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A cidade que se empolgou com o candidato que não empolga

No interior de SP, Tuiuti deu 87,2% de seus votos a Alckmin em 2014, mas hoje seus moradores não têm tanta convicção de que repetirão a escolha em outubro

Por Leonardo Lellis Atualizado em 13 jun 2018, 16h35 - Publicado em 12 jun 2018, 20h50

No município paulista que deu a maior proporção de votos válidos a Geraldo Alckmin (PSDB) em sua reeleição ao governo de São Paulo em 2014, os moradores de Tuiuti (112 km ao norte da capital, na região de Bragança Paulista) hoje se dividem entre repetir o voto no tucano na eleição para Presidente da República e a completa indecisão

O sucesso eleitoral nas urnas da cidade de 6.000 habitantes — metade deles na zona rural — tem explicação em um sentimento difuso relacionado a uma imagem positiva do tucano, ainda que muitas vezes ninguém saiba dizer exatamente o porquê. Mesmo as denúncias de irregularidades que rondam o Palácio dos Bandeirantes e fazem o nome de Paulo Preto inspirar calafrios nos tucanos, não colam muito na cidade. Prevalece o desempenho percebido em questões mais comezinhas, como recapeamento de estradas ou a doação de veículos para atender às necessidades mais urgentes dos moradores.

Se dependesse só dos eleitores de Tuiuti, Alckmin já teria sido eleito presidente em 2006, quando o tucano teve 75,3% dos votos na disputa com então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Nos pleitos seguintes, para governador, as votações foram ainda mais folgadas. Ele teve 76,9% dos votos, em 2010, e 87,2%, em 2014. Entretanto, muita gente na cidade ainda se impressiona ao ter conhecimento de votações tão expressivas do ex-governador, que patina para fazer seu nome decolar em 2018 — na última pesquisa Datafolha, Alckmin soma 7% das intenções de voto.

O comerciante Benílson Gimenez, 41, sempre votou em Alckmin e pretende repetir a escolha para presidente. “Votei no PSDB desde o meu primeiro voto”. A simpatia, entretanto, não decorre de nenhuma razão local. “Para a cidade ele não fez nada, mas acho que fez um bom governo de forma geral.”

Ele tem uma tese para explicar o sucesso de Alckmin em outras eleições na cidade: “Aqui não tem esquerdista”.

Ao lado do pai, Benedicto Gimenez, 81, Benílson coloca sob perspectiva as suspeitas que recaem sobre Alckmin na Operação Lava Jato — “perto dos outros…”, afirma. “Para mim, as denúncias não atrapalham, porque eu acredito no trabalho dele”, completa. Seu pai, que não pretende sair de casa para ir às urnas, teoriza sobre como deixar o combate à corrupção mais eficaz. “Tinha que ter uma lei mais dura para que os bens desses políticos fossem confiscados. Prender não adianta nada.”

Os comerciantes Benedicto Gimenez e Benilson Gimenez, pai e filho, na frente de sua loja de Tuiuti (SP) - 08/06/2018
Os comerciantes Benedicto Gimenez e Benílson Gimenez, pai e filho, em frente a loja deles em Tuiuti, interior de São Paulo – 08/06/2018 (Mastrangelo Reino/VEJA.com)
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A calvície e os óculos renderam ao aposentado José Edson Manganelli, 58, o apelido de Geraldo Alckmin na cidade. Econômico nas palavras, ele gosta da comparação com o político, em quem vai votar de novo “com certeza”.

O “sósia” se empolga ao explicar as razões da votação tão alta na cidade: “Porque ele faz tudo de bom”. Mas fica mais contido para citar exemplos: “Aí eu não posso falar muita coisa”.

Ao comentar as suspeitas que pesam contra Alckmin, José Edson também não as vê como um empecilho para sua campanha à Presidência. “Isso aí tem em todo lugar. Quem não tem?” E garante que o tucano vencerá as eleições, apesar de ele ainda não ter decolado nas pesquisas de intenção de voto: “Com certeza vai crescer”.

