Em julgamento que se estendeu por quase dez horas, os desembargadores federais da 8ª turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), por unanimidade de votos, afastaram as alegações preliminares e de mérito aduzidas pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mantendo sua condenação.
No tocante às preliminares, o resultado era mais do que esperado. As questões – dentre elas a incompetência e suspeição do juízo de primeiro grau e a nulidade pelo indeferimento da produção de provas – já haviam sido analisadas e rechaçadas anteriormente pela própria turma, em sede de habeas corpus – decisões essas confirmadas por nossos tribunais superiores.
Quanto ao mérito, não havia tanta certeza. A defesa pleitava a absolvição do ex-presidente, por ausência de provas. Aduziam, resumidamente, que não havia demonstração do ato de ofício que teria beneficiado a OAS, necessário para comprovação da materialidade do crime de corrupção passiva; a ausência de poder de fato de Lula, já que não era competência do presidente nomear diretores para a Petrobras; e a centralidade da acusação na palavra de uma delator, o que não é aceitável como prova.
No entanto, de forma unânime, os desembargadores entenderam que a indicação do ato de ofício é dispensável; que Lula indicou os diretores, ainda que não fosse sua competência funcional; e que existem inúmeras outras evidências, testemunhais e documentais, que corroboram a palavra de Léo Pinheiro.
Na fase de dosimetria da pena, também por unanimidade de votos, a majoraram, tornando-a definitiva em 12 anos e 1 mês de reclusão, em regime inicial fechado. Todas as penas acima de 8 anos impõem necessariamente o cumprimento em regime inicial fechado. Assim, além do efeito político de uma pena maior, os benefícios, como progressão de regime e liberdade provisória, são computados levando-se em consideração a pena total cominada ao réu.
A convergência de posicionamento na integralidade dos votos afastou a possibilidade de embargos infringentes, que seriam cabíveis no caso de votação não unânime, ainda que a divergência fosse apenas na dosimetria da pena.
Cabem, agora, apenas os embargos declaratórios, opostos quando há contradição, omissão ou obscuridade da decisão, no prazo de 2 dias após a publicação do acórdão. Em geral, não têm o condão de modificar a decisão, apenas esclarecê-la.
Pode ser expedido decreto condenatório após o julgamento dos embargos, em consonância com o entendimento atual do STF, que autoriza a prisão após decisão condenatória de segunda instância. No entanto, é provável que a defesa de Lula impetre habeas corpus perante os tribunais superiores, pleiteando que continue respondendo ao processo em liberdade. No caso de deferimento, a prisão ocorreria apenas após o trânsito em julgado da decisão condenatória.
Por fim, importante consignar que a inelegibilidade de Lula não é uma consequência automática de sua condenação. Embora a Lei da Ficha Limpa vede a candidatura de condenados em segunda instância, cabe à Justiça Eleitoral fazer essa avaliação, que ocorre apenas após o registro da candidatura. Nesse período, até o julgamento de eventuais recursos naquela esfera, a candidatura se mantém sub júdice, ou seja, seu registro pode ser cassado futuramente.
Caso o ex-presidente impetre um habeas corpus no STF pugnando para que continue respondendo o processo em liberdade, existem chances reais de o pleito ser deferido
Fernanda de Almeida Carneiro
Uma das maiores dúvidas que cerca a condenação de hoje é se e quando ocorrerá a prisão de Lula. Como já havia sido afirmado pelo TRF4, eventual decreto condenatório seria expedido apenas com o exaurimento dos recursos perante aquela instância: embargos de declaração opostos para esclarecer omissão, contradição ou obscuridade na decisão; ou embargos infringentes, caso a condenação fosse não unânime.
Assim, em tese, o mandado de prisão, pode ser expedido após o julgamento dos embargos de declaração, que certamente serão opostos pela defesa do ex-presidente (de 2 dias após a publicação do acórdão e julgados na sessão seguinte).
No entanto, a prisão após decisão condenatória de segunda instância foi apenas autorizada pelo STF, não sendo obrigatória. Mesmo assim, alguns ministros da Corte suprema vêm sinalizando uma mudança de posicionamento. Caso o ex-presidente impetre um habeas corpus pugnando para que continue respondendo o processo em liberdade, existem chances reais de o pleito ser deferido. Nesse caso, a prisão ocorreria apenas após o trânsito em julgado da decisão condenatória, ou seja, após o julgamento de todos os recursos cabíveis, inclusive aqueles perante o STJ e STF. É possível, portanto, que a prisão ocorra apenas após anos de tramitação desses recursos.
- Fernanda de Almeida Carneiro é criminalista do Castelo Branco Advogados e professora de pós-graduação em Direito Penal do IDP-São Paulo