Black Friday: Assine a partir de 1,49/semana

A onda de problemas que os prefeitos eleitos terão pela frente

Os governantes vão enfrentar caixas combalidos pela má gestão, além da queda de receitas e da alta da demanda por serviços públicos causadas pela pandemia

Por João Pedroso de Campos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 14h10 - Publicado em 27 nov 2020, 06h00

Os municípios de Bernardo do Mearim (MA), de cerca de 6 000 habitantes, e Parnaguá (PI), com 10 000, têm mais em comum do que as populações diminutas, a vida mansa e as paisagens bucólicas do interior do Nordeste. Outra semelhança está nas contas públicas: as duas lideram o ranking de endividamento de cidades elaborado pelo Tesouro Nacional: na primeira, a dívida corresponde a nada menos que 4 879% das receitas, enquanto na outra o índice é de 858%. Como nessas localidades, não serão poucos os prefeitos que, passada a euforia do triunfo nas urnas, terão pela frente a dura realidade dos cofres vazios. Três em cada cinco prefeituras não podem sequer ter aval da União para obter empréstimos — elas receberam as piores notas, C e D, na capacidade de pagamento, que leva em conta endividamento, índice de liquidez e poupança corrente (saldo de receitas e despesas). Entre as cidades com as finanças reprovadas e sem crédito na praça, estão onze capitais, entre elas Rio de Janeiro, Fortaleza, Recife e Porto Alegre (veja o quadro).

Não bastasse o saldo catastrófico acumulado por sucessivas gestões perdulárias, os novos governantes terão pela frente a explosiva combinação de três problemas deixados pela pandemia: a queda de receitas, o aumento da demanda por serviços públicos — consequência do desemprego e da perda de poder aquisitivo — e o fim do auxílio emergencial, responsável por boa parte dos PIBs locais. Há ainda uma fila represada por cirurgias, exames e consultas que foram suspensos na crise sanitária. Embora a pandemia tenha atingido as cidades de formas diferentes, o impacto nas finanças foi generalizado. Um exemplo é a queda de 9,7% no Fundo de Participação dos Municípios, que cobre 39% das receitas de localidades com até 20 000 habitantes.

PRESSÃO - Recife: professores municipais fazem greve por melhoria salarial -
PRESSÃO - Recife: professores municipais fazem greve por melhoria salarial – (Sérgio Gaspar/SIMPERE/.)

O quadro expõe um velho problema: a maioria das cidades não tem como se financiar — até a faixa de 100 000 habitantes, os tributos arrecadados não atingem, em média, 10% das receitas, segundo estudo de Lorreine Messias, pesquisadora associada do Insper. “A realidade do pós-­pandemia será ainda mais desalentadora”, diz. Há discussões em curso para pôr fim ao problema da indigência arrecadatória das cidades, como a PEC do Pacto Federativo. O governo Jair Bolsonaro propôs extinguir municípios com até 5 000 moradores cuja receita própria não chegue a 10% do total, mas há uma forte resistência política contra a implementação da proposta.

Para os prefeitos, a culpa é da eterna promessa de descentralizar recursos, como anunciou o presidente em março de 2019: “Mais Brasil, menos Brasília”, disse, ao defender a revisão do pacto federativo. “No ano passado, 20% dos impostos ficaram com municípios e 54%, com o governo federal. É isso que cria dificuldades para prestar um bom serviço na ponta”, critica o prefeito de Campinas e presidente da Frente Nacional de Prefeitos, Jonas Donizette (PSB). Há quem pondere, no entanto, que a Constituição de 1988 tenha extrapolado ao transferir atribuições às cidades. “Existe a autonomia dos municípios, mas as suas receitas dependem muito de transferências. Aquilo que é visto como positivo, do eleitor mais próximo do seu representante, parece ter ido além do que seria viável”, avalia Fábio Klein, analista de contas públicas da Tendências Consultoria.

Continua após a publicidade
arte-prefeituras-iphone
. (./.)

 

A situação difícil exige múltiplas ações. Além da redefinição do pacto federativo, da criação de estímulos à economia e de fontes de receita, do corte de gastos e de uma escolha melhor das prioridades, é necessário bom senso da classe política. No festival de demagogia que normalmente se instala em ano eleitoral, foram comuns as propostas de mais gastos e redução de receitas. No Rio, o prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) falou em reduzir o IPTU, mesmo arrecadando até agora 25 bilhões de reais dos 32 bilhões de reais previstos para o ano. E depois de ele próprio ter pedido em outubro antecipação de 1 bilhão de reais em royalties do petróleo para fechar as contas. Em São Paulo, com uma previsão de queda de 2 bilhões de reais de receitas em 2021, Guilherme Boulos (PSOL) prometeu implementar o “Renda Solidária”, de 200 reais a 400 reais, para cerca de 1 milhão de famílias em situação de vulnerabilidade social, que custaria 3,5 bilhões de reais ao ano. Encerrado o pleito, espera-se que os novos prefeitos mostrem bom senso e anunciem medidas mais adequadas ao tamanho do abacaxi que terão em mãos.

Publicado em VEJA de 2 de dezembro de 2020, edição nº 2715

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

a partir de 39,96/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.