 no primeiro turno, quer surpreender de novo no ano que vem. No próximo dia 16, ele lançará sua pré-candidatura a presidente da República com o desafio não só de impedir o quarto mandato de Lula — de quem é ferrenho opositor —, como o de superar a confusão que se instalou à direita do campo político desde que o ex-presidente Jair Bolsonaro foi declarado inelegível. Em entrevista a VEJA, ele diz que Lula está “enterrando” o país, que sua gestão lembra cada vez mais a de Dilma Rousseff e que a estagnação econômica é camuflada pela gastança do governo. Apostando em uma direita forte em 2026, mesmo com mais de uma candidatura, ele defende Bolsonaro das acusações, mas critica a atuação do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) para viabilizar punições de Donald Trump ao Brasil. “Foi um passo que não deveria ter sido dado”, afirma.
Qual é a principal bandeira que o senhor deve ter para sua candidatura ao Planalto? Consertar o Brasil. E para isso não é uma, duas ou três ações, mas milhares delas. Acho que é preciso dar exemplo com dinheiro público, atacar o desperdício. Hoje tem a gastança com o presidente, com 39 ministérios, com projetos questionáveis, gastança em todos os sentidos. O programa social é importante, mas precisa ter uma peneira para ver se realmente não tem fraude. Combater a corrupção, como o escândalo do INSS. Controlar os gastos provoca queda na inflação, na taxa de juros. E, quando a taxa de juros cai, muita coisa é consertada por tabela. Você passa a ter mais investimento privado, as indústrias se modernizam, ficam mais competitivas, a produtividade sobe. Você vai consertando uma coisa atrás da outra. E nós temos hoje um governo que gasta, que faz essa taxa ficar nas alturas, impedindo uma série de coisas benéficas para a sociedade.
Há outros governadores que podem ser candidatos a presidente, como Tarcísio de Freitas, Ronaldo Caiado, Ratinho Junior e Eduardo Leite. O que o senhor teria de diferente? Primeiro, eu acho que ninguém tirou o Titanic do fundo do mar igual eu tirei. Nenhum deles pegou um estado tão arrasado e arruinado. Segundo, eu tenho uma experiência grande no setor privado. Durante mais de trinta anos fiquei abrindo lojas em 470 cidades, criando mais de 5 000 empregos diretos. Vendemos para o seu Zé e para a dona Maria, nunca fomos vender para o estado. Eu sou governador de Minas por indignação, por inconformismo com aquilo que o PT (do antecessor Fernando Pimentel) fez. Eu comecei a andar no interior e vi que a professora não pagava a loja porque não recebia salário. E não era só a loja não. Não pagava a costureira, não pagava não sei mais quem. O estado ficou literalmente de joelhos.
“O tarifaço criou um ruído, um atrito, um certo desgaste dentro da direita, não resta dúvida. Mas, com o passar das semanas, dos meses, isso vai ser superado facilmente”
O senhor vai manter na campanha o tom atual nas redes sociais, que é bem-humorado, com direito a piadas mais ácidas? Eu venho do setor privado, sempre fui uma pessoa mais retraída, mineiro do interior. Mas estou tendo de ser um mineiro um pouco mais “apaulistado”.
Na eleição, o senhor poderia integrar a chapa de algum outro candidato? Estou muito mais acostumado a montar time do que propriamente ser parte do time. Foi o que fiz a minha vida inteira na empresa. Eu contratava os diretores, acompanhava. No governo, montamos o secretariado. Se tivermos vários candidatos da direita, cada um forte no seu respectivo estado, a votação da direita vai subir nesses estados. Mas tudo na política é possível.
O senhor acha que o governador paulista Tarcísio de Freitas será candidato a presidente? Ele diz que não. Admiro muito o governador, as nossas propostas, acho que o nosso jeito de governar tem semelhança. Ele tem uma reeleição praticamente garantida em São Paulo, é um governador muito bem avaliado. E ele trocar o certo de uma reeleição pelo incerto de uma eleição a presidente é algo que ele tem de colocar muito na balança, o partido dele também.
Se Tarcísio decidir concorrer ao Palácio do Planalto, o senhor disputa a eleição contra ele? Certamente. Sou amigo dele, como dos outros governadores. Mas tenho esse compromisso com o meu partido de ser candidato.
Minas Gerais foi um dos estados mais afetados pelo tarifaço de Donald Trump. O que achou da medida? Vejo como uma retaliação ao Brasil, que nos últimos anos, principalmente com Lula, tem se aliado a países declaradamente antiamericanos e regimes autocráticos. O presidente tem até questionado o dólar. E Lula continua com falas infelizes, instigando, às vezes de maneira agressiva, e está aí o resultado. Não faz sentido um grupo de nações tão heterogêneas como o Brics. Não são países cristãos, não são ocidentais, não são democráticos, como eles pregam tanto. É um bloco que não tem nenhuma homogeneidade, inclusive geográfica, cada país está num continente. Acho que está tudo nesse contexto. E Trump, que tem sido esperto, aproveitado toda brecha, colocou esse tarifaço contra o Brasil.