Lenir Silva, 50, cabeleireira, não se importa com política e sempre votou nulo, mas vê na imagem de Alckmin uma explicação para sua aceitação entre os outros moradores da cidade. “Acho que é pelo carisma. Parece ser uma pessoa boa. Todo mundo é bom até que se prove o contrário, né?”, diz ao sair da agência lotérica onde uma fila se forma na calçada.

Já a assistente social Ângela Feliciano Catalan, 61, credita o sucesso eleitoral do governador à figura da primeira-dama, dona Lu, somada à imagem de “família”, frequentemente atribuída ao tucano, católico praticante. “Ela é o carro-chefe do Alckmin”, resume.

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Ângela, que pretende votar no tucano, faz pouco-caso dos trambiques que são investigados em seu governo. “Eu nem sei direito onde está a participação dele. Eu vejo mais dos outros candidatos, que têm muita rejeição. Até por falta de opção, o pessoal acaba votando no Alckmin.” Este mesmo motivo, “a falta de opção”, também é citado pelo comerciante Alexandre Vieira, 45, para explicar por que as denúncias não devem atrapalhar a empreitada presidencial do tucano.

Ainda mais decidida, a merendeira Cacilda Godói, 61, simplesmente não acredita nas suspeitas de corrupção ligadas ao governo Alckmin. “Eu acho ele uma pessoa muito íntegra. Não vou pelo que os outros falam e ouço pouco as notícias. Por causa dos ruins, os bons também levam culpa”, afirma Cacilda, orgulhosa de ter conversado com o governador em uma das visitas que fez à cidade. “Ele já ajudou bastante Tuiuti”, conta, citando a recuperação de uma estrada e o envio de carros para atender doentes como alguns exemplos do que foi feito.

A merendeira Cacilda Aparecida Godoi, na cidade de Tuiuti - 08/06/2018
‘Eu acho ele (Alckmin) uma pessoa muito íntegra. Não vou pelo que os outros falam e ouço pouco as notícias. Por causa dos ruins, os bons também levam culpa’, diz a merendeira Cacilda Godói – 08/06/2018 (Mastrangelo Reino/VEJA.com)

Morador de um arraial distante 6 quilômetros do perímetro urbano de Tuiuti, o operador de máquinas Danilo Moreto, 28, credita sua intenção de voto em Alckmin às obras de recuperação da estrada que o leva até a cidade e acha que o voto anti-PT une o “útil e o agradável”. “Tem que ir pelo que rouba menos. Perto dos outros, ele [Alckmin] é o menos pior.”

Em um bar em frente à praça da cidade, o aposentado Carlos Alberto Litaldi, 63, explica o motivo de ter votado em Alckmin: como o prefeito é de um partido da base governista, o DEM, achou que o acesso a verbas para o município ficaria mais fácil. Porém, na próxima eleição presidencial, pretende votar nulo. “Não quero o militarismo, mas desses caras aí, nenhum.” Só um eventual segundo turno com Jair Bolsonaro (PSL) o faria votar em Alckmin.

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Entre um gole e outro de cerveja, Carlos faz troça do amigo Sebastião Pasqual, 65, quando este diz que seu filho é eleitor do PSDB. “Ele não deu educação para o moleque, não tem juízo. Agora não conserta mais”, diz, rindo. Ex-ferramenteiro em São Bernardo do Campo, Carlos acha que Lula nunca devia ter trocado o sindicalismo pela política eleitoral e, em um desafio à lógica binária da polarização que grassa nas redes sociais, quer porte de armas dentro de casa para poder defender sua propriedade.

O amigo Sebastião, santista como Alckmin, garante que nunca votou no tucano (sempre preferiu o PMDB) mas também não acredita nas suspeitas. “Não tem nada a ver essa denúncia que estão fazendo contra ele. Isso é coisa de política.” O dono do bar Paulo Pavan, 51, entra na conversa com uma provocação dos fregueses, que dizem que ele é eleitor tucano. “É que eu estudei, né?”, devolve, também na base da gozação.

Apesar de confirmar o histórico de votos no partido de Mário Covas e Fernando Henrique Cardoso, o comerciante se ressente de Alckmin não ter sido mais assertivo ao se posicionar diante das denúncias de corrupção em seu governo e diz que, neste ano, o tucano precisará convencê-lo. “O problema do PSDB é que o partido põe panos quentes em alguns de seus principais nomes.”

