Os interesses por trás do caso que assombra Brasília
Destino de políticos e celeridade estaria no centro do jogo de interesses em definir o relator do caso no STF

No centro de uma disputa de bastidores sobre que integrante do Supremo Tribunal Federal (STF) deveria ser responsável pela Operação Overclean, o ministro Kassio Nunes Marques recebeu nos últimos dias relatos sobre os motivos estariam por trás da iniciativa da Polícia Federal de tentar direcionar para o gabinete do ministro Flávio Dino a investigação – um caso de fraude em licitações que pode ter ramificações em mais de dez estados e atingir figurões da classe política.
Em janeiro, a PF na Bahia enviou o caso à suprema corte com um pedido para que Dino, antigo superior hierárquico da corporação, fosse designado relator daquela apuração porque ela estaria relacionada ao tema mais turbulento sob a batuta do magistrado: a ação que contesta o pagamento sem transparência e rastreabilidade de bilhões de reais em emendas parlamentares.
A Overclean começou a partir de fraudes em licitações de projetos de pavimentação de ruas sob responsabilidade do Departamento Nacional de Obras contra as Secas (Dnocs) na Bahia com o dinheiro de emendas parlamentares, mas reuniu indícios de que o esquema se espalhou pelo país e movimentou mais de 1 bilhão de reais nos últimos anos.
O caso não é a primeira nem a única investigação criminal sobre desvio de dinheiro de emendas parlamentares no Supremo, mas promete ser a mais rumoroso. Existem pelo menos 24 ações sobre desvio de recursos a que congressistas têm direito em tramitação no tribunal, divididos em seis gabinetes. A maior parte delas, nove, com Nunes Marques, personagem do tiroteio da vez.
Interlocutores de Kassio atribuem a ofensiva para centralizar esta investigação específica em Dino a uma disputa política na Bahia, estado central nas investigações. O principal alvo até o momento, o empresário Marcos Moura, tem forte relacionamento com políticos baianos — o único parlamentar citado até agora é o deputado baiano Elmar Nascimento (UB-BA), 2º vice-presidente da Câmara, e foi no município baiano de Campo Formoso que um primo do parlamentar jogou mais de 200.000 reais em dinheiro vivo pela janela ao avistar a polícia.
O raciocínio dos interlocutores é o seguinte: se a Polícia Federal conseguisse direcionar as apurações para o gabinete de Dino, as investigações seriam mais céleres e não haveria possibilidade de poupar figurões da cena política. Na linha de tiro em potencial estariam, por exemplo, o ex-prefeito de Salvador Antonio Carlos Magalhães Neto, que, segundo a PF, aparece mencionado em mensagens de investigados sob o codinome de “o zero um antigo”. ACM Neto não é investigado na Overclean.
Em um país que acumulou escândalos políticos nas últimas décadas, a corrupção com dinheiro público está longe de ser uma novidade, mas em um de seus despachos de cobrança sobre a rastreabilidade dos recursos de emendas parlamentares o ministro Flávio Dino havia afirmado que a falta de regras para o pagamento de emendas resultara em “malas de dinheiro sendo apreendidas em aviões, cofres, armários ou jogadas por janelas” – uma referência direta ao potencial explosivo da Operação Overclean. A ofensiva da PF para levar o caso a Dino não funcionou, mas as suspeitas de que interesses paralelos estão em jogo ainda parecem longe do fim.