Empresas brasileiras estão à venda e vários grandes grupos já saíram à caça de bons alvos para aquisição. Em 16 de março foi anunciada a fusão da Fibria com a Suzano, operação que criou a maior empresa de celulose do mundo. O BNDES é acionista de ambas e, vale lembrar, a própria Fibria havia sido um dos “campeões nacionais” engendrados com capital do banco. O processo, entretanto, ainda deve passar pelo escrutínio do Cade, o órgão que examina e aprova movimentos que possam resultar em danos à concorrência. De fato, a entidade tem se mostrado bastante ativa no julgamento de aquisições. No começo do mês, o Cade já havia vetado a tentativa do grupo Ultra de comprar a Liquigás, empresa da Petrobras que vende gás de cozinha. Mais recentemente, embora tenha aprovado a compra da XP Investimentos pelo Itaú, o órgão impôs diversos condicionantes ao negócio.
No julgamento dessas compras, a principal preocupação é o poder que elas conferem às empresas por reduzirem a sua concorrência. No caso da Liquigás, por exemplo, a aquisição resultaria em uma empresa que dominaria cerca de 45% do mercado de gás de cozinha. O botijão poderia ficar mais caro porque as empresas teriam mais capacidade de influenciar preços ou quantidades. No caso da compra da XP Investimentos pelo Itaú, o Cade sugeriu medidas compensatórias para evitar o aumento de taxas e ações comerciais que amarrem os clientes das duas empresas. O caso da Fibria e da Suzano é um pouco menos preocupante na ponta da venda, pois se trata de grandes exportadoras. Mas ambas são compradoras relevantes no Brasil e fornecedoras de diversas empresas locais.
Do lado positivo, a criação de grandes empresas permite compartilhar custos, otimizar operações e transferir melhores práticas — as conhecidas “sinergias”. Várias fusões ocorrem justamente porque algumas empresas se tornam progressivamente mais eficientes e naturalmente veem oportunidade de abarcar mais fatias de mercado. Esse efeito positivo é particularmente importante quando maiores empresas adquirem competidores menos produtivos. Mais ainda, mesmo que um mercado se concentre em poucas empresas, é possível, em tese, arejar a concorrência com a atração de mais entrantes. Porém, como teria dito Tom Jobim, o Brasil não é para principiantes. O custo Brasil continua afugentando novos investimentos e criando vantagem para quem já está estabelecido no país há um bom tempo e conhece o caminho das pedras dos negócios.
Talvez seja realmente mais saudável para o Brasil se os atos de concentração setorial forem julgados com alto rigor, especialmente em se tratando de grandes empresas com vantagens naturais no contexto local. E isso pode, ao final, incentivá-las a continuar crescendo, mas de outra forma. Após o Cade vetar a compra da Liquigás, o grupo Ultra declarou que vai buscar oportunidades de expansão no exterior. Com tanta ânsia de crescer no Brasil, parece que muitos esqueceram que é possível também expandir-se com aquisições pelo mundo. Esses serão os verdadeiros campeões nacionais, crescendo em função das próprias competências em lugar de fazê-lo com ajuda do governo ou tentativas de atenuar a competição.
Publicado em VEJA de 28 de março de 2018, edição nº 2575