No mundo das teorias conspiratórias do presidente Jair Bolsonaro, em três anos de governo poucas chegaram ao nível de paranoia de uma que tomou conta do alto escalão do Executivo ainda em 2019, quando o ex-capitão, tomado pelo temor de ser apeado do cargo já no primeiro ano de mandato, acreditou que poderia ser alvo de um pedido de impeachment relâmpago. O motivo não eram as desavenças com o Congresso na fase que antecedeu seu casamento com o Centrão, mas uma sucessão de rebeliões e sublevações que matariam sua gestão ainda no nascedouro.
Em fevereiro de 2019, o Ministério da Justiça, então comandado pelo hoje presidenciável Sergio Moro, transferiu 22 líderes da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) do presídio de Presidente Venceslau (SP) para penitenciárias federais de segurança máxima. Na cabeça de Bolsonaro, diante da ordem de Moro, o grupo criminoso fatalmente orquestraria um plano contra a transferência de seus líderes, entre os quais Marco Wilians Herbas Camacho, o Marcola, e aterrorizaria a população. Ato contínuo, o Congresso consideraria que a desordem era responsabilidade do presidente e abriria um processo de impeachment contra ele.
Marcola deixou o interior de São Paulo rumo ao presídio federal de segurança máxima de Rondônia após a descoberta de um ousado plano para resgatá-lo, que incluía bombas contra os muros de Presidente Venceslau, um resgate de helicóptero e, na sequência, o embarque, em um jatinho, rumo ao Paraguai. Pouco tempo depois, por considerarem que uma rota de fuga via Rondônia ainda era factível, o traficante foi deslocado novamente, desta vez para o presídio de Brasília, onde está até hoje.
O temor do presidente com a transferência dos criminosos era tanto que dias antes da operação, ele enviou uma mensagem por meio de um aplicativo a Moro pedindo que ninguém fosse transferido para presídio algum. O então ministro conseguiu demovê-lo de abortar a operação, batizada de Imperium, e Marcola e cia foram levados para as penitenciárias. O episódio é narrado pelo próprio Sergio Moro em seu recém-lançado livro de memórias.
“A poucos dias da deflagração da Operação Imperium, fui surpreendido com uma mensagem dele [Bolsonaro] no meu celular sugerindo o cancelamento das transferências. Bolsonaro disse estar receoso de possíveis retaliações do crime organizado contra a população civil e temia que, se isso acontecesse, o governo federal fosse responsabilizado, inclusive com impeachment no Congresso”, relata Moro.
Em novembro de 2018, já no governo de transição, a Justiça também havia autorizado, a pedido do Ministério Público, a transferência de outros cinco líderes do PCC para presídios federais, mas não se tem notícias de que Bolsonaro, que na época montava sua equipe de auxiliares, tenha considerado a hipótese de a facção inviabilizar sua administração.