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Os 10 desafios cruciais que o Brasil terá que enfrentar depois da eleição

Passada a campanha mais polarizada da história, será a hora de olhar questões que são consenso entre quem quer um futuro mais decente para o país

Por Laísa Dall'Agnol Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Sérgio Quintella Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Reynaldo Turollo Jr., Victoria Bechara Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 11h56 - Publicado em 30 set 2022, 06h00
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  • RETA FINAL - Corrida ao Planalto: a campanha foi marcada pelo debate superficial dos principais problemas da população -
    RETA FINAL - Corrida ao Planalto: a campanha foi marcada pelo debate superficial dos principais problemas da população – (fotos Ricardo Stuckert; Kaio Lakaio; Evaristo Sa/AFP; Sergio Lima/AFP; Egberto Nogueira/Ímãfotogaleria; Antonio Milena/.)

    A disputa ao Palácio do Planalto mais longa e polarizada da história chega finalmente à reta final. Às vésperas do primeiro turno, no domingo 2, o favoritismo está com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O petista investiu pesado em uma campanha de voto útil com o objetivo de antecipar a vitória e, ao longo da semana decisiva, aproximou-se da meta de alcançar mais de 50% dos votos válidos, embora dentro da margem de erro dos institutos, o que deve deixar em suspense até quase o último minuto a definição. Seu principal rival, o presidente Jair Bolsonaro, reagiu aumentando a dose de caneladas no adversário, com menções explícitas à enorme lista de casos de corrupção dos governos petistas. Lula revidou os ataques mirando um dos pontos mais suspeitos da multiplicação do patrimônio da família presidencial, realizada em boa parte à base da compra de imóveis com dinheiro vivo.

    Apesar da escalada na troca de acusações, as pesquisas mostram que, embora a corrupção seja um tema importante na decisão de voto, os eleitores estão muito mais preocupados com questões urgentes do dia a dia, como o desemprego e a inflação. Numa campanha presidencial que bateu recordes de superficialidade nos debates, os candidatos não se aprofundaram em propostas para a área. Ficaram também praticamente fora dos debates outros problemas graves, como as dificuldades do SUS e o enorme déficit educacional deixado pela pandemia. Baixada a poeira da disputa, o vencedor terá de deparar com essas e outras questões num cenário bastante adverso. “Será preciso pacificar o país e criar condições para a retomada do crescimento econômico”, afirma o cientista político Bolívar Lamounier. A seguir, confira quais são os dez desafios mais urgentes do país para os próximos anos.

    arte Brasil

    RETOMAR O CRESCIMENTO

    Líder nas pesquisas, Lula passou a campanha toda se esquivando de detalhar o que pretende fazer para colocar o Brasil nos trilhos do crescimento. Nos palanques, repetiu a promessa de trazer de volta a prosperidade dos tempos de seu governo, há quase vinte anos, quando as condições internas e mundiais eram outras. O ministro da Economia, Paulo Guedes, fazendo às vezes de garoto-propaganda de Bolsonaro, caprichou também num discurso vago, falando apenas em mais liberalismo e menos impostos. Perfeito, mas em que frentes? A superficialidade do debate preocupa no Brasil que, segundo as projeções do mercado financeiro, corre o risco de só recuperar o nível de crescimento pré-crises (recessão 2015-2016 e pandemia) em 2024. Um dos problemas urgentes a ser enfrentados é o da inflação. Ela segue muito elevada — e deve continuar acima de 5% em 2023 —, corroendo o poder de compra e a capacidade de o PIB evoluir com um forte impulso do consumo interno. Além de políticas que promovam ganhos de produtividade, é preciso restabelecer a austeridade e a responsabilidade fiscal. Nesse aspecto, a desmoralização do teto de gastos públicos feita no governo Bolsonaro é outro dilema a ser enfrentado. Se depender de Lula, corre-se o risco de o problema nunca ser resolvido, caso ele leve adiante o que vem prometendo na campanha. “Acabou o teto de gastos quando eu for presidente”, afirmou ele na quadra da Portela, do Rio. A campanha petista vem tentando minimizar esse tipo de gesto, dizendo que certamente será criado um novo regime fiscal, mas sem entrar em detalhes do que exatamente está em estudo. Segundo o ex-ministro Maílson da Nóbrega, o próximo presidente precisará reequilibrar as contas públicas, o que envolve cortar gastos em pessoal, Previdência, saúde, educação e programas sociais. “Eu não vejo em nenhum dos candidatos essa disposição”, afirma. “E não resolver esses problemas condenará o Brasil a seguir medíocre no crescimento econômico e ter a pior crise fiscal dos últimos anos”, completa.

