Caso Alcolumbre mostra o quão difícil ainda é punir rachadinhas no Brasil
VEJA revelou que o senador apropriou-se de ao menos 2 milhões de reais pagos durante anos a seis assessoras fantasmas de seu gabinete
A palavra “rachadinha” já é popular no vocabulário do brasileiro desde os últimos dias de 2018, quando vieram à tona as investigações sobre o esquema de apropriação de parte dos salários de funcionários da Assembleia do Rio por vários deputados, incluindo Flávio Bolsonaro, o filho Zero Um do presidente, hoje senador (PL-RJ). Mas em 2021 o país viu outros nomes graúdos serem associados à prática. Em outubro, VEJA revelou que Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado e ex-presidente da Casa, apropriou-se de ao menos 2 milhões de reais pagos durante anos a seis assessoras fantasmas de seu gabinete. As funcionárias, mulheres pobres da periferia de Brasília, se deixaram contratar em troca de pequenas quantias pagas a elas — cujos comprovantes foram entregues à reportagem. A denúncia motivou pedidos de investigação na Procuradoria-Geral da República e no Tribunal de Contas da União.
Apesar do enorme desgaste político, Alcolumbre segue trabalhando normalmente, na confiança no histórico desse tipo de investigação. Até hoje, por incrível que pareça, ninguém foi punido. Flávio Bolsonaro é um bom exemplo disso. Após acumular vitórias no Superior Tribunal de Justiça, viu o Supremo Tribunal Federal enterrar de vez o processo contra ele ao decidir que o MP cometeu irregularidades na investigação, incluindo o desrespeito à prerrogativa de foro e o acesso a informações protegidas por sigilo sem autorização judicial. Seu irmão Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) tomou um susto em maio, quando a Justiça autorizou a quebra de seus sigilos bancário e fiscal pela suspeita do mesmo crime na Câmara do Rio. Mas o ano terminou sem avanço na apuração. A dificuldade para punir casos do tipo pode mudar quando o STF analisar uma ação contra o deputado Silas Câmara (Republicanos-AM) — ele foi denunciado em 2009 pela prática desse crime de 2000 a 2001. O caso seria julgado em novembro, mas foi retirado da pauta pelo presidente Luiz Fux. A expectativa é que a decisão crie um parâmetro para não deixar mais nenhum crime do tipo sem castigo.
Publicado em VEJA de 29 de dezembro de 2021, edição nº 2770