Presidente de comissão da reforma: ‘Guedes precisa de choque de humildade’
Marcelo Ramos classifica como 'desrespeitosa' afirmação do ministro a VEJA sobre deixar o cargo e o país caso mudanças na Previdência virem 'reforminha'
Presidente da comissão especial que analisa a reforma da Previdência na Câmara dos Deputados, o deputado Marcelo Ramos (PR-AM) classifica como “desrespeitosa” a declaração dada com exclusividade a VEJA pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre renunciar ao cargo e deixar o país caso as mudanças nas aposentadorias sejam convertidas em uma “reforminha”, com economia inferior a 800 bilhões de reais em dez anos. Para Ramos, Guedes precisa de “um choque de humildade”.
“A declaração é desrespeitosa com o presidente e constrange o presidente, que é chefe dele. O Brasil é maior do que ele, ele não é maior que o Brasil. O ministro Paulo Guedes precisa de um choque de humildade, ele precisa entender que é ele que trabalha para o Brasil, não é o Brasil que trabalha para ele. O ministro não está fazendo nenhum favor ao país”, disse o presidente da comissão a VEJA.
Em viagem a Pernambuco, o presidente Jair Bolsonaro declarou que Guedes “está no direito dele” ao cogitar a possibilidade de renunciar. “Ninguém é obrigado a ficar como ministro meu”, afirmou o presidente, que voltou a dizer que “haverá um caos na economia” se a reforma não for aprovada.
Ramos critica especialmente a declaração do ministro da Economia na qual cogita deixar o Brasil caso peça demissão do governo. “Pego um avião e vou morar lá fora”, disse Paulo Guedes na entrevista.
“O que é mais grave nessa história é que ele não diz só que se não for do jeito que ele quer ele vai deixar o governo. O mais grave é ele dizer que vai deixar o Brasil, é uma declaração desrespeitosa com o presidente e com o país. Não é só na política que se contribui com o país”, diz Ramos, para quem Guedes deveria “se dispor” a ir ao Congresso para explicar suas afirmações.
Marcelo Ramos relata ainda “nunca ter ouvido” de nenhum deputado em reuniões sobre a Previdência a ideia de economizar menos de 1,2 trilhão de reais com as mudanças em uma década, número mágico com que Paulo Guedes trabalha. Na entrevista a VEJA, o ministro conclui que, caso os parlamentares aprovem uma reforma que representa economia inferior a 800 bilhões de reais, “não há a menor possibilidade de lançar uma nova Previdência. Estaríamos só remendando a velha”.
“Eu quero crer que a mensagem do ministro não é dirigida à Câmara dos Deputados, que tem por parte do deputado Rodrigo Maia, da minha parte e do relator Samuel Moreira dado reiteradas demonstrações de compromisso com uma reforma célere e da ordem de 1 trilhão de reais”, critica Marcelo Ramos. Ele avalia, contudo, que as declarações do ministro “não contaminam” a tramitação da proposta no colegiado. “Nós não trabalhamos para Paulo Guedes”, conclui.
Na entrevista, Paulo Guedes ressaltou que Maia e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), “tomaram a liderança e estão a favor da reforma”. “A classe política está digerindo os novos métodos. Estou absolutamente otimista de que eles vão corresponder às expectativas da sociedade. Tenho absoluta confiança em que vai sair a reforma de 1 trilhão e que as revisões de crescimento para cima serão feitas a partir da reforma, que vai clarear um horizonte fiscal por dez anos”,
‘Brasil pega fogo’ sem reforma
Na entrevista exclusiva a VEJA, Guedes é muito claro: se houver uma mudança muito radical na proposta original da reforma, se aprovarem, como alguns defendem, uma espécie de remendo chamado jocosamente de “reforminha”, ele renunciará ao cargo. “Pego um avião e vou morar lá fora”, avisa. “Já tenho idade para me aposentar.”
“Se não fizermos a reforma, o Brasil pega fogo. A velha Previdência quebrou. Não vamos ter nem dinheiro para pagar aos funcionários. Vai ser o caos no setor público, tanto no governo federal como nos estados e municípios”, afirma Guedes. “A Previdência é hoje um buraco negro, que engole tudo ao redor. O déficit tem crescido cerca de 40 bilhões de reais por ano. A reforma é urgente, porque os mercados não vão esperar muito mais. Eles fogem antes. A engolfada pode vir em um ano, um ano e meio.”