Fortaleça o jornalismo: Assine a partir de R$5,99
Continua após publicidade

O futuro político de Lula está nas mãos de Bolsonaro

A escolha da vaga de ministro do STF em novembro pode eliminar de vez o petista do mapa político — ou ressuscitá-lo e fulminar a Operação Lava-Jato

Por Laryssa Borges Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Marcela Mattos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 15h23 - Publicado em 11 set 2020, 06h00

Na segunda-feira, pouco depois das comemorações de 7 de Setembro, em um restaurante de Brasília, dois importantes auxiliares do presidente Jair Bolsonaro especulavam sobre um dos segredos mais bem guardados da República: o nome que será indicado para ocupar a próxima vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). “Deve ser um evangélico. Mas, se eu tivesse que apostar, aposto que será o Jorge”, diz o primeiro auxiliar. O segundo discorda: “O Jorge? O Jorge é muito talentoso, mas o presidente precisa dele no gabinete, por perto, ajudando a organizar as coisas. O André parece mais preparado para esse cargo. E tem o Aras, né?”. “É verdade. Mas o Aras ainda está fazendo curso para evangélico”, ironizou o primeiro. O tema da conversa não é aleatório. Há muitos interesses e muitos interessados no perfil do futuro ministro, especialmente porque pode acabar nas mãos dele uma decisão capaz de provocar a maior reviravolta política dos últimos tempos.

3.jpg
EM CAMPANHA - Lula: a certeza de que a decisão de Bolsonaro vai beneficiá-lo fez com que o petista começasse a se movimentar para organizar a oposição – (//Reprodução)

No início do ano que vem, tão logo o STF volte a funcionar de maneira presencial, a Segunda Turma vai julgar se o ex-juiz Sergio Moro atuou ou não com parcialidade ao condenar o ex-presidente Lula por corrupção na Operação Lava-Jato. Quatro votos são conhecidos no colegiado — dois, dos ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, favoráveis a punir Moro por falta de isenção, e dois, de Edson Fachin e Cármen Lúcia, em favor do ex-juiz. O quinto ministro da turma é Celso de Mello, que se aposentará em novembro. Se esse cronograma for cumprido e não ocorrer nenhuma manobra de ocasião (nenhum pedido para mudança de turma dos atuais componentes da Corte), o voto de minerva será proferido pelo ministro que Bolsonaro indicar. Em outras palavras, o destino de Lula passa pela caneta de seu maior desafeto.

Ex-presidiário e condenado a 26 anos de cadeia por corrupção e lavagem de dinheiro, Lula ainda alimenta o sonho de voltar a comandar o país. A suspeição de Sergio Moro derrubaria, ainda que de forma temporária, a proibição imposta pela Lei da Ficha Limpa para que ele volte a se candidatar. O petista foi julgado e considerado culpado em dois processos em primeira e segunda instância. Beneficiário do maior escândalo de desvio de dinheiro da história, o ex-presidente acusa o ex-­juiz Sergio Moro de persegui-lo e agir por motivação política. Caso o STF acolha esses argumentos, as condenações seriam anuladas e ele recuperaria, de imediato, seus direitos políticos. Sa­be-se lá por que, Lula tem absoluta certeza de que o veredicto será a seu favor — e já tenta se recolocar no cenário político, mirando, claro, as eleições presidenciais de 2022.

Sessão plenária. Foto: Nelson Jr./SCO/STF (09/09/2020)
DESTINO - A Segunda Turma do STF: decisão sobre a suspeição do ex-juiz pode favorecer candidatura de Lula – (Nelson Jr./STF)
Continua após a publicidade

Desde novembro do ano passado, quando deixou a cadeia, o petista e seus apoiadores se deram conta de que a única pauta que lhes rendia algum holofote — o “Lula Livre” e os ataques coordenados à Operação Lava-Jato — ficou esvaziada. O ex-presidente aos poucos foi caindo no esquecimento, suas participações em conferências virtuais não atraíam um grande público e a memória de seu governo vem sendo apagada inclusive entre os eleitores que historicamente o apoiaram. Na segunda-feira 7, o ex-presidente divulgou uma gravação na qual se coloca como uma pessoa com credibilidade suficiente para encarar a função de líder da oposição e encabeçar o que chamou de um processo de “reconstrução” do país. Lula também fez uma série de ataques à gestão de Jair Bolsonaro, a quem chamou de irresponsável, e disse ter refletido sobre o papel que ainda lhe cabe “na luta do nosso povo por melhores condições de vida”. “Eu sei, vocês sabem, que podemos de novo fazer do Brasil o país dos nossos sonhos. E dizer, do fundo do meu coração, estou aqui, vamos juntos reconstruir o Brasil, ainda temos um longo caminho a percorrer juntos”. Assustador.

