Amazonas define hoje governador para mandato-tampão
Eleição suplementar escolherá sucessor do ex-governador José Melo (Pros), cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral em maio. Mandato vai até o fim de 2018
Os 2,3 milhões de eleitores amazonenses vão às urnas neste domingo na primeira eleição suplementar direta da história do país para a escolha de um governador. O pleito definirá, entre nove candidatos, quem irá completar o mandato que era do ex-governador José Melo (Pros), cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por compra de votos – assim como seu vice, Henrique Oliveira (SD). Desde maio, quando o TSE cassou Melo, o estado é governado interinamente pelo presidente da Assembleia Legislativa, David Almeida (PSD).
A eleição ocorre em meio a um ambiente político conturbado e de crise nos serviços públicos no Amazonas. Enquanto velhos caciques se engalfinham para retomar o poder, a população enfrenta atendimentos precários na saúde, desemprego e uma crescente sensação de insegurança.
A corrida pelo Executivo amazonense mostra um tabuleiro político oposto ao da disputa municipal de um ano atrás, vencida pelo prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto (PSDB), que se reelegeu. Políticos que há bem pouco tempo estavam no mesmo palanque agora são adversários. O quadro nacional de alianças partidárias está desfigurado no estado.
O PCdoB, da senadora Vanessa Grazziotin, por exemplo, abandonou os petistas e os deixou, literalmente, sozinhos na Kombi do deputado estadual e candidato José Ricardo Wendling (PT) – com pouca estrutura, ele costuma fazer campanha discursando em cima do veículo. Os comunistas preferiram aliar-se ao senador Eduardo Braga, do PMDB, partido que é acusado por eles em nível nacional de liderar o “golpe” contra a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) – o próprio Braga, ex-ministro da petista, votou pela sua saída.
Já os tucanos romperam com os peemedebistas, mesma decisão tomada pelo PSD. O exemplo mais nítido disso foi a ruptura entre Eduardo Braga e Virgílio. Em 2016, os dois se aproximaram para a campanha de reeleição do tucano. Isso após o prefeito manauara acusar Braga de ter trabalhado diretamente, com o apoio do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, para sua derrota na disputa pelo Senado, em 2010.
Arthur Virgílio era, à época, um dos principais opositores ao presidente petista. Mas o namoro político entre o tucano e o peemedebista durou até o momento em que Eduardo Braga decidiu convidar Marcelo Ramos (PR) para ser seu candidato a vice-governador. Ramos foi o adversário direto de Arthur Virgílio no pleito municipal de 2016.
Outro efeito do troca-troca foi a reaproximação de Virgílio com o senador Omar Aziz (PSD), rompidos até os primeiros meses deste ano. Juntos, decidiram apostar suas fichas na corrida ao governo num velho cacique da política amazonense, o ex-governador e ex-prefeito de Manaus Amazonino Mendes (PDT). Após uma gestão mal avaliada à frente da prefeitura, seu último grande cargo político, Amazonino sequer disputou a reeleição em 2012. No estado, contudo, ele ainda é visto como uma das principais lideranças por seu legado de obras sociais e de infraestrutura.
Braga é apontado como o grande favorito na disputa. Governador entre 2002 e 2010, ele foi o responsável por levar à Justiça as denúncias de corrupção contra José Melo, contra quem disputou e perdeu as eleições de 2014. O peemedebista, que ocupou a pasta de Minas e Energia no governo Dilma, foi citado por delatores de empreiteiras investigadas pela Operação Lava Jato como beneficiário de esquemas de distribuição de propinas. Ele nega as acusações.
A relação entre Eduardo Braga e o presidente Michel Temer, seu colega de partido, também não está das melhores. Na votação da reforma trabalhista no Senado, Braga votou contra. As posições críticas têm feito com que ele perca espaço no governo federal, com a consequente demissão de aliados em órgãos federais no Amazonas.
Eleição na Justiça
Ocupando o cargo de governador desde maio, o deputado estadual David Almeida (PSD) se articulou para ser candidato na eleição direta. Ele, contudo, não teve o apoio do cacique do PSD, Omar Aziz, que fechou aliança com Amazonino. O efeito foi a ida do governador interino para o palanque da ex-deputada federal Rebecca Garcia (PP).
Abandonado pelo PCdoB, o PT teve como única opção sair numa chapa puro-sangue. O candidato, José Ricardo, vem no embalo da corrida pela Prefeitura de Manaus de 2016, quando chegou em quarto lugar, com 11% dos votos. Os petistas, tradicionalmente, nunca obtiveram grande espaço na política local, apesar das votações expressivas de Lula e Dilma no estado.
Ao todo, nove nomes estão na disputa. Além de Eduardo Braga, José Ricardo, Amazonino Mendes e Rebecca Garcia, são candidatos Luiz Castro (Rede), Marcelo Serafim (PSB), Liliane Araújo (PPS), Wilker Barreto (PHS) e Jardel Deltrudes (PPL).
A eleição direta para o mandato-tampão até o fim de 2018 chegou a ser suspensa no final de junho pelo ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), que aceitou recurso do vice-governador cassado Henrique Oliveira (SD), que queria assumir o cargo. Em 7 de julho, outro ministro do STF, Celso de Mello, revogou a decisão de Lewandowski. As eleições suplementares no Amazonas terão um custo de 18 milhões de reais à Justiça Eleitoral.
A cassação
Em 25 de janeiro de 2016, o Tribunal Regional Eleitoral, por 5 votos a 1, condenou Melo à perda do mandato por ter se beneficiado de esquema de desvio de recursos públicos para corromper eleitores. Após recursos, o caso chegou ao TSE, que determinou a perda dos mandatos de governador e vice e a realização de eleição direta. A cassação foi a sétima de um governador desde a redemocratização do país, em 1985.
A novidade é que o sucessor será escolhido em uma nova eleição popular, mudança prevista na minirreforma eleitoral que passou a vigorar no fim de 2015. Nos outros casos, a cadeira vaga foi ocupada pelo segundo colocado na disputa eleitoral ou por alguém escolhido por meio de votação indireta. A Assembleia Legislativa do Amazonas chegou a entrar com ação junto ao TSE para que o novo governador fosse eleito pelo plenário da Casa, mas o pedido foi negado tanto pelo tribunal eleitoral quanto pelo STF.
Estado em crise
Após ter começado o ano com uma das piores chacinas no seu sistema penitenciário, com 56 presos executados numa briga entre facções criminosas, o Amazonas vem enfrentando vários problemas. Nos hospitais de Manaus e do interior faltam medicamentos e equipamentos básicos. Sem leitos nas enfermarias, pacientes são colocados nos corredores. Familiares dizem que precisam levar itens como travesseiros, lençóis, toalhas e até remédios.
Nas ruas, aumentam os casos de roubos e assassinatos. Passageiros do transporte coletivo são as principais vítimas. Segundo o sindicato das empresas do setor, no primeiro trimestre deste ano, houve 842 assaltos nos ônibus de Manaus – aumento de quase 40% quando comparado a igual período do ano passado.
De acordo com o Atlas da Violência do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a taxa de homicídio no Amazonas cresceu 101,7% entre 2005 e 2015. Há dois anos, a taxa de pessoas assassinadas por 100.000 habitantes no estado era de 37,4. No Brasil ela é de 28,9.