Empossado como o novo presidente de Cuba na quinta-feira 19, no lugar e com o endosso do ditador Raúl Castro, o engenheiro eletrônico Miguel Díaz-Canel, de 58 anos, terá de ser muito hábil para se manter no cargo. À frente do governo, ele não poderá fazer nada nem falar coisa alguma que desagrade aos militares e ao Partido Comunista, que continuará tendo Raúl Castro como secretário-geral até, pelo menos, 2021. E precisará, de alguma forma, atender às necessidades da população, que está crescentemente insatisfeita com o aumento da desigualdade econômica no país, em boa parte provocada pela adoção de duas moedas — uma conversível, a outra não. “Como ele não é um Castro e não participou da revolução de 1959, a sociedade o vê como alguém no mesmo nível, que pode ser cobrado livremente”, diz o historiador cubano Manuel Cuesta Morúa, que vive em Havana. “Ele terá de despachar olhando para cima, para baixo e para os lados.”
Díaz-Canel assume o posto em um momento delicado para Cuba. Com o fim da múltipla ajuda soviética seguido pelo fim do apoio financeiro da Venezuela, ela própria em crise aguda, a ilha ainda enfrenta a redução do turismo americano depois que Donald Trump chegou à Casa Branca. O pleito legislativo, ocorrido em novembro passado, que deflagrou o complexo processo eleitoral cubano, teve uma boa participação, ainda que mais baixa que em ocasiões anteriores. Um em cada quatro cubanos aptos a votar não compareceu às urnas. Mas, sem o carisma de Fidel, sem a história revolucionária de Raúl, Díaz-Canel ainda é pouco conhecido, em que pese o esforço da imprensa estatal de apresentá-lo à população nos últimos meses.
Apesar de ter apoiado uma discoteca com shows de drag queens nos anos 1990, ter usado cabelo comprido e apreciado os Beatles, ele endureceu depois que foi apadrinhado por Raúl e passou a ser preparado para assumir o mais alto posto do país. Em um vídeo que vazou em 2017, Díaz-Canel aparece em uma reunião do Partido Comunista atacando todos aqueles que considera contrários à revolução: jornalistas independentes, a Igreja Católica, os pequenos comerciantes privados, as embaixadas estrangeiras. Denunciou as redes de internet sem fio clandestinas e “El Paquete”, como os cubanos chamam os programas de notícias gravados em pen-drives ou discos externos e distribuídos de mão em mão. “Vamos fechar a plataforma digital deles. Podem armar o escândalo que quiserem. Podem dizer que censuramos. Aqui todo mundo censura”, disse o novo presidente.
Publicado em VEJA de 25 de abril de 2018, edição nº 2579