Fechar o diagnóstico de uma pessoa que vive com algum tipo de doença rara costuma ser um desafio relatado por pacientes e seus familiares. É uma saga marcada por consultas com diferentes especialistas, exames e opiniões divergentes que podem se arrastar por anos e até décadas. E o diagnóstico é crucial para a definição das linhas de terapias e cuidados para garantir qualidade de vida. Um novo relatório liderado pela prestigiada revista britânica The Economist e divulgado em meio às celebrações do Dia Mundial das Doenças Raras aponta uma grave situação na América Latina: 75% dos pacientes que vivem com as condições consideradas raras não têm diagnóstico definitivo.
Segundo o documento, o tempo médio para uma pessoa receber o diagnóstico preciso é de quatro a cinco anos entre os latinoamericanos. Na região, a estimativa é de que a população que vive com alguma doença rara, condição que afeta índices baixos dentro da população, está entre 40 e 50 milhões de pessoas. No mundo, são 450 milhões de pessoas que apresentam uma das 6 a 8 mil doenças raras conhecidas até o momento.
Intitulado “Uma faixa de cada vez: Aumentando a Conscientização sobre Doenças Raras na América Latina”, o relatório foi publicado na Economist Impact e, além de apresentar o panorama na região, propõe uma reflexão sobre a importância do diagnóstico precoce e de como vencer os desafios relacionados com o acesso a tratamentos, reembolso e políticas de saúde.
“Enfrentar a odisseia diagnóstica que dura anos é fundamental para garantir que os pacientes com doenças raras tenham vidas mais saudáveis, mais longas e mais gratificantes, diz, em artigo, Katya Chilikova, gerente da Prática de Políticas de Saúde da Economist Impact. “Embora tenham sido feitos progressos em países como o México, o Brasil e a Colômbia, a disponibilidade e o acesso a tecnologias de ponta em testes genéticos e ao tratamento de doenças raras estão longe de ser abrangentes”, avalia.
Alto custo do tratamento
De acordo com o relatório, o tratamento para as doenças raras é um dos mais caros no mercado de medicamentos e as drogas indicadas, conhecidas como medicamentos órfãos, podem ser cinco a 25 vezes mais caras do que remédios para outras condições. A pesquisa mostra que 88% dos medicamentos órfãos têm valor superior a 10 mil dólares por ano por paciente.
Com esses dados, o levantamento traz para o debate a questão da judicialização na saúde e usa como exemplo o Brasil, onde os casos levados à Justiça desencadearam pesquisas e políticas de desenvolvimento (P&D), além de parcerias público-privadas (PPPs) para a produção local de medicamentos prioritários para o sistema público de saúde, o SUS.
“Esta abordagem é, em parte, uma resposta diante do acesso limitado ao diagnóstico e tratamento de doenças raras, levando os pacientes a buscar recursos judiciais com base em sobre direitos constitucionalmente garantidos”, diz o documento.
“À medida que as doenças raras continuam a apresentar desafios complexos na América Latina, este relatório fornece uma visão geral do que está a gerar resultados abaixo do ideal, bem como apresenta políticas e intervenções inovadoras que estão a ter um impacto para os pacientes em toda a região”, diz Edgardo Vera, diretor de assuntos corporativos da AstraZeneca na América Latina. “Esperamos que esta pesquisa ajude a informar estratégias e colaborações à medida que as partes interessadas se unem para encontrar soluções”. A publicação foi patrocinada pela farmacêutica.
Doenças raras
As doenças raras englobam diferentes condições diagnosticadas em um número menor de pessoas em comparação a outras doenças, como câncer, por exemplo. Em artigo para a coluna Letra de Médico, o pediatra e infectologista Renato Kfouri traz a seguinte definição: “O conceito de doença rara, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), é qualquer doença que afete até 65 pessoas em cada 100 mil indivíduos, ou seja, 1,3 para cada 2 mil pessoas”. No Brasil, estima-se que 13 milhões de pessoas vivem com alguma doença rara.
Entre elas, estão: angioedema, artrite reativa, deficiência de hormônio do crescimento, anemia falciforme, doença de Gaucher, epidermólise bolhosa, esclerose múltipla, fenilcetonúria, fibrose cística, hepatite autoimune, leucemia mieloide crônica, lúpus eritematoso sistêmico, mieloma múltiplo, mucopolissacaridose e talassemias.
Os estudos apontam que 80% destas condições têm origem genética e 75% se manifestam durante a infância, principalmente na faixa de 0 a 5 anos. As doenças raras têm relação com cerca de 35% das mortes no primeiro ano de vida e 30% dos óbitos antes dos 5 anos.