Sergio Moro
QUEM DIRIA? - Sergio Moro: petistas e bolsonaristas unidos contra o ex-juiz – (Andre Coelho/Getty Images)

A certeza dos petistas sobre a decisão do STF é tamanha que, nos próximos dias, o partido vai lançar o que vem sendo chamado de “Plano de Reconstrução do Brasil”, um documento que apresentará “soluções” para problemas das áreas econômica e social. Além disso, uma ala da legenda tenta fazer com que Lula retome as caravanas pelo Brasil. A ideia é começar justamente pelo Nordeste, o último bastião eleitoral do petismo, mas que vê a popularidade de Lula sendo minada pelo avanço de Bolsonaro na região. “O Bolsonaro está marcando a sua presença no Nordeste, e seria razoável que o Lula também fosse para lá”, disse um petista. A ideia é que o ex-presidente participe de agendas com governadores aliados. “O primeiro objetivo é que o Lula reapareça na cena brasileira como o principal líder da oposição. A questão eleitoral é apenas uma consequência disso”, conta o deputado Paulo Teixeira (PT-SP). Reservadamente, os petistas confidenciam não acreditar que Bolsonaro vá condicionar a indicação do novo ministro ao objetivo de prejudicar Lula. “A turma em volta do Bolsonaro tem todo o interesse em acabar com o Moro porque não quer vê-lo candidato em 2022, porque quer destruí-lo. Esse sentimento, unido ao Centrão, que também foi afetado pelas investigações, forma uma massa crítica para acabar com o ex-juiz. Isso já deixou de ser uma vontade só do PT”, avalia um cacique da legenda. Se ele estiver certo, o impensável aconteceu: Bolsonaro e Lula juntos, imbuídos de um mesmo propósito. Difícil de acreditar.

Jorge, André e Aras, os personagens do diálogo que abriu esta reportagem, são o secretário-geral da Presidência, Jorge Oliveira, o ministro da Justiça, André Mendonça, e o procurador-geral, Augusto Aras. Oliveira é apontado como o mais fiel dos auxiliares de Bolsonaro, uma indicação considerada “segura” para o Palácio do Planalto e aquele que poderia, a critério do presidente, sacrificar tanto Lula quanto Moro no julgamento da suspeição. André Mendonça não pertence ao círculo mais próximo do chefe, mas tem a seu favor o fato de ter uma sólida formação jurídica, bom trânsito entre os atuais ministros do Supremo e ser pastor evangélico. Em uma das poucas pistas que forneceu sobre o perfil do futuro ministro do STF, Bolsonaro disse que indicaria alguém “terrivelmente evangélico”. Dos três, Aras, ao que parece, é o menos cotado. Além de não professar a religião, como apontou um dos interlocutores da conversa, ele ainda está no primeiro ano de mandato de procurador-geral e no meio de uma batalha para dar equilíbrio e ponderação ao Ministério Público.

Continua após a publicidade
O ministro do TCU Jorge Oliveira e o advogado-geral da União André
BOLSA DE APOSTAS - Jorge Oliveira e André Mendonça: os dois mais cotados para assumir a próxima vaga no STF – (Carolina Antunes /Anderson Riedel/PR)

Em seu governo, Lula fez oito indicações ao Supremo. Escolheu a dedo o perfil dos candidatos seguindo critérios bem peculiares. Alguns corresponderam às expectativas. Outros, não. Ele se ressente principalmente de dois: Cármen Lúcia e Dias Toffoli. Enquanto presidentes do STF, ambos postergaram ao máximo o julgamento que acabaria por rever a possibilidade de prisões após condenação em segunda instância. Cármen se recusou a discutir o assunto nos dois anos em que ocupou o comando dos trabalhos do tribunal. Toffoli deu sinal positivo para o julgamento depois de o ex-presidente já ter amargado mais de 500 dias de cadeia. Bolsonaro, sabe-se, não quer ter surpresas com suas indicações. Quer fidelidade.

ASSINE VEJA

Covid-19 no Brasil: o pior já passou
Covid-19 no Brasil: o pior já passou Leia nesta edição: Queda na curva de mortes mostra sinais de alívio na pandemia. E mais: por que o futuro político de Lula está nas mãos de Bolsonaro ()
Clique e Assine

Publicado em VEJA de 16 de setembro de 2020, edição nº 2704

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 5,99/mês*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (equivalente a 9,98 por revista)

a partir de 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.