Apesar da crise e do pessimismo, um grupo de cidadãos agraciados com o Prêmio Veja-se mostra o que o Brasil tem de mais inspirador — gente inquieta
Por Diogo Schelp
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Atualizado em 4 jun 2024, 17h10 - Publicado em 15 dez 2017, 06h00
Teatro lotado - A cerimônia
de premiação do Veja-se: histórias inspiradoras de dezoito brasileiros (Antonio Milena/VEJA)
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Ele, que só foi conhecer energia elétrica aos 16 anos, resolveu inundar o sertão nordestino de fibra óptica. Ela, que trabalha no coração de uma favela conflagrada, fez uma das melhores escolas públicas do Rio. Uma outra decidiu cuidar não só do câncer, mas da alma de alguns pacientes e, a esta altura, já cuidou de 7 000. Uma terceira achou que deveria distribuir uma floresta de livros a crianças na região da Amazônia. As pessoas donas dessas e de outras histórias extraordinárias receberam o Prêmio Veja-se, na terça-feira 12, diante de 800 convidados, no Teatro Santander, em São Paulo.
Em face da crise econômica, que só agora começa a ceder, da interminável escalada da violência e de certo pessimismo, o Prêmio Veja-se, em sua primeira edição, tornou-se uma lufada de ar fresco ao evidenciar um dado promissor: há inúmeros brasileiros empenhados em construir um país melhor nos quais vale a pena se espelhar.
O evento — patrocinado por Vivara, Petrobras e Água Ama — foi apresentado pela atriz e escritora Fernanda Torres, encerrado com duas canções interpretadas por Claudia Leitte e reuniu três indicados em cada uma das seis categorias. Os vencedores foram escolhidos pelo voto popular, no site de VEJA, e por um corpo de jurados formado por Lilia Schwarcz (historiadora e escritora), Milú Villela (presidente do MAM de São Paulo), Artur Avila (matemático), Marcelo Gleiser (físico e escritor), David Uip (infectologista), Regina Ermírio de Moraes (presidente do Projeto Velho Amigo), Nizan Guanaes (publicitário), Claudia Costin (especialista em educação), Zica de Assis (empresária) e Lillian Witte Fibe (jornalista e colunista de VEJA).
Entre os seis vencedores, há um homem e cinco mulheres. São eles: Flávia Rezek (Educação), Roberto Nogueira (Inovação), Priscila Miranda (Saúde), Maitê Lourenço (Diversidade), Joice Toyota (Políticas Públicas) e Sylvia Guimarães (Cultura). Os vídeos de todos os dezoito indicados podem ser vistos no site de VEJA. Em seu discurso de agradecimento, o empresário Roberto Nogueira resumiu a essência do prêmio com a seguinte frase: “Tem muita gente que tem vontade de fazer alguma coisa e precisa apenas de um empurrão, um estalo”. Ao selecionar, divulgar, avaliar e celebrar projetos transformadores, o Prêmio Veja-se busca provocar exatamente esse estalo que faltava para que outros cidadãos se juntem ao esforço de construir um país mais justo.
Em um almoço em São Paulo, antes da premiação, os indicados trocaram experiências, descreveram as dificuldades que enfrentam no dia a dia e, espontaneamente, começaram, ali mesmo, a pensar em como podem se ajudar mutuamente, elaborando novos projetos e parcerias. Mal haviam se conhecido, já estavam se espelhando uns nos outros e tendo os estalos para as soluções de que o Brasil precisa. É um sinal eloquente de que a mera aproximação entre pessoas empenhadas em fazer a diferença produz, por si só, uma energia criadora — e novos estalos.
