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A tabelinha eletrônica

É aprovado o primeiro aplicativo antigravidez — seguro, mas com eficácia inferior à da pílula e do DIU

Por Natalia Cuminale Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 17h39 - Publicado em 17 ago 2018, 07h00

A tabelinha é um dos mais antigos recursos contraceptivos, usada por mulheres desde priscas eras. Por meio dela, estima-se o período de fertilidade com base nos dias do ciclo menstrual. Com eficácia avaliada em apenas 70%, foi naturalmente substituída, com o tempo, por métodos mais modernos e seguros, como a pílula e o DIU. Agora, a FDA, a agência americana de medicamentos, avalizou a comercialização de uma curiosa invenção que atrela a singela contagem cotidiana a um aplicativo para smartphone. O nome comercial do produto, desenvolvido com tecnologia sueca, é Natural Cycles (ciclos naturais).

Desenhado para celulares, o sistema é alimentado por duas informações básicas: o ciclo menstrual e a temperatura corporal. Ancorado num algoritmo, o programinha calcula em quais dias do mês a mulher está fértil, e pode, portanto, engravidar. O funcionamento é simples. Todas as manhãs, ao longo do mês, a mulher deve medir a própria temperatura, pela boca, com um termômetro ultrassensível, vendido no pacote. Depois, ela põe os dados no celular, e pronto — tudo é calculado automaticamente. A explicação é fisiológica. Durante a ovulação, o organismo feminino aumenta a produção do hormônio progesterona, o composto-chave da gravidez (o nome vem do latim progestare — ou a favor da gestação). A substância eleva em até 0,5 grau a temperatura do corpo — o que é imperceptível por medições comuns. Se o resultado for verde, a usuária não estará ovulando. Se for vermelho, será contraindicado ter relações sexuais sem proteção. A assinatura do aplicativo, já em uso em países escandinavos, custa 50 dólares por ano.

A tabelinha eletrônica
PRECISÃO –  O sistema é alimentado por dados do ciclo e temperatura do corpo (//VEJA)

O programa, no entanto, não representa segurança total: a natureza não é tão lógica quanto a inteligência artificial. O corpo humano segue um ritmo biológico que pode ser impactado por algumas variações ambientais, como o stress, o tipo de alimentação, o consumo de álcool e o uso de remédios. O ciclo pode sofrer alterações. O Natural Cycles, dada essa pequena margem de incerteza, tem 93% de eficácia — ou seja, de 100 mulheres que o utilizam, sete podem engravidar. A pílula é 98% certeira. O DIU hormonal chega a 99,8%. “O índice desse novo produto pode ser bom, mas as estratégias já consolidadas ainda são mais seguras para quem não quer engravidar”, diz o ginecologista Márcio Coslovsky, médico da Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida.

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Não há hormônios envolvidos no aplicativo, como na pílula anticoncepcional. E essa é uma boa vantagem. Diz Eduardo Zlotnik, ginecologista do Hospital Albert Einstein, em São Paulo: “Um número cada vez maior de mulheres busca métodos contraceptivos naturais e sem intervenções”. As pílulas modernas são seguras, mas raramente isentas de efeitos colaterais. Aumento de peso, espinhas, alterações de humor e trombose estão entre eles. Os hormônios das pílulas anticoncepcionais, no entanto, revolucionaram o mundo. Surgidas na década de 60, elas foram o estopim da revolução sexual, dando às mulheres a possibilidade de controlar a própria reprodução, de fazer sexo por prazer e não apenas para reproduzir. “Uma das sete maravilhas do mundo”, na definição de uma reportagem da revista inglesa The Economist.

Publicado em VEJA de 22 de agosto de 2018, edição nº 2596

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