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A derradeira tentativa

A estratégia de defesa de Lula vai se basear no ataque ao juiz Moro. A acusação pedirá o aumento da pena

Por Ullisses Campbell
Atualizado em 4 jun 2024, 17h30 - Publicado em 19 jan 2018, 06h00

Durará quinze minutos a última tentativa da defesa de Lula de convencer a Justiça de que o juiz Sergio Moro errou ao condenar o ex-presidente por corrupção e lavagem de dinheiro em julho do ano passado. Moro sentenciou o petista a nove anos e meio de prisão por ter recebido de uma empreiteira um tríplex no Guarujá como contrapartida de favores prestados à empresa quando estava na Presidência e por ter tentado ocultar a titularidade do imóvel. O advogado Cristiano Zanin Martins dirá aos três desembargadores da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que a decisão de Moro tem de ser revertida com base em dois argumentos principais:

– Não existiriam provas de que o dinheiro desviado de contratos da Petrobras com a empreiteira OAS foi usado para presentear Lula com o tríplex;

– Tanto o juiz de Curitiba quanto os procuradores da Lava-Jato, além do próprio presidente do tribunal, Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, teriam sido parciais em suas manifestações sobre o caso.

Em relação ao primeiro argumento, o advogado sustentará que o próprio Moro reconheceu a inexistência de elementos ligando o tríplex a dinheiro ilícito vindo da Petrobras. Para isso, usará um despacho em que o juiz escreveu: “Este juízo jamais afirmou, na sentença ou em lugar algum, que os valores obtidos pela construtora OAS nos contratos com a Petrobras foram utilizados para pagamento de vantagem indevida para o ex-presidente”. O argumento da defesa de Lula será, nesse caso, essencialmente técnico: vai sustentar que havia uma decisão judicial segundo a qual Moro só podia julgar casos ligados ao escândalo da Petrobras e, se não há provas de que o tríplex é parte do escândalo da Petrobras, então o juiz deveria estar impedido de prolatar qualquer sentença no caso de Lula.

Sobre a tese de parcialidade dos julgadores, o advogado de Lula vai se concentrar em Sergio Moro. Citará como exemplo a negativa de Moro ao pedido de depoimento do ex-­tesoureiro do PT João Vaccari Neto na fase de instrução do processo. A defesa de Lula esperava que Vaccari, se depusesse, negasse ter sido o elo entre a OAS e o PT, desmentindo assim o empreiteiro Léo Pinheiro. “O processo foi conduzido do início ao fim com presunção de culpa, e a sentença reflete essa situação”, disse Cristiano Zanin Martins a VEJA. “A sentença é o resultado de uma análise baseada em especulações, convicções e sofismas, com nítida motivação política.”

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O ex-presidente tem se mostrado apreensivo com o resultado da próxima quarta-feira. Procura com frequência seus advogados para tirar dúvidas sobre o julgamento — pede para ler petições e quer entender termos jurídicos. Recentemente, perguntou o significado da palavra “jurisprudência”. Lula alterna uma agenda de viagens com a rotina doméstica em São Bernardo do Campo, onde tem sido visto na companhia de uma mulher que amigos dizem ser sua namorada. O casal frequenta bares nas proximidades da casa do petista.

Ele já questionou seus advogados se pode ser preso no dia 24, caso o Tribunal confirme sua condenação. Ouviu em resposta que esse desfecho é “impossível”. No início de janeiro, o mesmo tribunal que vai julgá-lo divulgou nota afirmando que a execução da pena só seria ordenada após a apreciação de todos os recursos na segunda instância (que é o próprio TRF4), fosse Lula condenado por unanimidade ou não. Isso não impede, porém, que o juiz Sergio Moro, depois de receber o processo com a eventual confirmação da sua sentença, peça o cumprimento imediato da pena.

A defesa de Lula bolou uma estratégia para ter mais tempo. Além dos quinze minutos que o advogado Cristiano Zanin terá para apresentar a defesa do ex-presidente, haverá os quinze minutos dos advogados de Paulo Okamotto, presidente do Instituto Lula, que também serão usados para defender Lula, oportunidade em que eles vão lembrar sua trajetória, a ser vendida como “heroica”, e dizer que ele sofre perseguição política. Okamotto pode dar-­se ao luxo de ceder seu tempo de defesa porque já foi absolvido por Moro neste mesmo processo e só figura na ação porque o Ministério Público Federal recorreu da sentença. Até substituiu seus advogados na última hora por dois deputados do PT formados em direito, Paulo Teixeira e Wadih Damous, e mais tarimbados para fazer discursos da tribuna. A acusação contra Lula será feita pelo procurador Maurício Gerum, que terá trinta minutos para a tarefa. Gerum vai pedir que a pena determinada por Moro seja aumentada e a sentença, executada.