    NADA MUDA - Fila do Auxílio Brasil: ajuda para 21 milhões de famílias em 2023 -
    NADA MUDA - Fila do Auxílio Brasil: ajuda para 21 milhões de famílias em 2023 – (Fabiano Rocha/Agência O Globo)

    REDUZIR A DESIGUALDADE

    Uma das cenas marcantes da campanha foram as imagens produzidas em diferentes cidades do país de pessoas fazendo fila para pegar ossos em açougues. São retratos de um drama nacional que se agravou nos últimos anos e ilustrados por dois números vexatórios: 10 milhões de desempregados e mais de 30 milhões de pessoas assoladas pela fome. Pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mapeou o que os eleitores acreditam ser as medidas mais urgentes na área econômica. Geração de empregos liderou a sondagem, citada por 44% dos entrevistados. Na sequência, aparecem redução da desigualdade social e da pobreza (26%), redução de impostos (26%) e combate à inflação (24%). As preocupações parecem ilustrar assertivamente um cenário de vulnerabilidade social e de deterioração de renda, em que milhões ainda dependem de programas sociais do governo. Em setembro, os beneficiários do Auxílio Brasil chegaram a 20,65 milhões de brasileiros. O adicional de 200 reais — que fez com que o benefício atingisse o valor mensal de 600 reais — terá vigência até dezembro e acabou criando uma demanda cujo suprimento será uma incógnita a partir do ano que vem. “As demandas vão continuar, o que traz desafios fiscais para o governo”, alerta Joelson Sampaio, economista e professor da Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas de São Paulo. Os principais candidatos prometem manter o programa de renda básica, mas, até o momento, nenhum deles explicou em detalhes como fará para acomodar essa conta no Orçamento.

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    PODER DE COMPRA - Consumidor faz as contas: inflação elevada está no topo das preocupações da população -
    PODER DE COMPRA - Consumidor faz as contas: inflação elevada está no topo das preocupações da população – (Rafael Martins/AFP)

    REALIZAR AS REFORMAS

    A discussão sobre o papel do Estado na economia também é uma das questões que o próximo governante terá de enfrentar. Se, por um lado, o governo Bolsonaro entregou reformas importantes, como a da Previdência, por outro, mudanças consideradas igualmente necessárias ficaram pelo caminho, como as reformas administrativa e tributária. Ambas são fundamentais para determinar quanto vai custar e quem vai pagar o estado que emergirá no novo governo. No caso da tributária, Geraldo Alckmin (PSB), o vice de Lula, já prometeu capitaneá-la nos seis primeiros meses de um eventual governo. A mesma sinalização foi dada por Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central na gestão de Lula, que declarou apoio ao petista. Ele já deixou claro que a reformulação do sistema de impostos do país é vital para a retomada do crescimento. Outra questão central são as privatizações. O ministro da Economia, Paulo Guedes, prometeu acelerar as desestatizações em um eventual segundo mandato de Bolsonaro, enquanto Lula vai no sentido oposto, já tendo declarado ser contra a privatização da Petrobras e dos bancos oficiais. É verdade que o presidente conseguiu vitórias nesse campo, como a venda da Eletrobras, mas o programa caminha muito aquém da velocidade necessária.

