Dallagnol pediu a Moro verba da 13ª Vara para publicidade, aponta diálogo
Novas conversas do coordenador da Lava Jato no Paraná mostram ele pedindo apoio financeiro ao então juiz para custear campanha na Globo contra a corrupção
O procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato no Paraná, pediu, ao então juiz federal Sergio Moro, dinheiro da 13ª Vara Federal de Curitiba, que era comandada pelo hoje ministro da Justiça, para uma campanha publicitária em apoio à iniciativa que ficou conhecida como Dez Medidas contra a Corrupção.
O projeto, que foi uma iniciativa de Dallagnol e outros procuradores da Lava Jato, acabou recebendo milhares de assinaturas e foi apresentado na Câmara como sendo de iniciativa popular – desfigurado pelos parlamentares, esse projeto ainda tramita no Congresso Nacional.
“Você acha que seria possível a destinação de valores da Vara, daqueles mais antigos, se estiverem disponíveis, para um vídeo contra a corrupção, pelas dez medidas, que será veiculado na [TV] Globo??”, questionou Dallagnol no dia 16 de janeiro de 2016, segundo mensagens reveladas pelo jornalista Reinaldo Azevedo nos portais UOL e Band News, em parceria com o site The Intercept Brasil.
Segundo o procurador, a campanha custaria 38.000 reais. “A produtora está cobrando apenas custos de terceiros, o que daria uns 38.000. Se achar ruim em algum aspecto, há alternativas que estamos avaliando, como crowdfunding (coleta de dinheiro entre interessados em patrocinar uma determinada ação) e cotização entre as pessoas envolvidas na campanha”, disse o procurador.
Dallagnol também pede para que Moro “avalie de modo absolutamente livre” se o pedido pode “de qualquer modo arranhar a imagem” da Operação Lava Jato. Na sequência, o procurador enviou dois documentos a Moro, que respondeu no dia seguinte. “Se for só uns 38.000 acho que é possível. Deixe ver na terça e te respondo”, disse o então juiz.
O uso de verba da 13ª Vara Federal para pagar publicidade configura desvio de finalidade, de acordo com João Paulo Martinelli, advogado criminalista e professor da Escola de Direito do Brasil (EDB). Para ele, caso a verba seja recurso recuperado pela força-tarefa, ela deve voltar para a União, podendo ser utilizada se for objeto de lei orçamentária. “Se esse dinheiro já tiver sido objeto de lei orçamentária e tenha sido destinado à Vara, ele só pode ser utilizado dentro do que foi previsto em lei. Uma Vara não tem verba para publicidade porque foge do escopo do orçamento. Essa verba só pode ter desvio de finalidade se houver emergência, como uma obra no fórum, por exemplo”, disse a VEJA. “Administrativamente, essa conduta é contrária à lei”, completou.
De acordo com as mensagens divulgadas, não é possível afirmar que o dinheiro da 13ª Vara foi, de fato, utilizado para custear a campanha publicitária. A força-tarefa da Lava Jato, em nota oficial, negou. “A força-tarefa em Curitiba afirma que não reconhece as mensagens que têm sido atribuídas a seus integrantes nas últimas semanas. O material é oriundo de crime cibernético e não pode ter seu contexto e veracidade confirmados. Mais uma vez, é divulgado como verdadeiro fato que jamais ocorreu. Nunca houve qualquer tipo de direcionamento de recursos da 13ª Vara Federal para campanha publicitária ou qualquer ato relacionado às 10 medidas contra a corrupção”, dizem os procuradores na nota.
Os diálogos entregues por uma fonte anônima ao The Intercept Brasil também foram usados por VEJA, em parceria com o site, na produção de ao menos duas reportagens: uma de capa, que mostra como Moro de fato cometeu irregularidades e desequilibrou a balança da Justiça em favor da acusação; e outra sobre citações feitas pelos procuradores ao desembargador João Pedro Gebran Neto, relator da Lava Jato no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), a segunda instância da Justiça Federal na Região Sul.