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Não será a primeira vez que a defesa de Lula se apresenta diante dos três desembargadores do TRF4. No ano passado, Cristiano Zanin esteve lá em duas ocasiões para tratar da ação do tríplex. Na primeira, em maio, apelou ao tribunal para que autorizasse uma perícia que já havia sido negada por Moro — e teve o pedido novamente recusado, sob o entendimento de que a perícia era considerada protelatória e desnecessária. A segunda visita ocorreu em novembro e tinha como objetivo pedir a absolvição sumária de Marisa Letícia, morta em fevereiro. O Tribunal também negou o pedido, alegando que a acusação contra a ex-primeira-­dama já havia sido extinta.

Os argumentos de Zanin no processo do tríplex também não configuram novidade para o colegiado do TRF4, dado que o relator, João Pedro Gebran Neto, e o revisor, Leandro Paulsen, tiveram como base para elaborar seus votos os autos vindos de Curitiba. Os quinze minutos a que o advogado terá direito, portanto, serão um resumo de teses familiares aos julgadores. No momento em que o tempo se esgotar, porém, Lula nada mais poderá fazer para interferir nessa página de sua biografia. Restará somente a espera pelo anúncio da sentença — quando mais um capítulo da história do Brasil terá sido escrito.


Um PLANO B em perigo

Indiciado – Haddad: brados diante da má notícia
Indiciado – Haddad: brados diante da má notícia (Suamy Beydoun/Futura Press)
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Foi com perplexidade seguida de xingamentos em altos brados que Fernando Haddad recebeu em sua casa, em São Paulo, no dia 5 de janeiro, a carta que o informava de seu indiciamento pela Polícia Federal pelo crime de falsidade ideológica eleitoral (caixa dois). O comunicado estava assinado pelo delegado João Luiz Moraes Rosa, da Delegacia de Combate à Corrupção e Crimes Financeiros. Rosa preside um dos inquéritos resultantes da Operação Cifra Oculta, filhote da Lava-Jato que apura o uso de gráficas para o repasse de propina da Petrobras para políticos.

O ponto de partida da investigação foi a delação do empreiteiro Ricardo Pessoa, da UTC, um dos primeiros a confessar a participação no petrolão. Em 2015, Pessoa afirmou ter recebido de João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT, um pedido de dinheiro a ser destinado à campanha de reeleição do ex-prefeito de São Paulo. A UTC teria repassado à campanha 2,6 milhões de reais por meio de uma gráfica de fachada. Na semana passada, o petista disse que Pessoa não tem “credibilidade” para acusá-lo e que não há provas de nenhuma participação sua em atos ilícitos. A PF também indiciou o ex-deputado estadual pelo PT Francisco Carlos de Souza, responsável pelas gráficas, e o ex-coordenador de campanha de Haddad, Chico Macena, além do próprio Vaccari, preso desde abril de 2015.

Haddad deve sua eleição a prefeito de São Paulo em boa medida ao ex-presidente Lula. Foi dele a escolha de Haddad para representar o partido na campanha de 2012. Na disputa pela reeleição, em 2016, Lula subiu em seu palanque e apareceu na TV pedindo votos, mas Haddad não teve chance, já que João Doria, o atual prefeito, liquidou a fatura no primeiro turno. Atualmente, Haddad coordena o programa de governo da eventual campanha de Lula, cuja candidatura à Presidência depende do julgamento desta semana. Ele também é — ou ao menos era, até a semana passada — um nome para plano B do PT, caso Lula seja condenado e tenha a candidatura vetada pela Justiça. O outro nome na lista das apostas é Jaques Wagner, ex-­ministro do PT e ex-governador da Bahia. Na última pesquisa Datafolha que incluiu o nome de Haddad como possível substituto do ex-presidente (de dezembro de 2017), ele obteve apenas 3% das intenções de voto.

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Publicado em VEJA de 24 de janeiro de 2018, edição nº 2566

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