    HUMILHAÇÃO - Pessoas buscam comida em Belém: mais de 30 milhões de brasileiros assolados pela fome -
    HUMILHAÇÃO - Pessoas buscam comida em Belém: mais de 30 milhões de brasileiros assolados pela fome – (Raimundo Pacco/AFP)

    TIRAR O SUS DA UTI

    Criado pela Constituição de 1988, o SUS enfrentou a prova mais dura de sua história nos últimos dois anos, durante a pandemia. Saiu-se muito bem ao longo do duríssimo teste, feito admirável para uma engrenagem que já vinha combalida há décadas. Um dos principais problemas e que está levando o SUS à UTI financeira é a desatualização da tabela sobre a qual o governo federal faz o ressarcimento à rede conveniada por serviços médico-­hospitalares prestados. Em alguns casos, a defasagem chega a 90%. “O financiamento da saúde é um dos principais temas que o próximo presidente precisará resolver”, afirma o infectologista e pesquisador da Fiocruz Julio Croda. Outro desafio inevitável para os próximos anos é reconstruir o próprio Ministério da Saúde, cujas políticas públicas foram afetadas após a entrada e saída de quatro ministros em quase quatro anos, incluindo o programa nacional de imunização. Discursos negacionistas detonados em meio ao combate à pandemia (com a ilustre participação do presidente) não impediram a aceitação em massa pela população dos imunizantes, mas afetaram indiretamente outras campanhas. Com isso, há a possibilidade de reaparecimento de doenças, como a varíola, que estavam erradicadas havia décadas.

    DOIS MUNDOS - Aula em colégio de SP: a pandemia ampliou o déficit de aprendizado para quem não podia estar conectado -
    DOIS MUNDOS - Aula em colégio de SP: a pandemia ampliou o déficit de aprendizado para quem não podia estar conectado – (Jonne Roriz/.)
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    REDUZIR O DÉFICIT EDUCACIONAL

    Na turma do fundão da sala de aula dos rankings internacionais de educação, o Brasil viu a sua situação se agravar com a pandemia. Um estudo realizado pelo IMD World Competitiveness Center mostrou que o país ocupa a 64ª e última posição de um ranking que compara a competitividade das nações. Um dos primeiros a fechar suas escolas e um dos últimos a reabri-­las, o país convive com um cenário agravado pela evasão e pelo déficit de aprendizado. O resultado são dois Brasis, o de alunos conectados e com aulas remotas, e o outro, a maioria, de crianças e jovens atrasados e vivendo ainda na era da lousa e do giz. “O próximo presidente não vai conseguir resolver os principais problemas se não investir em gente. No Brasil, 80% das crianças estão sendo preparadas para a vida dentro de uma escola pública, mas só 33% dos alunos do segundo ano sabem ler”, afirma Camila Pereira, diretora da Fundação Lemann. Com cinco ministros durante a gestão de Bolsonaro, incluindo o breve Carlos Alberto Decotelli da Silva, que durou cinco dias no cargo devido a incongruências em seu currículo, o MEC ainda foi alvo de denúncias de corrupção que derrubaram e levaram à prisão o seu mais longevo comandante, o pastor Milton Ribeiro.

    VITÓRIA - Vacinação no Rio: imunizantes contra a Covid-19 foram aceitos pela população apesar de pregação negacionista -
    VITÓRIA - Vacinação no Rio: imunizantes contra a Covid-19 foram aceitos pela população apesar de pregação negacionista – (André Coelho/EFE)

    REEQUILIBRAR OS PODERES DA REPÚBLICA

    O governo atual foi marcado por dois movimentos que geraram desgaste institucional: o enfrentamento de Bolsonaro com o Judiciário e a capitulação política do governo ante o Congresso, que ganhou superpoderes. No primeiro caso, o estado de crise permanente tem a ver com o estilo de Bolsonaro. “Temos um presidente que não se conforma com as regras constitucionais”, diz Oscar Vilhena, professor de direito da FGV. Outro problema é o fato de o STF ter acumulado competências demais ao longo dos últimos anos, o que acirrou a disputa política por espaço na Suprema Corte, como fez Bolsonaro ao escolher André Mendonça pelo fato de ele ser “terrivelmente evangélico”. Em 2023, o presidente indicará dois ministros para os lugares de Rosa Weber e Ricardo Lewandowski, que se aposentam, o que deve manter o STF no foco.

