O ministro Paulo Guedes, da Economia, costuma usar voos regulares em seus deslocamentos do Rio de Janeiro, onde mora, para Brasília, onde despacha de segunda a quinta-feira. No último dia 19, uma publicação no site da Força Aérea Brasileira chamou atenção para uma mudança nessa rotina. Guedes requisitou ao Comando da Aeronáutica, “por emergência médica”, um jatinho da Força Aérea para fazer o trajeto de todas as semanas. Mais estranho ainda: autorizado, embarcou com apenas um assessor ao lado, perto, o que também é bastante incomum. O mistério só aumentou nos dias que se seguiram. O ministro não compareceu a reuniões importantes, não se envolveu no anúncio das medidas econômicas e permaneceu trancado em seu apartamento no Leblon durante todo o período — comportamento inesperado para um dos auxiliares mais inquietos do presidente. Logo surgiu a especulação de que ele estaria infectado pelo coronavírus. Seria a terceira autoridade do primeiro escalão do governo a contrair a doença.
Guedes é um dos oito integrantes do chamado grupo de risco ministerial — aqueles que têm mais de 60 anos e, por isso, deveriam estar em isolamento. Ao requisitar o jatinho para voltar para casa, ele suspeitava que pudesse ter contraído o vírus. Afinal, havia participado de reuniões com pessoas que, mesmo sem saber, estavam contaminadas. O ministro, de 70 anos, fez o teste. Antes de receber o resultado, decidiu antecipar o retorno ao Rio, requisitou o jatinho da FAB e voou sozinho por precaução. O presidente Bolsonaro até tentou demovê-lo da ideia de se ausentar de Brasília durante a crise, sugerindo que ficasse hospedado em um hotel militar. Guedes, porém, preferiu se adiantar a uma eventual necessidade de isolamento. Na sexta-feira 20, já com o resultado negativo do exame em mãos, o ministro achou por bem permanecer em casa, despachando com assessores por meio de videoconferência, sem receber visitas, conforme manda o protocolo. Explicou que, por causa de sua idade, também era prudente reforçar a imunidade do organismo antes de retornar a Brasília. Ele tem ingerido altas doses de suco de laranja.
Embora o presidente se refira eventualmente a ela como “gripezinha ou “resfriadinho”, a pandemia mudou a rotina de praticamente todos os 22 ministros do governo, especialmente os mais velhos. A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, é uma das mais cuidadosas. Engenheira-agrônoma, ela conhece bem o potencial destrutivo de vírus e bactérias. Com 65 anos, Tereza Cristina mandou espalhar vidros de álcool em gel por todo o gabinete, fala a distância com as pessoas que entram em sua sala e tem evitado reuniões presenciais. No início da semana, participou, por videoconferência, de uma conversa com ministros da Agricultura de países da América do Sul. Tereza Cristina fez o teste para a Covid-19, o resultado deu negativo, mas ela pretende repetir o exame, apesar de não ter apresentado nenhum sintoma da doença. É melhor prevenir. No Palácio do Planalto, o ministro Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, está em observação. Devido às suas funções, ele esteve em encontros de trabalho com colegas contaminados, entre eles o general Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
Heleno, que tem 72 anos, testou positivo para o coronavírus na quarta-feira 18 e, desde então, ficou isolado em sua residência em Brasília. Na quarta-feira 25, porém, o general retornou ao trabalho, segundo sua assessoria com autorização médica e já completamente livre da infecção. Foram exatos sete dias de confinamento. O protocolo recomenda catorze. Luiz Ramos testou negativo, mas isso não quer dizer que ele está completamente livre da doença. Além do contato com Augusto Heleno, o chefe da Secretaria de Governo se reuniu com Bento Albuquerque, o comandante de Minas e Energia, outro que estava infectado com o vírus sem saber. Bento, de 61 anos, integrou a comitiva presidencial na viagem que Bolsonaro fez aos Estados Unidos, expedição em que, provavelmente, se deu a contaminação dele e de outros quinze assessores do Planalto. O ministro informou a VEJA que “se encontra em excelente estado de saúde e assintomático”, cumpre sua quarentena no Rio de Janeiro e despacha apenas por videoconferência. Já Ramos deve repetir o exame nos próximos dias.
Há auxiliares do presidente da República que, pelas áreas sensíveis que comandam, continuam correndo sérios riscos. O ministro-chefe da Casa Civil, general Braga Netto, por exemplo, com seus 63 anos, está à frente do comitê de crise, supervisionando e monitorando os impactos da Covid-19. O ministro, que tem reuniões diárias com assessores de diversas pastas, comunicou a VEJA que já fez o exame para a detecção do vírus, o resultado foi negativo e, por isso, segue despachando normalmente no Palácio do Planalto, porém adotando todas as recomendações de prevenção. O ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, 66 anos, também continua despachando no ministério, embora passe a maior parte do tempo sozinho no gabinete, como o colega Onyx Lorenzoni, da Cidadania, que tem 65 anos. Aparentemente, nenhum deles desfruta a mesma opinião do presidente sobre a pouca gravidade da doença.
Oito dos 22 ministros do governo têm mais de 60 anos.
Dois estão contaminados e dois trabalham de casa
Augusto Heleno
72 anos
Gabinete de Segurança Institucional
Contaminado, passou sete dias isolado
Paulo Guedes
70 anos
Economia
“Emergência médica” e trabalho em casa
Fernando Azevedo e Silva
66 anos
Defesa
Agenda por meio de videoconferência
Onyx Lorenzoni
65 anos
Cidadania
Despachando normalmente no gabinete
Tereza Cristina
65 anos
Agricultura
Álcool em gel e distância dos assessores
Luiz Eduardo Ramos
63 anos
Secretaria de Governo
Contato com infectados e teste negativo
Braga Netto
63 anos
Casa civil
Reuniões diárias para monitorar a crise
Bento Albuquerque
61 anos
Minas e Energia
Infectado, está de quarentena em casa
Publicado em VEJA de 1 de abril de 2020, edição nº 2680