Em 1933, os nazistas queimaram montanhas de livros em praças da Alemanha. Entre os desafetos do regime de Adolf Hitler estavam autores como Bertolt Brecht, Sigmund Freud, Karl Marx, Albert Einstein e Friedrich Nietzsche. Um dos escritores que se tornaram clássicos mundiais, Thomas Mann, autor de A Montanha Mágica, tinha recebido o Nobel de Literatura dois anos antes de ver seus livros virarem cinzas.
Em Brasília, a Fundação Palmares iniciou não uma queima de livros, mas um expurgo de obras que considera inconvenientes. O presidente da entidade, Sérgio Camargo, divulgou recentemente um catálogo de livros que propagariam “a dominação marxista” na fundação. A lista inclui obras “pautadas pela revolução sexual, pela sexualização de crianças, pela bandidolatria e por um amplo material de estudo das revoluções e das técnicas de guerrilha”. Elas serão descartadas da biblioteca da fundação.
O acervo da Fundação Palmares é composto por 8 mil livros e, de acordo com o levantamento, mais da metade deles podem ser classificados como “de militância política explícita ou divulgação marxista, usando a temática negra como pretexto”. Apenas 5% cumpririam a missão institucional da entidade.
O levantamento critica o viés ideológico do acervo bibliográfico. “Friedrich Engels, comparsa de Marx durante boa parte de sua vida, também comparece em outras dezenas de livros”, diz trecho do documento. A entidade lista 300 títulos catalogados que comprovariam o desvio da “missão institucional da Fundação Palmares”. Além de Karl Marx, constam na lista obras de Max Weber, Erick Hobsbawn, Octavio Ianni, Nelson Werneck Sodré, Émile Durkheim, Raymond Aron, Caio Prado Jr., Simone de Beauvoir, Jacob Gorender, Celso Furtado, Nicolai Bukharin e Antonio Gramsci.
O expurgo de livros da Fundação Palmares chamou a atenção do secretário de Cultura do DF, Bartolomeu Rodrigues, que enviou ofício ao governo federal pedindo que os livros considerados inconvenientes sejam doados para a Biblioteca Nacional de Brasília. “Será uma grande honra receber os livros desses autores na Biblioteca Nacional”, diz o secretário. “Uma biblioteca é uma arena de ideias conflitantes, o que faz de nós uma civilização”. A Fundação Palmares, que não respondeu aos pedidos de entrevista, informou que os livros excluídos serão doados.