Na reunião com representantes dos Três Poderes para tratar da seca e dos incêndios, o presidente Lula até admitiu que “a gente não estava 100% preparado” para lidar com a situação, mas preferiu reforçar a suspeita de que há uma atuação coordenada de criminosos para desgastar a sua administração, que teria uma “performance” ambiental reconhecida e elogiada no mundo inteiro.
Lula não deu nome aos bois, mas insinuou que apoiadores do antecessor Jair Bolsonaro estariam por trás do problema, ao citar que um deles, na convocação para os atos da direita programados para o feriado de Sete de Setembro, disse que os manifestantes tocariam fogo no país. A declaração nada tinha a ver com incêndios. Era um chamado à radicalização dos protestos contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.
“Algo me cheira oportunismo também de alguns setores tentando criar confusão neste país. O que queremos é autorização para fazer as investigações, porque, se as pessoas estiverem cometendo esse tipo de crime, a lei tem que ser exercida na sua plenitude”, afirmou Lula diante dos chefes do Legislativo e do Judiciário.
Discurso inflamado
Na mesma reunião, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, ecoou o discurso do chefe de que há “terrorismo climático” no Brasil e reclamou da combinação entre secas extremas e “pessoas ateando fogo no futuro do país”. Em rápida manifestação, ela elogiou o presidente, afirmando que ele recompôs o orçamento e uma série de atribuições da pasta. Marina ainda deu uma estocada no antecessor de Lula: “Não consigo imaginar o que seria de nós se tivéssemos ainda numa situação de completo desmonte da agenda ambiental brasileira”.
Jair Bolsonaro, o sujeito oculto dessa declaração, também abordou o tema, mas para registrar que, se ainda fosse o mandatário, não seria tratado com tamanha benevolência. “Quando é pela manutenção da democracia relativa, todo o sistema finge normalidade”, escreveu o ex-presidente numa rede social, surfando na desastrosa declaração de Lula — dada para negar a existência de uma ditadura na Venezuela — segundo a qual o conceito de democracia é relativo. “Vamos culpar o Bozo e segue tudo inabalavelmente inabalável”, acrescentou o capitão.
Debate interditado pela polarização
Durante a reunião, foi discutida a possibilidade de aprovação de projeto para tornar mais rigorosas as penas previstas para quem desmata e incendeia biomas. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), recomendou que se evitasse “populismo” e afirmou que o problema, neste momento, não é legislativo. Bastaria cumprir a lei em vigor.
Qualquer iniciativa legislativa tende a enfrentar resistência pesada na Congresso, onde os deputados têm demonstrado mais inclinação para atenuar do que para tornar severa a legislação ambiental. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), destacou que qualquer proposta precisa ser muito bem explicada para não ser interditada pelo debate ideológico. O que interessa a certos políticos é manter acesa a chama da polarização.