Mas o Brics comprou 42% das exportações de Minas. Acha que não deve ser mantida essa relação? Ela tem de ser mantida e aprimorada, mas para isso não é preciso fazer parte de um bloco de países. Você precisa ter bons produtos, um bom relacionamento comercial. O Brics parece que está aí para questionar a ordem econômica mundial, causar agitação. E o Trump resolveu dar um basta.
Não é complicado negociar com Trump, tendo em conta que parte da motivação dele é por razão política, em defesa de Jair Bolsonaro? Acho que ele aliou questões econômicas e políticas. Está muito claro que o Supremo, em especial um ministro, está se excedendo. Qualquer juiz do mundo que analisasse esse caso ficaria espantado com o que está acontecendo. Agora, os Estados Unidos erraram muito também, porque, se eles discordam do Estado brasileiro, deveriam ter punido o Estado, não o povo, com o tarifaço.
Há uma preocupação com o fato de o café ter sido sobretaxado, já que Minas é exportador importante do produto? Nós já tivemos vários produtos siderúrgicos excluídos, o que já tornou a situação menos crítica. Mas o café tem um valor muito relevante e eu estou confiante que a tarifa vai ser revista. Até porque no restante do mundo não existe café em quantidade e qualidade como a que temos em Minas. O governo americano não vai querer perder popularidade vendo o preço ao consumidor subindo de maneira exorbitante e causando insatisfação lá.
A sua gestão tem um plano de contingência para ajudar os setores afetados? Temos vários. Vou citar os mais recentes. Disponibilizamos uma linha de crédito subsidiada no valor de 200 milhões de reais pelo Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais, com taxa de 0,9% ao mês, muito abaixo do mercado. E também um aporte de 100 milhões de reais, via crédito de ICMS de exportação. Muitas empresas exportadoras acumulam crédito e muitas vezes o Estado demora para ressarcir esse crédito. Mas nós vamos fazer isso de maneira ágil.
A atuação do deputado Eduardo Bolsonaro para conseguir as sanções foi um tiro no pé? Eu lamento que isso esteja acontecendo, mas acho que deveria, sim, ter havido mais diálogo para não termos chegado a esse ponto. Mas vale lembrar que, se o Eduardo errou, o presidente Lula errou muito mais.
Mas a movimentação dele foi prejudicial para a direita? Foi um passo que não deveria ter sido dado, porque acabou causando uma retaliação a uma nação. Se tivesse retaliado quem é responsável por isso, tudo bem. Nenhum direito individual se sobrepõe ao direito de 210 milhões de pessoas.
“A gestão Lula está enterrando o Brasil. Nós estamos assistindo à repetição do desastre de Dilma. A economia ainda apresenta números não tão ruins devido à gastança do governo”
O episódio do tarifaço rachou alguns segmentos da direita? Criou um ruído, um atrito, um certo desgaste dentro da direita, não resta dúvida. Mas, com o passar das semanas, dos meses, isso vai ser superado facilmente, porque a proposta da direita é a mesma.
O senhor não foi às manifestações do dia 3 em apoio a Bolsonaro e contra o ministro Alexandre de Moraes, e foi criticado pelo pastor Silas Malafaia. Como recebeu a crítica? Com naturalidade. Mas ressalvo que já fui a um sem-número de eventos com essa pauta, e a agenda de governador é bem pesada, não dá para ir a 100% daquilo para o qual você é convidado. E tenho deixado muito clara a minha posição. Sou contra o que Moraes tem feito, sou contra o que Lula tem feito. Acho que uma opinião que chega a milhares de pessoas tem mais impacto do que subir em um caminhão.
O que achou da prisão domiciliar do ex-presidente? Considero mais uma decisão totalmente arbitrária, injusta. Diversos juristas já se manifestaram dessa mesma forma.
Segundo o Datafolha, 61% dos eleitores não votariam em candidato que defendesse anistia a Bolsonaro. Como vê isso? Eu continuo com a posição de que nós temos de olhar para o futuro. Nós já não demos anistia a sequestrador, assassino, na década de 1970? Agora, não vamos dar indulto para quem não disparou nenhum tiro? Para quem só estava planejando alguma coisa? Planejar alguma coisa é muito diferente de executar.
O senhor então não vê uma tentativa de golpe? Não, não vejo.
Mesmo com os indícios apresentados pela Polícia Federal de que havia até um plano de assassinato de Lula, Alckmin e Moraes? Papel aceita tudo.
O tarifaço acabou beneficiando o governo Lula pelo menos momentaneamente? Eu vejo isso como uma pequena inflexão, que a longo prazo não vai alterar o resultado. O governo Lula está enterrando o Brasil. Nós estamos assistindo à repetição do desastre de Dilma. A economia ainda apresenta alguns números que não são tão ruins devido à gastança do governo, mas que logo irá se transformar num tumor. O Brasil não está crescendo. Vai vir mais inflação, juros altos, recessão, desemprego. Em 2015, 2016, o PT conseguiu fazer do Brasil o único país que deu marcha a ré no mundo, o único que entrou em recessão. A economia afundou 8% por causa de impeachment, de malas de dinheiro, de Lava-Jato, de petrolão. É só aguardar para vermos que isso aí será um pontinho na curva que não afeta a tendência de queda que o país está vivendo.
Publicado em VEJA de 8 de agosto de 2025, edição nº 2956