A caçada nunca acaba
Um ex-policial americano conta a turbulenta história da perseguição ao mexicano El Chapo, um dos traficantes mais violentos e ricos do mundo
Confrontado com o número de homicídios dos quais os procuradores federais do México o acusavam, o traficante mexicano Joaquín Archivaldo Guzmán Loera protestou: “Treze mil? Não, talvez uns 2 000”. Qualquer que seja o número correto, é certo que El Chapo Guzmán, como se tornaria internacionalmente famoso, foi um dos arquitetos da escalada de homicídios que pôs o México entre os países mais violentos do mundo. Chefão do Cartel de Sinaloa, ele mandava matar quem ousasse atrapalhar o negócio que lhe permitiu, em 27 anos de crime, acumular uma fortuna estimada entre 14 bilhões e 21 bilhões de dólares. Depois de Pablo Escobar, El Chapo foi quem melhor conectou as regiões produtoras de cocaína na América do Sul com o mercado dos Estados Unidos. Preso pela primeira vez em 1993 — o ano da morte de Escobar —, ele seguiu comandando os negócios de dentro da cadeia, até fugir do presídio, pela porta da frente, em 2001. Converteu-se ali no traficante mais procurado do planeta. A caçada ao criminoso, só recapturado treze anos depois, é narrada pelo ex-policial americano Andrew Hogan no livro Em Busca de El Chapo, escrito com o jornalista Douglas Century.
Membro da DEA, a agência americana de combate às drogas, Hogan trabalhou por quatro anos no México, monitorando as intricadas redes de comunicação e logística do cartel. Aprendeu a decifrar os codinomes dos membros da organização e até a identificar, por certos erros de ortografia, quando El Chapo estava pessoalmente redigindo uma mensagem no celular. O autor por vezes resvala na vaidade, supervalorizando sua parte na história, mas também relata eventos de que não participou.
As várias tentativas de prender El Chapo formam a passagem mais empolgante da narrativa. Por várias vezes, agentes da DEA e militares mexicanos cercaram esconderijos do bandido — mas, quando invadiam o recinto, não havia mais ninguém lá. As casas usadas como base pelo traficante contavam com rotas de fuga bem planejadas. Em uma delas, a entrada para um túnel ficava escondida sob uma mesa de bilhar; em outra, um clipe para papel enfiado em um orifício na parede fazia uma banheira se erguer, dando acesso aos esgotos. A equipe de Hogan só teve sucesso em fevereiro de 2014, quando El Chapo baixou a guarda e se hospedou em um hotel à beira-mar, sem saídas secretas.
No ano seguinte, ele fugiria mais uma vez da prisão, por um túnel. Só voltou a ser preso em 2016 (Hogan não participou da operação), traído pelo coração: mandou trazer dos Estados Unidos a atriz mexicana Kate del Castillo, que havia sido a protagonista de uma série de TV na qual ela era chefe de um cartel. O encontro do casal foi monitorado pela polícia. El Chapo chegou a fugir do cerco, de novo por um de seus túneis, mas deu azar: foi pego em uma blitz de trânsito. Extraditado para os Estados Unidos, será julgado em setembro.
Hogan encerra seu livro com desalento. Depois de deixar a DEA acreditando ter cumprido ali a maior de todas a missões que um agente antidrogas poderia ter realizado, ele constatou que a prisão de El Chapo abriu um vácuo que foi imediatamente preenchido por outros bandidos. Ainda não surgiu outro pop star do crime como El Chapo, mas, como todo mundo sabe, é só uma questão de tempo.
Publicado em VEJA de 25 de abril de 2018, edição nº 2579
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