O peso da influência do papa para os políticos brasileiros
No país que tem cerca de 100 milhões de católicos, uma foto ao lado do pontífice ainda funciona como um eficiente passaporte eleitoral
A exemplo do esforço protagonizado pelo ministro da Fazenda, autoridades brasileiras têm cruzado o Atlântico em busca de garantir alguns poucos minutos com o papa Francisco. O breve encontro no Vaticano costuma seguir um roteiro similar, com direito a cumprimentos, entrega de presentes e alguma demanda específica — tudo, claro, devidamente registrado em vídeo ou fotografia para posterior divulgação. Cada um aproveita o momento à sua forma. Recentemente, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, entregou ao pontífice uma camisa do Palmeiras e pediu para ele abençoar uma bandeira do Rio Grande do Sul. O governador Eduardo Leite, que teve o encontro duas semanas antes da tragédia gaúcha, o convidou para uma visita ao Brasil — também deixando de presente uma caixa com o uniforme dos times do estado. Já o líder do governo Lula na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), esteve com Francisco no início do ano e pediu que o Padre Cícero, principal referência religiosa do Ceará, seja reconhecido como santo.
Todos os encontros costumam ser rápidos e em meio a audiências lotadas de fiéis. Mas a romaria, especialmente de políticos brasileiros, impressiona. Assim como Fernando Haddad, com a ajuda do Itamaraty, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), não só garantiu uma agenda privada com o papa como ainda levou a tiracolo o presidente de seu partido, Gilberto Kassab. Na ocasião, Silveira entregou a Francisco uma carta escrita pelo presidente Lula. Driblando o protocolo da Santa Sé, a ex-presidente Dilma Rousseff também conseguiu uma conversa exclusiva com o pontífice, que fez questão de lhe dar uma série de regalos religiosos. “Reza por mim, e eu rezo por você”, disse Francisco à petista em abril.
Em alta, especialmente entre os petistas, o papa já criticou a prisão de Lula (o presidente o visitou no ano passado), fez discurso contra o “ódio” na véspera da eleição de 2022 e encampa uma agenda ambiental sustentável, sob o argumento de que a destruição “ofende a Deus”. Enquanto presidente, Jair Bolsonaro não lhe conferia a mesma devoção nem sequer visitou o pontífice quando foi a Roma, em 2021. Dentro de casa, porém, teve gente que não perdeu a oportunidade. No fim do primeiro ano do mandato do marido, Michelle Bolsonaro foi a um encontro de primeiras-damas no Vaticano e posou sorridente ao lado dele. Estava acompanhada da então ministra Damares Alves, que, assim como ela, é evangélica fervorosa. “Foi uma tarde incrível ao lado deste líder religioso amado por muitos”, celebrou a hoje senadora Damares após o encontro. A fé rende votos.
Publicado em VEJA de 7 de junho de 2024, edição nº 2896