Lembrem-se de Yoani Sánchez
No Brasil, as atitudes intolerantes estão à esquerda e à direita
Quando se trata de ideologia, os extremos se encontram na intolerância, na insistência em calar os adversários em vez de tentar superá-los por meio do debate de ideias. No Brasil, as atitudes intolerantes estão à esquerda e à direita. O mais recente surto censor partiu da hoste conservadora e teve como alvo a americana Judith Butler, conhecida por seus escritos sobre gênero, que esteve em São Paulo para um seminário na terça-feira 7. Mais de 300 000 pessoas apoiaram, felizmente em vão, um abaixo-assinado com o objetivo de cancelar a palestra. Do lado de fora do evento, manifestantes ostentaram crucifixos, a Bíblia e cartazes de Judith com os dizeres “vá para o inferno”, em inglês. Um boneco que representava a filósofa foi incendiado aos urros de “queima, bruxa”. Um espetáculo reminiscente da agressão que a blogueira cubana Yoani Sánchez sofreu de militantes de esquerda em sua visita ao Brasil, em 2013. Infelizmente, ela chegou a ser impedida de falar em um dos eventos. “Persona non grata”, diziam os cartazes contra Yoani. A diferença entre os dois episódios reside no grau de coerência. A cubana elogiou o fato de os brasileiros serem livres para protestar. Judith disse que “a postura de ódio e censura é baseada em medo”. Mas ela própria assinou carta aberta, no mês passado, contra a participação de Marc Jongen, filósofo que integra o partido de extrema direita alemão AfD, em uma conferência nos Estados Unidos. Ah, a tentação da censura…
Publicado em VEJA de 15 de novembro de 2017, edição nº 2556