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1/6 Priscila Miranda - Montes Claros é a esperança de tratamento para moradores do norte de Minas Gerais, onde 193 000 famílias vivem em extrema pobreza. Quando chegava para trabalhar no hospital público da cidade, a oncologista Priscila Miranda, vencedora na categoria Saúde, deparava com pacientes que não tinham onde se hospedar nem o que comer. “Eu pensava: ‘Como uma pessoa vai vencer o câncer, se ela não tem comida, morfina, remédio para enjoo, se emagrece a cada ciclo de quimioterapia?’. Só resgatamos a dignidade e a saúde de uma pessoa quando olhamos para ela por inteiro”, diz. A inquietação levou-a a fundar, em 2004, a Associação Presente, que acolhe gratuitamente 32 pacientes carentes dos municípios próximos por vez. O lugar já recebeu 7 000 pessoas e funciona com doações de cidadãos e empresas. (Antonio Milena/VEJA)
2/6 Roberto Nogueira - Caçula entre dez irmãos, o vencedor na categoria Inovação sentiu a seca pela primeira vez aos 5 anos, em 1970, quando a família atravessou o ano dependendo de alimentação fornecida pelo governo do Ceará. Até os 16 anos, ele não sabia o que era viver com energia elétrica. Formou-se em eletrônica de rádio e TV por correspondência e trabalhou por vinte anos em São Paulo. Voltou para sua cidade, Pereiro, no sertão cearense, para empreender: abriu uma escola de informática e, em 1998, fundou a Brisanet, inicialmente oferecendo internet via rádio a municípios do interior. A empresa, que nos últimos anos levou fibra óptica a mais de sessenta cidades nordestinas, cresceu 80% desde 2016 e chegou à marca de 2 000 funcionários. “Na vida, aprendi a encontrar soluções para os problemas ao transformar a necessidade em negócio”, diz Nogueira. (Antonio Milena/VEJA)
3/6 Joice Toyota - Em 2013, ao acompanhar de longe os protestos no Brasil (ela fazia mestrado nos Estados Unidos), a vencedora na categoria Políticas Públicas decidiu realizar algo transformador com o mal-estar generalizado em relação à política. No ano seguinte, antes mesmo de ter nome, marca ou site, a organização que ela idealizou, o Vetor Brasil, atraiu 1 700 interessados em trabalhar no serviço público. Com o apoio de voluntários, Joice Toyota selecionou e capacitou doze trainees, que foram contratados por três governos estaduais e uma prefeitura. Hoje com sede em São Paulo e 150 trainees espalhados por 24 estados, o Vetor Brasil faz duas seleções por ano. Na última edição, houve 14 000 inscritos. O mote da organização, que põe quadros técnicos em cargos antes preenchidos por critérios políticos, é “seja você a mudança que quer ver no governo”. (Antonio Milena/VEJA)
4/6 Maitê Lourenço - No comando de uma startup especializada em recolocação profissional, a vencedora na categoria Diversidade notou que costumava ser a única empresária negra nos eventos de negócios que frequentava. “Sentia um incômodo em ver essa diferença, sabendo quanto eram importantes aqueles espaços”, recorda. Nasceu desse choque, há dois anos, a BlackRocks, empresa com sede em São Paulo que promove a ascensão de profissionais negros e pardos. “Não é uma ONG, mas um negócio que busca impacto social”, explica a psicóloga Maitê Lourenço. Cerca de 550 pessoas já passaram por seu programa de mentoria. Neste ano, ela realizou o Arena BlackRocks, evento que reuniu 400 participantes em palestras, workshops e mesas de discussão sobre carreira e empreendedorismo. Pela primeira vez, Maitê viu o predomínio de negros e pardos numa plateia tão grande. (Antonio Milena/VEJA)
5/6 Flávia Rezek - A vencedora na categoria Educação é responsável por uma façanha. Na favela do Jacaré, um dos mais ferozes campos de batalha das quadrilhas cariocas que disputam poder e território, floresce a Escola Municipal Rio de Janeiro: a instituição está entre as quinze melhores escolas públicas da capital fluminense, segundo o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Flávia Rezek começou a trabalhar na unidade como coordenadora pedagógica, em 2012, um ano depois do início do Programa Ginásio Experimental Carioca, que determinou que todas as unidades da cidade funcionassem em período integral. “Nossos professores passam o dia inteiro com os alunos. Acompanhamos a vida de todos de perto. Nem nos momentos de estudo eles ficam sozinhos”, diz Flávia, que, em 2013, assumiu a direção da escola, posto que abraçou com paixão e devoção. (Antonio Milena/VEJA)
6/6 Sylvia Guimarães - A vencedora na categoria Cultura fundou, há dezesseis anos, a Associação Vaga Lume, em São Paulo, que distribui livros e incentiva a leitura em 23 municípios na região da Amazônia. A Vaga Lume opera com o auxílio dos governos locais e de voluntários. A Secretaria de Educação ajuda no transporte, no alojamento e na alimentação dos educadores, responsáveis pela criação das bibliotecas. Cabe aos líderes comunitários e voluntários a missão de cuidar do acervo, destinado ao público infantil e infantojuvenil. A população recebe cursos sobre como estimular o hábito da leitura nas crianças. Atualmente, Sylvia Guimarães está pesquisando obras que tragam histórias da cultura negra. “Existem pessoas que conheci no início do projeto que hoje cursam letras e pedagogia. É bom perceber que fizemos diferença na vida delas”, diz Sylvia. (Antonio Milena/VEJA)
Publicado em VEJA de 20 de dezembro de 2017, edição nº 2561
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