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A missão (quase) impossível da AGU contra a privatização da Eletrobras

A mando de Lula, a Advocacia-Geral da União se prepara para uma batalha com remotas chances de sucesso - ainda bem

Por Victoria Bechara Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 10h38 - Publicado em 18 fev 2023, 08h00
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  • Conceituado funcionário público, com mais de vinte anos de bons serviços prestados, Jorge Messias parece fadado a encarar missões espinhosas. Tornou-se conhecido por uma delas em 2016, quando foi citado como “Bessias” em um telefonema grampeado entre a então presidente Dilma Rous­seff e Luiz Inácio Lula da Silva. Na época, Messias era subchefe para Assuntos Jurídicos da Presidência e ficou encarregado de levar um termo de posse de ministro da Casa Civil para que o petista assinasse, assumindo o cargo em meio às investigações da Lava-­Jato. Como se sabe, o vazamento da conversa melou o negócio. Com a volta de Lula ao poder, Messias ganhou espaço na equipe de transição e foi alçado ao comando da Advocacia-Geral da União (AGU). Mal chegou ao cargo, teve de liderar a ofensiva jurídica contra os terroristas que invadiram e destruíram a sede dos três poderes em Brasília, em 8 de janeiro, mirando organizadores e financiadores dos atos.

    Agora, de novo a mando do chefe, começa a se debruçar sobre outra tarefa cabeluda: tentar reverter a privatização da Eletrobras. O tema é uma espécie de obsessão do presidente. Desde a campanha, Lula vem anunciando que vai fazer o possível para reverter processos concluídos de desestatização e barrar outras iniciativas do tipo. No caso da Eletrobras, o petista classificou a privatização como “errática” e de “lesa-pátria”. Em clima permanente de palanque, acrescentou ainda que foi feita “quase que uma bandidagem” para que o governo não volte a ter controle sobre a companhia. Dentro do espírito missão dada, missão cumprida, Messias e técnicos da AGU montaram um grupo de trabalho sobre o tema e estudam o que pode ser feito na Justiça para tentar reverter o processo. Os principais pontos questionados são o poder de voto da União nas assem­bleias internas e as regras que dificultam a compra de ações, impedindo que o governo volte a ditar os rumos da empresa.

    Em outra prova de como o governo gasta energia errada nesse assunto (não bastasse o equívoco de combater a privatização por questões ideológicas, o país enfrenta questões muito mais urgentes e importantes), o Palácio do Planalto deu sinal verde para que parte de sua base de apoio no Congresso se movimente para a criação de uma frente parlamentar mista pela reestatização da Eletrobras. O deputado Alencar Santana (PT-SP) lidera a articulação e está colhendo assinaturas. “Queremos fazer esse diálogo no Parlamento envolvendo diferentes colegas, de partidos diferentes, e convencê-los de que isso é importante para o país”, justifica.

    MARCO - A festa com integrantes do governo Bolsonaro: martelo batido após quase trinta anos de discussões -
    MARCO - A festa com integrantes do governo Bolsonaro: martelo batido após quase trinta anos de discussões – (Alan Santos/PR)

    Do ponto de vista jurídico, a missão dada a Messias na AGU é quase impossível, visto que, durante o processo de privatização da Eletrobras, aprovado em 2022, foram criadas regras para evitar que um único acionista tenha protagonismo nas decisões internas. Para vender a empresa, a gestão de Jair Bolsonaro optou pela capitalização — ou seja, mais ações da companhia foram ofertadas na bolsa. Com isso, a União deixou de ser a acionista majoritária e ficou com 45% de participação na energética. A privatização, no entanto, limita o poder de voto de cada sócio a 10%, independentemente da quantidade de ações que possui — esse é um dos pontos criticados por Lula. O modelo adotado também incluiu no estatuto da Eletrobras uma trava que exige que, para fazer uma oferta para compra de ações, é necessário pagar o triplo da maior cotação registrada em dois anos. Ou seja, ficou muito mais caro para o governo adquirir maioria na Eletrobras novamente — manobra que o presidente da República chamou de “irracional e maquiavélica”.

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    Além disso, a lei que privatizou a companhia de energia e incluiu essas regras foi aprovada na Câmara e no Senado, por meio de uma medida provisória que teve o apoio até de parlamentares que hoje integram a base do governo, e passou pelo Tribunal de Contas da União (TCU). “Esse movimento de Lula é um equívoco absoluto. É só um discurso político, não tem viabilidade nenhuma”, afirma a economista Elena Landau, ex-chefe de privatizações do governo FHC. A desestatização do gigante de energia consumiu quase trinta anos de discussões dentro do Congresso e, a despeito de algumas críticas, tem potencial claro de trazer benefícios, como o aumento da eficiência da companhia e a retomada de investimentos no setor, gerando um ciclo virtuoso capaz de chegar ao bolso do consumidor, barateando a conta de luz. “A solidez do processo e os novos rumos da companhia foram aprovados em todas as instâncias, o que se percebe pela confiança dos mais de 370 000 trabalhadores que investiram FGTS na empresa”, afirma Wilson Ferreira Junior, CEO da Eletrobras. Lutar contra essa realidade será um fardo duro para Messias, o incansável, carregar.

    Publicado em VEJA de 22 de fevereiro de 2023, edição nº 2829

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