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De: José Antunes. Para: Coronel Lima

Uma mensagem confirma a operação arquitetada por um empreiteiro para ocultar o pagamento de propina de 1 milhão de reais ao amigo do presidente Temer

Por Thiago Bronzatto Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 17h40 - Publicado em 17 ago 2018, 07h00

O coronel João Baptista Lima Filho é investigado pela Polícia Federal como suspeito de captar dinheiro clandestinamente em nome do presidente Michel Temer. Ele apareceu pela primeira vez associado a negócios ilícitos em 2015, quando a Lava-Jato deparou com um esquema de corrupção na Eletronuclear. Durante a apuração do caso, o empreiteiro José Antunes Sobrinho, dono da Engevix, uma das empresas contratadas para construir a usina de Angra 3, procurou o Ministério Público para propor um acordo de delação — e se oferecia para entregar um peixe grande. Segundo ele, a Engevix repassou 1 milhão de reais em 2014 ao então candidato a vice-presidente Michel Temer para “suprir seus interesses” e manter boas relações com o então PMDB, que comandava politicamente a Eletronuclear. O dinheiro, não declarado, teria sido entregue ao coronel Lima, com base numa simulação de prestação de serviços. A história colocava Temer e seu amigo Lima na cena de um crime. Até agora, a tramoia estava apenas na palavra.

Mas acaba de surgir uma prova material de que o empreiteiro falava a verdade. VEJA obteve um e-mail que mostra que o repasse do 1 milhão de reais ao coronel ocorreu exatamente como o empreiteiro denunciou. Na mensagem, José Antunes e o coronel Lima combinam os detalhes do contrato de fachada. O próprio empreiteiro informa à Argeplan, empresa do coronel, a lista de serviços que ela supostamente teria prestado. Diz: “Caro Lima, os trabalhos desenvolvidos pela Argeplan foram os seguintes: projeto conceitual, projeto arquitetônico, projeto paisagístico…”.

O “serviço” a que a mensagem se refere resultou de uma triangulação. A Engevix acionou a Alúmi, da área de publicidade, para “contratar” a empresa do coronel para elaborar um estudo técnico para a instalação de painéis de propaganda na região do Aeroporto de Brasília. A Alúmi, então, pagou 1 milhão de reais por um “estudo técnico” que, na verdade, não passava de um compilado de informações, boa parte delas copiada da internet.

A maracutaia fica evidente quando se acompanha a cronologia do caso:

• Em 10 de agosto de 2014, as partes assinaram contrato para realizar o tal “estudo técnico”. VEJA teve acesso ao documento que traz essa data.

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• Em 28 de agosto — portanto dezoito dias depois —, o empreiteiro mandou o e-mail a que VEJA teve acesso agora. Na mensagem, além de listar os “serviços” que a Argeplan prestou, o empreiteiro se dirige a um representante da Alúmi, copiado no mesmo e-mail: “(…) manda as informações da sua empresa (refere-se à Alúmi) para que se produza um contrato ou a emissão da nota contra a execução dos trabalhos, os quais já foram desenvolvidos pela Argeplan, por minha conta e ordem”.

• Em 10 de outubro de 2014 — portanto quase dois meses depois de tudo isso —, o tal “estudo técnico” foi apresentado não pela Argeplan mas pela PDA Projeto, que também pertence ao coronel Lima. A reportagem da revista também obteve o estudo.

Coronel Lima
Entrada – O coronel Lima: contrato fictício para dar ares de legalidade a um negócio espúrio (Jefferson Coppola/VEJA)
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Trocando em miúdos, os envolvidos no caso entraram num confuso túnel do tempo. Primeiro (em 10 de agosto), assinaram um contrato para fazer um estudo técnico. Depois (28 de agosto), as partes se comunicam para reunir os dados para fazer o contrato (que teoricamente tinha sido assinado dezoito dias antes) a respeito de “trabalhos que já foram desenvolvidos pela Argeplan”. Por fim, os trabalhos que já tinham sido desenvolvidos (segundo o e-mail de 28 de agosto) apareceram como tendo sido prestados apenas em 10 de outubro. Ou as partes faltaram às aulas que ensinam a ordem dos dias e dos meses ou a Polícia Federal está no rastro certo.

A investigação da PF suspeita que o coronel Lima agia como preposto de Temer, arrecadando dinheiro com empresários para campanhas políticas e uso pessoal. Além do empreiteiro José Antunes, executivos da JBS revelaram, em delação premiada, que haviam entregado, a pedido de Temer, outro milhão de reais em espécie ao coronel nas eleições de 2014. Os policiais já mapearam os recursos que passaram pelas contas do amigo do presidente, mas não chegaram à conexão com Temer.

Depois de acusar o presidente, José Antunes Sobrinho recuou — como ele mesmo disse a amigos, fez isso para tentar salvar sua empresa, que passou a ser perseguida por órgãos de fiscalização do governo, como a Receita Federal. Recentemente, o empreiteiro esteve na PF em Brasília e divulgou que estava novamente negociando a revelação de seus segredos. Ele chegou a se reunir com os investigadores da Lava-­Jato, mas recuou de novo. Algo não deu certo — ou deu muito certo, dependendo do que José Antunes realmente pretendia.

Publicado em VEJA de 22 de agosto de 2018, edição nº 2596

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