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Dez dias de orgia: o despiste do PCC para escolher o cativeiro de Moro

Proprietária de chácara relata a VEJA a conversa que teve com mulher que integrava bando designado para raptar ex-juiz e possivelmente assassiná-lo

Por Laryssa Borges Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 29 jul 2023, 16h30

O local para a consolidação do mais ousado plano do Primeiro Comando da Capital (PCC) contra uma autoridade pública foi escolhido a dedo a apenas dois dias do segundo turno das eleições de 2022. Com muros de três metros de altura, quatro câmeras de segurança e uma central multimídia para armazenar qualquer vestígio de movimento suspeito, a pousada rural Vegas tinha posição estratégica.

Afastada cerca de 48 quilômetros da região central de Curitiba, imune a pedágios e rodeada por mata fechada, só era acessível depois de 18 quilômetros estrada de terra adentro. Oficialmente, o local é uma casa de festas alugada a 1.500 reais o fim de semana, mas naqueles dias de outubro a proprietária do imóvel, Tânia Castro, ouviu da potencial contratante que um grupo gostaria de reservar o local por um período de dez dias para fazer uma orgia.

Toda a negociação nos dias que antecederam a data de início do aluguel havia sido particularmente estranha. Uma mulher procurou a dona da chácara por meio de um aplicativo de mensagens e ofereceu pagar dez dias de diária. A locatária, que havia apresentado o nome falso de Luana, exigia que as câmeras de segurança fossem desligadas e, para tornar toda a situação ainda mais nebulosa, o dinheiro do aluguel, sacado na boca do caixa, seria entregue em mãos, em um petshop. Tânia desconfiou, mas o negócio foi fechado.

VEJA localizou a proprietária, que relata a conversa que teve com a falsa Luana, identificada pela Polícia Federal como Cíntia Melesqui, comparsa de Janeferson Aparecido Mariano Gomes, o Nefo, líder do grupo responsável por levantar a rotina do senador Sergio Moro e, a mando da cúpula do PCC, sequestrá-lo. Sua chácara seria o cativeiro do ex-juiz. “Lá não tem onde dormir, lá não tem quarto. Tem uma casinha de madeira caindo aos pedaços. Eu cobrei um valor já para não alugar. Cobrei 500 reais a diária. Eu não queria alugar porque achei que eles iriam me roubar. Quando pediu por dez dias, eu achei estranho. Ela falou que era para fazer uma orgia”, disse Tânia a VEJA. “Se é para orgia, um hotel sai mais barato. Eu disse que não tinha interesse e cobrei 5.000 reais, mas ela concordou em pagar”, completou.

Tânia afirma que um dia depois do início do contrato as câmeras de segurança foram subitamente desligadas e que ela cogitou descumprir o combinado e entrar na propriedade antes do fim da locação para saber se estava tudo em ordem. “Na primeira noite as câmaras funcionaram. No segundo dia, quando eu entrei [no sistema] não estavam mais funcionando. Ela desligou as câmeras. Comecei a entrar em contato, mas ela simplesmente não me respondia, não chegavam as mensagens, não tinha mais sinal. Se eu recebesse informações da vizinha que tinha gente, que estava um barulho, eu ia acabar indo na chácara e sendo morta”, diz. Menos de uma semana depois, ela foi acompanhada de um amigo policial vistoriar o local. Não havia mais ninguém. “Eu soube pela polícia que minha chácara era um possível cativeiro para o PCC”, relata.

Além da escolha do cativeiro, o grupo de Nefo rastreou os locais onde Sergio Moro e sua família moravam e costumavam frequentar. Imagens dos carros que a família utilizava, fotografias da decoração da sala de estar do ex-juiz e até um operador de drones foi colocado à disposição para a quadrilha monitorar passo a passo o alvo. Com apenas um integrante do bando foram contabilizados dados de um arsenal de 19 armas e dois carros. Em um dos e-mails vasculhados pela investigação, registros de mais de meio milhão de reais em armamento de altíssimo calibre, capaz inclusive de derrubar helicópteros, evidenciavam o poder bélico que, no limite, poderia ser usado contra o senador.

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O primeiro cativeiro foi abandonado após o grupo ter sido descoberto com documentos falsificados no aluguel de um apartamento que funcionaria como base operacional para o sequestro. O planejamento para o rapto, porém, foi retomado ainda em novembro. Até hoje, mais de quatro meses depois da prisão do bando, em 22 de março, não foram encontradas as armas reservadas para a empreitada criminosa, armazenadas em dois esconderijos do PCC.

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