Sebastião Rodrigues Pasqual, Paulo Pavan e Carlos Alberto Litaldi conversam em bar na cidade de Tuiuti (SP) - 08/06/2018
Sebastião Pasqual, Paulo Pavan e Carlos Alberto Litaldi conversam em bar na cidade de Tuiuti (SP) – 08/06/2018 (Mastrangelo Reino/VEJA.com)

A agricultora Silvia Yuri Karaki, 44, conta que sempre votou em Alckmin, mas revela ter se decepcionado com o político por um motivo que ficou latente na paralisação dos caminhoneiros no mês de maio: em seu governo foi autorizada a cobrança de pedágio por eixo suspenso, mesmo que com menos carga, algo que impactou diretamente o seu negócio. Moradora da zona rural, ela se queixa também das condições das estradas locais, necessárias para escoar sua produção no campo. “Onde eu moro não é asfaltado, já faz anos que a gente está esperando”, afirma. Com o desencanto, Silvia não pretende nem comparecer ao local de votação no dia das eleições.

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A agricultora Silvia Yuri Karaki, moradora na cidade de Tuiuti (SP) - 08/06/2018
A agricultora Silvia Yuri Karaki, 44, conta que sempre votou em Alckmin, mas revela ter se decepcionado com o político – 08/06/2018 (Mastrangelo Reino/VEJA.com)

Funcionário da loja de cosméticos onde Sílvia faz compras, Fabiano Douglas, 35, ainda não escolheu seu representante. “Sempre votei nele [Alckmin] para governador, mas hoje eu não tenho opinião formada sobre quem eu votaria. A gente vê que a corrupção está generalizada. Não tem um político que você vê que é honesto. Mesmo se entrar um assim, não vai fazer muita coisa, porque depende do Congresso, que está todo sujo.”

Minoria

Funcionário de uma revenda de bebidas, Lynicker Dourado, 24, faz parte da minoria que não votou em Alckmin. O rapaz rejeita todos os políticos e sempre vota nulo — “não gosto de nenhum, para mim é tudo corrupto” — e se surpreende ao saber que o tucano ganha com folga na cidade. “A maioria do pessoal que eu conheço é petista”, diz. Morador da periferia de Campinas, ele viaja toda semana para Tuiuti, onde mantém o título de eleitor, e acha que ter ficha limpa não deveria ser uma qualidade, mas uma obrigação.

A cabeleireira Andreia de Matos, 34, mora na cidade há apenas quatro meses e, sem Lula na disputa, não pretende votar em ninguém. “Nós que somos de classe baixa tivemos mais chances depois que ele foi eleito. No governo de Lula a gente teve mais valor e conquistas.” Para ela, o voto em Alckmin também é explicado mais pela antipatia ao PT do que por qualidades do governador.

O comerciante Lynicker Wesley Roveran Dourado na frente de sua loja em Tuiuti (SP) - 08/06/2018
Lynicker Dourado, 24, faz parte da minoria que não votou em Alckmin; ele rejeita todos os políticos e sempre vota nulo: ‘não gosto de nenhum, para mim é tudo corrupto’ – 08/06/2018 (Mastrangelo Reino/VEJA.com)
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Trabalho contra

No que depender do prefeito Jair Fernandes Gonçalves, o Nande (DEM), o tucano não vai repetir a boa votação na eleição para presidente. Isso porque, explica, o governador não cumpriu uma promessa de equacionar uma dívida de cerca de 10 milhões de reais que o município tem com a Sabesp — e que o levou a pedir votos para o então candidato à reeleição em 2014.

A execução da dívida na Justiça fez o jogo virar. “Não vamos apoiar ele a mais nada. O Alckmin pode até ter 60% de aprovação, mas vou entrar na casa de cada um em Tuiuti e explicar o que ele fez”, conta.

O prefeito também tem uma explicação para o motivo de a campanha do tucano não decolar. “Desde 2013 ele não paga as emendas dos deputados. Não só do meu partido, mas de todos. Ele andou fazendo uma média agora, faltando três meses para deixar o governo, pagando emendinha de 100.000, 150.000 reais. Nesses últimos quatro anos ele não fez nada.”

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