Gloria Maria: “Não serei a boazinha”
A jornalista da Globo diz que não sabe viver na era do “politicamente correto” e explica por que não revela a idade
A senhora foi dos poucos colegas que defenderam William Waack quando ele foi suspenso da Globo por causa de uma expressão racista. Por quê? Convivo com William há anos. Nunca vi uma atitude racista dele. Ele sempre me tratou bem, com respeito, admiração. Por que eu falaria mal dele?
Houve outras controvérsias nas redes sociais, não? No Dia da Consciência Negra, postei uma frase atribuída ao Morgan Freeman. Dizia que deveríamos parar de pensar em consciência branca, negra ou amarela, e falar em consciência humana. Acho perfeito. Comecei na TV quando não se via preto na tela. Mas não existia o politicamente correto. As pessoas tinham uma posição e ponto. Sou do tempo do “nega do cabelo duro”. Elis Regina seria colocada num poste se cantasse isso hoje. De repente, com as redes sociais, você só pode dizer o que agrada a certas pessoas. Não sei viver assim, meu amor. Não serei a boazinha só porque algumas pessoas querem. Não tem sentido, nesta altura da vida, seguir a manada porque isso é legal.
Em um Globo Repórter de 2016, a senhora fumou maconha na Jamaica, e a imagem virou meme. Que tal foi a experiência? Pensei que fosse morrer. Estive na mais radical das comunidades rastafáris, com rituais de que a gente é obrigada a compartilhar se quiser entrar. Mulher menstruada nem pode participar. Tive de cobrir o cabelo. O ritual de despedida era fumar o cachimbo deles, um tipo de canudo de bambu cheio dessa erva. Fumei, pois quando estou trabalhando não posso ter medo. Faz parte do show.
Nos últimos oito anos, a senhora tem feito Globo Repórter, sempre viajando pelo mundo. É o trabalho dos sonhos? Meu trabalho não tem glamour. Sabe o que é percorrer um país em 22 dias, fazer oito horas de estrada, muitas vezes sem banheiro? É loucura.
Por que a senhora não gosta de falar da idade? Tenho uma teoria de que, quando você fala muito em idade e no tempo, atrai o tempo contra você. Para evitar problema, esqueço que ele existe. Nunca fiz plástica, nunca coloquei Botox, nunca entrei em academia. Faço pilates há vinte anos e sigo orientações de uma nutricionista e uma dermatologista. Minha avó morreu aos 104 anos, linda. Tenho tanta coisa para me ocupar, como a educação das minhas filhas. Você acha que eu vou me preocupar com o tempo?
Publicado em VEJA de 11 de abril de 2018, edição nº 2577