    Com relação ao Congresso, a maior dificuldade do novo governo será construir uma maioria sem entrar em choque com os parlamentares acostumados a controlar a distribuição de 16 bilhões de reais em emendas só neste ano. “Se o Centrão continuar majoritário, o governo terá de pensar em formas alternativas de lidar com as emendas de relator. O ideal seria extingui-las”, diz Joyce Luz, pesquisadora do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento).

    DESTRUIÇÃO - Gado em área de Tailândia (PA): o país precisa conciliar melhor agronegócio e meio ambiente -
    DESTRUIÇÃO - Gado em área de Tailândia (PA): o país precisa conciliar melhor agronegócio e meio ambiente – (Joao Laet/AFP)
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    ATACAR OS GARGALOS DE INFRAESTRUTURA

    O governo Bolsonaro conquistou algumas vitórias importantes na área, como a aprovação do Marco Legal do Saneamento. Também entram na cota de sucesso as privatizações de aeroportos em todos os estados, com destaque para o de Congonhas, em São Paulo, negociado em agosto, juntamente com outros dez terminais, por 2,4 bilhões de reais. Apesar dessas conquistas, o país precisa avançar muito mais no setor de infraestrutura. O Brasil investe 1,57% do PIB na área, um número quase irrisório diante das necessidades. O porcentual, o menor em onze anos de série histórica, é muito aquém dos 5% do PIB que já foram investidos no passado. A média mundial é superior a 4% e a China investe mais de 8 pontos porcentuais de seu PIB em infraestrutura. “Se o Brasil quiser crescer e melhorar, terá de investir em infraestrutura, não há outro jeito, pois isso tem impacto direto sobre a competitividade da economia e das exportações”, alerta Gesner Oliveira, coordenador do Centro de Estudos de Infraestrutura e Soluções Ambientais da FGV.

    AVANÇO - Porto de Santos: o maior terminal de cargas do país deve ir para a iniciativa privada ainda em 2022 -
    AVANÇO - Porto de Santos: o maior terminal de cargas do país deve ir para a iniciativa privada ainda em 2022 – (Norberto Marques/Shutterstock)

    CONCILIAR AGRONEGÓCIO COM RESPONSABILIDADE AMBIENTAL

    Segundo pesquisa do PoderData encomendada pelo iCS (Instituto Clima e Sociedade), oito em cada dez eleitores acreditam que a Amazônia deve estar entre as prioridades dos presidenciáveis — e mais de sete em cada dez acreditam que o desenvolvimento econômico está atrelado à preservação do bioma. O tema, no entanto, tem sido pouco abordado na campanha. Nas últimas semanas, Lula atraiu para sua rede de apoios a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, com quem estava rompido, como forma de reforçar uma imagem de preocupação com essa área. Outros candidatos falam genericamente na necessidade de preservação da floresta e de incentivo ao agronegócio responsável, mas sem entrar em detalhes. Seria fundamental debater mais propostas sobre como manter aquecido o setor que hoje representa 27% do PIB nacional — mas de forma que atue em conformidade com a preservação ambiental. “O Brasil está com uma imagem muito ruim lá fora com relação ao controle do desmatamento”, diz Leandro Gilio, pesquisador sênior e professor do Insper Agro Global. “As grandes empresas do agro têm essa visão de que o problema precisa ser resolvido para que os produtos atinjam outros mercados. Grandes exportadores de carne, por exemplo, têm trabalhado em ações de rastreio para que não adentrem zonas de desmatamento”, completa o especialista.

