Câncer de pâncreas: Anvisa aprova novo medicamento para doença que vitimou atriz Lúcia Alves
Adenocarcinoma no órgão é desafiador, mas ganha um novo tratamento para formas metastáticas

Na última semana, o país foi surpreendido com a morte da atriz Lúcia Alves, vítima de um câncer de pâncreas, um dos mais mortais em todo o mundo. Esse tipo de notícia tem se tornado mais comum à medida que o número de casos da doença cresce no país, mas para tentar aplacar sua agressividade, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) acaba de aprovar mais um medicamento para formas graves desse tumor.
Chamado comercialmente de ONIVYDE, o irinotecano lipossomal peguilado ganhou registro nesta segunda-feira, 28. O foco será o tratamento de formas do câncer que são resistentes aos protocolos convencionais e já tenham atingido o estágio metastático – quando a doença se espalha por outros órgãos. “Essa é a primeira droga aprovada para o tratamento do câncer de pâncreas desde 2020”, disse a VEJA o oncologista clínico do A.C. Camargo Cancer Center, Tiago Felismino. “Isso é importante porque muitos casos desse tumor são diagnosticados já em estágio avançado.”
O medicamento é um antigo conhecido dos oncologistas. Há décadas o irinotecano é utilizado para o tratamento de diversas formas tumorais, mas, mais recentemente, a farmacêutica Servier desenvolveu uma versão aprimorada, chamada de lipossomal. Nessa formulação, a droga é encapsulada por uma membrana, o que faz com que sua eliminação seja mais difícil e ela chegue em maior quantidade ao tumor, aumentando sua efetividade.
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Os números surpreendem. Em um ensaio clínico com mais de 400 pacientes, pesquisadores testaram uma combinação do ONIVYDE com dois outros quimioterápicos para o tratamento de formas metastáticas e resistentes desse câncer. “A taxa de controle da doença e a sobrevivência em um ano são os dados que mais surpreendem”, diz Felismino.
De fato, os resultados, publicados em 2019, no European Journal of Cancer, mostram a eficácia desse tratamento. Enquanto apenas 24% dos pacientes na terapia convencional tinham a doença controlada, no grupo tratado com a nova droga esse número chega a 52%, com mais de um quarto dos pacientes conseguindo sobreviver um ano após o início da administração da medicação – um número alto para os padrões desta doença.
O tratamento ainda diminuiu o risco de morte e aumentou o tempo médio que a doença demora para se agravar.
Por enquanto ainda não se trata de uma cura definitiva, já que a nova terapia aumenta em apenas alguns meses o tempo de sobrevida do paciente em comparação com o tratamento anterior. Ainda assim, há motivos para comemorar. “Cada mês adicional de sobrevida é fundamental para os pacientes e os dados do estudo mostram, claramente, que estamos avançando em uma área onde as alternativas eram extremamente limitadas”, diz o oncologista.
Câncer de pâncreas
Esse tipo de tumor é historicamente um dos mais agressivos e mortais para os pacientes, mas o aumento recente no número de casos tornou mais urgente a busca por tratamentos alternativos e mais eficazes. Apenas no Brasil, estima-se quase 11 mil casos por ano, sendo o 14º tipo de câncer mais comum.
As consequências desse aumento assustam. Entre 2011 e 2020, houve um incremento de mais de 50% nas mortes causadas por essa doença, passando de 7,7 mil para 11,8 mil.
O grande problema está na natureza do câncer de pâncreas. “Os sintomas iniciais são inespecíficos, com dor abdominal, dor nas costas e uma perda de peso pouco significativa”, explica Felismino. Com isso, os pacientes demoram a procurar um especialista.
Mas não para por aí. Apesar das células do tumor serem muito agressivas, o que dificulta o tratamento mesmo com as terapias mais avançadas, o rastreio da doença é difícil e os sinais demoram para ficar intenso o suficiente para que o indivíduo procure um médico – o diagnóstico, portanto, é feito quando a doença já progrediu, muitas vezes tendo atingido outros órgãos.
Há muito trabalho pela frente, mas as coisas têm caminhado – e o anúncio mais recente é um atestado dessa evolução.