A diabetes, condição provocada por problemas na produção ou na absorção de insulina, hormônio produzido pelo pâncreas que auxilia nos processos de quebra da glicose e permite que tenhamos energia para manter o corpo funcionando, é uma das doenças crônicas mais prevalentes do planeta: atualmente, estimam-se 420 milhões de adultos vivendo com essa síndrome metabólica no mundo.
É também uma das condições que mais atingem os brasileiros – atualmente são 13 milhões de pessoas, segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes, com o país ocupando a sexta posição no ranking das nações com maior incidência de diabetes mellitus e na liderança entre os países da América do Sul e Central.
Além da hiperglicemia, a diabetes é um dos principais fatores de risco para doenças cardiovasculares como infartos, acidentes vasculares cerebrais (AVC) e entupimentos das artérias, principalmente das pernas e pés e pode colaborar na formação de aneurismas.
Quase 7 mil amputações
Mas além dos problemas cardiovasculares, existem ainda várias outras complicações que podem ser ocasionadas pela diabetes. Uma das mais graves é a amputação de pés e membros inferiores. De acordo com dados do Ministério da Saúde, só neste ano, de janeiro a agosto, foram registradas no Brasil 6.982 amputações, o que equivale a 28 por dia.
“As estatísticas e projeções acerca da diabetes são alarmantes e há um agravante: o número de diabéticos deve ser bem maior, já que por ser uma doença silenciosa, muita gente tem o problema e não sabe”, alerta Luiz Carlos Ribeiro Lara, presidente da Associação Brasileira de Medicina e Cirurgia do Tornozelo e Pé (ABTPé).
Segundo o especialista, estima-se que em cada cinco pacientes diabéticos, um não tem o diagnóstico e só descobre após uma complicação causada pela doença. “Entre todas elas, o pé diabético é considerado um problema grave e com consequências, muitas vezes, devastadoras em razão das úlceras, que podem implicar em amputação de dedos, pés ou pernas”, ressalta.
Ainda segundo o Ministério da Saúde, em todo o ano de 2019, na pré-pandemia, foram contabilizados 8.600 registros, passando para 9.279, em 2020 (+ 7,8%). Em 2021, foram 9.781 amputações e, no ano passado, 10.168 (+ 3,9%). De acordo com estimativas publicadas na revista científica Lancet, o mundo deverá ter 1,3 bilhão de pessoas com a doença até 2050.
No caso das amputações, o cirurgião explica ainda que uma das lesões que a diabetes causa é a neuropatia periférica, em que há perda da função dos nervos do pé, principalmente da sensibilidade dolorosa e tátil, que conferem proteção, dificultando a percepção do paciente em notar lesões ou feridas. “Sem a sensibilidade, as possíveis lesões podem evoluir rapidamente e formar bolhas e feridas abertas (úlceras), possibilitando assim a entrada de microorganismos e causar uma infecção no pé”, explica, acrescentando que em casos graves, é necessária a cirurgia para limpeza e desbridamento das lesões mais profundas ou até mesmo a amputação de dedos ou parte do pé para sanar a infecção. “Dependendo da gravidade, o tratamento pode ser imobilização por gesso, órtese ou até mesmo cirurgia reconstrutiva.”
Nas situações de infecção grave, a pessoa pode apresentar mal-estar geral e febre, e em outras vezes, pode manifestar-se apenas com o aumento das taxas de açúcar no sangue “Normalmente, nota-se abcesso, secreção purulenta, mau cheiro, área inchada e avermelhada, às vezes com áreas de necrose de tecidos. Chegar a esse ponto é muito preocupante, pois pode ser necessária a amputação para resolução do problema”, pontua o especialista.
Para evitar tal complicação, Lara recomenda o paciente diabético a tomar alguns cuidados como evitar andar descalço, usar meias de algodão sempre que possível e realizar um autoexame em busca de calos, úlceras, micoses e rachaduras, além de mantê-los hidratados para evitar rachaduras cutâneas e infecções secundárias. “Nunca tente retirar calos, limpar úlceras ou cortar as unhas sozinho. Identificando algo fora do normal, um especialista deve ser consultado”, conclui.
Complicações renais
Outra complicação da diabetes é a doença renal crônica (DRC), que silenciosamente lesiona os rins, podendo culminar na falência total dos órgãos, ou seja, a perda de 85% da capacidade de funcionamento. Quando isso ocorre, a vida é mantida pela terapia chamada diálise, até que se possa realizar um transplante.
No Brasil, cerca de 150 mil pessoas estão submetidas a tratamento de diálise, um aumento de mais de 100% nos últimos 10 anos. E dessas, uma em cada dez pessoas, com idades entre 20 e 79 anos, sofre de diabetes, segundo dados do Atlas do Diabetes da Federação Internacional de Diabetes (IDF 2021).
“Em uma primeira fase os rins são afetados pelo aumento da glicose do sangue que gera uma hiperfiltração e aumento das pressões dentro do rim, que aos poucos vai comprometendo a barreira de filtração e os vasos renais. Assim, eles passam a deixar passar proteínas que agravam a lesão e progressivamente vão levando a complicações de hipertensão arterial e insuficiência renal”, ressalta Lecticia Jorge, nefrologista da Fresenius Medical Care.
O diabético também é mais propenso à desidratação, a infecções e ao desenvolvimento de cetoacidose – estado grave no qual o corpo produz ácidos sanguíneos em excesso, o que o deixa mais predisposto à insuficiência renal aguda. “Mas é importante lembrar também que a maior parte das pessoas com diabetes não desenvolvem a insuficiência renal crônica. Tem que se cuidar, porque ninguém sabe quem vai desenvolver, o risco existe para todos os diabéticos”, pontua a médica.
Entre os sintomas mais comuns da diabetes estão o aumento e a frequência do volume urinário, sede exagerada e visão turva. “Alimentos com alto índice glicêmico, ou seja, que geram picos de glicose no sangue, como farinhas brancas, batata e açúcar refinado são responsáveis por jogar grandes quantidades de glicose no sangue”, explica Lecticia. “Com isso, geram a necessidade de uma liberação rápida de muita insulina para colocar esse excesso de glicose para dentro das células e que, muitas vezes, será convertido em gordura.”
A doença renal crônica é controlada com medicamentos, mas se atinge a fase 5 da doença, os pacientes devem fazer a diálise, e quando possível, um transplante de rim. “A glicemia, quando mal controlada, aumenta o risco de morte até mesmo nos pacientes que já estão em diálise. O controle rigoroso da diabetes é essencial para prevenir danos aos rins e outras complicações. Medir regularmente os níveis de glicose no sangue, manter uma dieta saudável e ativa, e seguir o plano de tratamento são passos cruciais”, finaliza a nefrologista.
Conscientização
Vale lembrar que no mês de novembro se intensificam as ações de conscientização sobre o reflexo da diabetes na saúde e mortalidade da população, com o dia 14 marcado como o Dia Mundial do Diabetes, criado em 1991 pela Federação Internacional de Diabetes (IDF) e a Organização Mundial de Saúde (OMS).