    TENSÃO - Rosa Weber assume o STF: crise quase permanente com Bolsonaro -
    TENSÃO – Rosa Weber assume o STF: crise quase permanente com Bolsonaro – (Rosinei Coutinho/SCO/STF)

    COMBATER O CRIME ORGANIZADO

    Na área de segurança, o país vivenciou nos últimos anos o crescimento exponencial de armas nas mãos da população (prioridade do governo) e a expansão do crime organizado, sobretudo nas fronteiras. Na Amazônia, os assassinatos do indigenista Bruno Araújo Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips, em junho passado, jogaram luz em ações de grupos ilegais que transitam em vários tipos de ilícitos, do pescado clandestino ao desmatamento predatório das florestas. As facções criminosas passaram cada vez mais a ter caráter nacional, em alguns casos atuando em “consórcio” com gangues regionais. “Na região amazônica, a sobreposição de ilícitos é algo desafiador e relativamente novo. O garimpo e os madeireiros, que não são do PCC, começam a atuar em conjunto, pois as rotas são praticamente as mesmas, assim como o destino”, afirma Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Um dos resultados preocupantes dos tentáculos do crime organizado são as conexões com outros segmentos, como o político. A população carcerária precisa também entrar no rol de preocupações do próximo presidente. A despeito da transferência de líderes de facções para presídios federais, instituída pelo ex-ministro da Justiça Sergio Moro, o país possui mais de 919 000 detentos, acondicionados em 1 500 unidades prisionais. “São setenta facções criminosas de origem prisional país afora, que usam a mão de obra local e formam verdadeiros home offices do crime, com comando total do tráfico, de assassinatos e todo tipo de violência”, diz Raul Jungmann, ex-ministro extraordinário da Segurança Pública na gestão de Michel Temer (MDB).

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    NOVA ORDEM - Cerimônia em Xangai: relação com a China é vital para o Brasil -
    NOVA ORDEM - Cerimônia em Xangai: relação com a China é vital para o Brasil – (Hector Retmal/AFP)

    POLÍTICA EXTERNA ALINHADA COM O NOVO CENÁRIO INTERNACIONAL

    O Brasil sempre teve uma posição relevante no cenário internacional e uma relação de harmonia com outras nações. No entanto, a imagem do país foi gravemente distorcida durante o governo Bolsonaro. Ao longo de sua gestão, o presidente imprimiu uma baliza ideológica para a política externa, o que o levou a subir o tom com países governados por líderes de esquerda, como os vizinhos da América do Sul, ou a provocar gratuitamente a China, nosso maior parceiro comercial. Também trocou caneladas por causa da política ambiental com países importantes da Europa, como França, Alemanha e Noruega, e se absteve ou adotou posições minoritárias em discussões importantes na ONU. O clima com os Estados Unidos também piorou após a derrota de Donald Trump, com quem Bolsonaro mantinha alinhamento. Independentemente de quem for eleito, o próximo a ocupar o Planalto terá a missão de recalibrar a relação do Brasil com o mundo e recuperar o status do país no exterior. “Relações estremecidas com aliados e organizações internacionais vão demandar uma retórica diferente e ações concretas no campo do meio ambiente, da integração regional, dos direitos humanos e do respeito ao estado democrático de direito”, diz Felipe Loureiro, professor do Instituto de Relações Internacionais da USP. A armadilha, da qual Bolsonaro não escapou e com a qual Lula ameaça flertar, é deixar que a cegueira ideológica impeça o país de se colocar na nova ordem mundial que vem se desenhando, com uma guerra que empareda a Rússia, a possibilidade de recessão na Europa e a crescente influência política global da China.

    Publicado em VEJA de 5 de outubro de 2022, edição nº 2809

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