Nós, mulheres, somos 51% da população, mas continuamos sub-representadas na política. Nas disputas municipais de 2016, a participação feminina cresceu substancialmente, porém os dados continuam alarmantes: são mulheres apenas 12% entre os prefeitos eleitos e 13% entre os vereadores. Temos de lutar para que esses números mudem. Porque não existe democracia sem todas, sem todos. Diante de mais uma eleição, é natural que eleitoras e eleitores se façam ao menos duas perguntas: toda mulher na política defende os direitos das mulheres e tem posições interessantes no que tange à igualdade de gênero? Quem quiser se juntar a essas lutas deverá votar nas mulheres independentemente de sua agenda pública, para garantir maior representatividade feminina, ou optar por candidatos homens que se comprometem com esses direitos?
Quanto à primeira dúvida, a resposta é: infelizmente não. Temos inúmeros exemplos de mulheres cuja trajetória pública está mais ligada ao machismo e à misoginia que a de muitos homens. A deputada estadual Cidinha Campos (PDT-RJ) foi candidata a vice-prefeita na chapa de Pedro Paulo (PMDB-RJ). Quando o candidato se viu soterrado por denúncias de violência doméstica contra sua ex-mulher (reveladas por VEJA), que foram cruciais para a aniquilação de suas pretensões políticas em 2016, a deputada minimizou as agressões. “Eu sou contra a violência doméstica, mas quando é com pessoas desvalidas, que não têm como se socorrer, que não têm como se amparar. Ela está bem, está feliz, ela está muito mais rica do que quando estava com ele”, disse Cidinha ao jornal O Globo. É desnecessário descer aos detalhes de como essa afirmação denota um entendimento equivocado sobre o que é violência de gênero. Mulher rica pode apanhar. Não dói, né, Cidinha? Com mulheres como ela no Parlamento, seguimos sub-representadas.
Desde a Grécia antiga, o espaço público pertence aos homens, e às mulheres, pessoas escravizadas e crianças coube o espaço doméstico. Algumas mulheres eleitas, apesar de desafiarem a máxima deprimente de que seu lugar é na cozinha, não lutam por causas que permitam às demais chegar aonde elas chegaram. Não nos levam com elas.
Ter uma agenda feminista e lutar pela igualdade de gênero abrange muita coisa. É possível apresentar plataformas ligadas a temas econômicos, à segurança pública, à educação, à saúde. Uma mulher pode brigar por tudo isso e, na essência, brigar por liberdade e igualdade. Só não pode, para ser uma candidata que defende os direitos das mulheres, desconhecê-los, ignorá-los, minimizá-los ou fazer uso de sua condição feminina para alavancar uma carreira pública que não empodere suas companheiras. E que, portanto, não nos faça amadurecer como sociedade democrática.
À segunda pergunta, então, fica fácil responder: vote em mulheres. Mas escolha, antes de tudo, candidatas ou candidatos comprometidos com os direitos delas. Nossos. É preferível votar num homem que nos defenda a votar numa mulher que esteja tão cega pelo sexismo que não defenda nem a si mesma.
Publicado em VEJA de 27 de junho de 2018, edição nº 2588