A vida do Christopher Robin (1920-1996) de carne e osso foi cheia de amargura: quando ele ainda era pequeno, seu pai, o escritor Alan Alexander Milne (1882-1956), transformou-o em personagem dos livros infantis protagonizados pelo Ursinho Pooh e por outros bichos de pelúcia, condenando-o “à fama vazia de ser seu filho” e, conforme ele disse, roubando sua infância. Christopher só era feliz nas páginas; em casa, criado por uma babá, pouco convivia com o pai e a mãe distantes. Pooh, enquanto isso, virou uma indústria de sucesso estrondoso e duradouro. Até hoje, porém, à parte o biográfico Adeus Christopher Robin (2017), nenhum dos desenhos, filmes e livros que exploraram os personagens havia tratado da sombra que paira sobre a criação de Milne. É ela que dá o tom de Christopher Robin — Um Reencontro Inesquecível (Christopher Robin, Estados Unidos, 2018), já em cartaz no país.
Nesse misto de live-action e animação, o pequeno Christopher dá adeus com o coração apertado aos seus amigos quando parte para o colégio interno — ruptura inescapável para garotos ingleses de classe alta —, diz que nunca vai esquecê-los e, claro, os esquece. Os estudos, a II Guerra e então o trabalho fazem de Christopher (Ewan McGregor) um tipo sério e caxias. Nem para a mulher (Hayley Atwell) e a filha ele acha tempo. A angústia com uma crise na sua empresa, entretanto, faz com que Pooh reapareça e, com sua sabedoria singela, pouco a pouco encoraje o amigo a redescobrir a pessoa que fora um dia. Marc Forster, que já dirigiu de O Caçador de Pipas a Guerra Mundial Z, apoia-se nos cativantes McGregor e Hayley para sublinhar o que essa história tem de doce, sem carregar no cinza. O resultado é mansinho: algo como uma versão do Em Busca do Tempo Perdido de Marcel Proust para crianças.
Publicado em VEJA de 22 de agosto de 2018, edição nº 2596