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Livre, mas enrolado

Já era esperado: mal fundamentada, a prisão preventiva de Michel Temer durou apenas quatro dias. No entanto, ele ainda tem muito que explicar à Justiça

Por Roberta Paduan Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Sergio Ruiz Luz Atualizado em 4 jun 2024, 15h31 - Publicado em 29 mar 2019, 07h00
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  • A Operação Descontaminação sacudiu o país na quinta-feira 21, ao cumprir ordem de prisão de dez pessoas — entre elas, um ex-presidente da República. O espetáculo foi breve: Michel Temer passou apenas quatro dias em uma sala improvisada na sede da Polícia Federal do Rio de Janeiro. Foi solto na segunda-feira 25, por ordem do desembargador Ivan Athié, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Na saída da PF, uns poucos manifestantes receberam Temer com gritos de “ladrão”. A libertação era previsível: a ordem de prisão do juiz federal Marcelo Bretas era frágil em seus fundamentos. Também foram soltos os demais detidos na operação, inclusive o ex-­ministro Moreira Franco e João Baptista Lima Filho, o coronel Lima, apontado como laranja de Temer.

    A prisão preventiva, instrumento usado por Bretas, pode ser decretada apenas em casos específicos: quando o suspeito oferece risco à ordem pública, à ordem econômica ou, ainda, se estiver atrapalhando as investigações. Abusando de advérbios como “possivelmente” e “provavelmente”, Bretas, em seu mandado de prisão, não apresentou prova substantiva de que algum desses pré-requisitos tenha sido preenchido. Foi o que Athié alegou em sua decisão. Apesar de fazer elogios ao juiz de primeira instância, o desembargador foi curto e grosso ao qualificar as detenções como “atropelo das garantias constitucionais”.

    A Operação Descontaminação foi autorizada por Bretas a pedido do Ministério Público Federal, que acusa Temer de chefiar uma organização criminosa que teria movimentado, ao longo de quarenta anos, propinas no estratosférico valor de 1,8 bilhão de reais (estimativa imprecisa, que computa inclusive propinas “prometidas”). A quadrilha, sustenta o MPF, também seria responsável por lavar o dinheiro sujo originado de contratos com estatais e órgãos públicos, sobre os quais o ex-presidente tinha poder de influência. O mérito das acusações não foi ainda debatido, e só o será se Temer e seus colaboradores forem a julgamento. Até aqui, analisou-se apenas se havia razão para prender os suspeitos nessa fase do inquérito. Nos ha­beas-corpus concedidos, Athié não descarta indícios de envolvimento de Temer com crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Apenas indicou a inexistência de evidências sólidas de ocultação de provas ou tentativa de obstruir investigações.

    A decisão já na segunda-feira surpreendeu os procuradores. Um dia após as prisões, Athié afirmou que só julgaria os pedidos de ha­beas-corpus na quarta-feira 27, junto com os demais membros da Primeira Turma do Tribunal. Na segunda-feira, porém, o desembargador concedeu liberdade a todos os que permaneciam em prisão preventiva. Alegou ter mudado de ideia ao estudar o caso no fim de semana. Não seria correto esperar mais dois dias, concluiu, diante do tal “atropelo das garantias constitucionais”. A decisão de Athié foi dada em caráter liminar: os habeas-corpus ainda serão julgados pela Primeira Turma do TRF 2, em data a ser definida. Temer respira, mas continua enroladíssimo com a Justiça. É investigado em outros oito inquéritos e acaba de se tornar réu no caso da mala com 500 000 reais de propina da JBS transportada por seu ex-assessor Rodrigo Rocha Loures.

    Publicado em VEJA de 3 de abril de 2019, edição nº 2628

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