PT prega boicote a eleição indireta, mas pode ter ‘anticandidato’
Como em 1985, com Tancredo, partido não quer que Congresso escolha presidente caso Temer caia, mas conversa com oposição sobre um nome para ‘marcar posição’
Mais de três décadas depois, o PT ensaia um novo boicote às eleições presidenciais indiretas pelo Congresso Nacional, a alternativa mais provável hoje para definir o sucessor de Michel Temer (PMDB) caso ele não resista ao turbilhão provocado pelas delações de Joesley Batista e outros executivos do grupo JBS e deixe o cargo.
Em 1985, o partido, que havia sido fundado quatro anos antes, decidiu não apoiar Tancredo Neves, então no PMDB, e candidato da oposição para enfrentar Paulo Maluf, então no PDS, o partido sucessor da Arena, grupo político que sustentou a ditadura militar. Naquela época, o PT havia participado ativamente da campanha pelas “Diretas Já” e considerava ilegítima a escolha do primeiro presidente civil, depois de duas décadas de ditadura militar, de forma indireta, ou seja, por deputados e senadores, e não pelo voto popular. Três dos oito deputados da bancada petista (Bete Mendes, José Eudes e Airton Soares) contrariaram a orientação partidária e acabaram expulsos da legenda. Tancredo foi eleito com 480 votos.
Desta vez, o PT insiste na tese de eleição direta caso Temer caia, hipótese que favoreceria o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, líder das pesquisas eleitorais, mas que não está prevista na Constituição – pela legislação atual, o novo presidente da República seria escolhido por meio de eleição indireta, pelo Congresso Nacional.
Apesar disso, o PT não descarta iniciativa em discussão em outros partidos da oposição, como PDT e PCdoB, de lançar uma espécie de “anticandidato”, alguém que claramente não teria chance contra o indicado pela base governista, mas que poderia marcar posição política na escolha do sucessor de Temer e tentar influenciar minimamente a agenda do governo de transição.
No PT, a “anticandidatura” em eventual nova eleição indireta tem apoio até mesmo de deputados da corrente Construindo um Novo Brasil (CNB), a mesma de Lula, como Vicente Cândido (SP). Segundo ele, o grupo ainda procura um nome para ser o “anticandidato” – o ex-presidente, porém, é totalmente descartado.
No PDT, a tese de uma “anticandidatura” tem apoio de deputados como André Figueiredo (CE), vice-líder do partido na Câmara. “Nossa primeira alternativa é eleição direta. Mas, se não conseguir, tem que participar da indireta. Não adianta ficar intransigente e virar as costas, porque acaba perdendo a chance de discutir uma agenda para uma transição e de reforçar posicionamento contra essas reformas”, afirmou o pedetista, que foi ministro das Comunicações do governo Dilma Rousseff (PT).
O deputado Orlando Silva (PC do B-SP) também defende que seu partido apoie uma “anticandidatura”, caso a oposição não consiga viabilizar uma eleição direta. “Seria para marcar posição política, como foi a candidatura do André Figueiredo na última eleição na Câmara”, afirmou. Na disputa pelo comando da Casa, em fevereiro deste ano, Figueiredo ficou em terceiro lugar, com 59 votos. O vencedor foi o atual presidente, Rodrigo Maia (DEM-RJ), com 293 votos.
Nelson Jobim
Figueiredo, Orlando e segmentos do PT admitem até que a oposição pode negociar apoio a uma candidatura de “centro”, desde que o candidato se comprometa a não votar as reformas ou pelo menos amenizá-las. Entre os pré-candidatos colocados hoje, o ex-ministro Nelson Jobim é o que mais tem apoio da oposição. “Seria um nome de acordo nacional. É difícil o Lula falar mal dele”, disse Cândido, vice-líder do PT na Câmara.
Há ainda na oposição quem defenda manter uma anticandidatura, mesmo que o candidato seja Jobim. Nesse caso, dizem oposicionistas, seria uma anticandidatura “menos agressiva”. Jobim foi ministro da Defesa entre 2007 e 2011, durante os governos de Lula e Dilma. Antes disso, foi ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) de 1997 a 2006, indicado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
Emenda por diretas
Dirigentes do PDT e do PC do B evitam falar publicamente sobre participação em eventual eleição indireta. O argumento é de que o foco por enquanto tem que ser em aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de autoria do deputado Miro Teixeira (Rede-RJ) que permite eleições diretas para presidente caso Temer seja cassado ou renuncie ao cargo. A matéria ainda está parada na Comissão Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, sem previsão para ser votada.
“Não vamos convalidar nem legitimar uma eleição com um Congresso corrupto desses, totalmente desmoralizado”, afirmou o deputado Ivan Valente (SP), vice-líder do PSOL na Câmara. Para ele, participar de uma eleição indireta apoiando uma anticandidatura ou uma candidatura de centro seria legitimar o processo. O PSOL tem uma bancada de seis deputados.
(Com Estadão Conteúdo)