A maior mudança na minha vida veio no dia 7 de novembro de 2015, quando eu e minha mulher recebemos a notícia devastadora de que meu filho mais velho, Frederico, na época com 9 anos, tinha um tumor no cérebro. Chamado meduloblastoma, é o tipo mais frequente de câncer cerebral na infância, acometendo cerca de 25 000 crianças por ano no mundo. Não é algo que tenha a ver com histórico familiar, é uma obra do acaso. O diagnóstico é feito por meio de uma ressonância magnética depois que o paciente começa a ter sintomas como dor de cabeça, vômitos e visão dupla. O tratamento envolve cirurgia, radioterapia e quimioterapia. E a doença ainda não tem cura. Digo ‘ainda’ porque é algo que vou encontrar.
Deveria ser proibido uma criança ter câncer. Se já é triste entre adultos, imagina em alguém que tem toda uma vida pela frente. Ainda em 2015, o Frederico fez uma cirurgia e, no ano seguinte, nos mudamos para Boston, nos Estados Unidos, onde ele se submeteu a um tratamento acompanhado por um dos maiores especialistas em tumores cerebrais pediátricos, o médico Roger Packer, do Children’s National Hospital. Ocorre que um terço dos pacientes tem recidiva. Foi o que aconteceu com meu filho. O tumor voltou em 2019 e ele participou de dois estudos clínicos com terapias experimentais nos EUA. Em 2021, conversando com o doutor Packer, entendi que realmente não existia mais nada que a medicina pudesse oferecer para tratar meu filho e outras crianças com a doença. Eles foram deixados para trás, submetidos até hoje a um protocolo terapêutico antigo, criado na década de 1980, que é ineficiente, tóxico e deixa sérias sequelas.
A única forma de tentar mudar essa realidade é investir na ciência. Fiz, então, uma doação de 3 milhões de dólares à instituição de Packer para acelerar a pesquisa e o desenvolvimento de soluções contra esse tumor. Impressionado com o que ele me apresentou, criei o The Medulloblastoma Initiative (MBI), ação filantrópica que busca recursos privados para a pesquisa em meduloblastoma e financia um consórcio com treze laboratórios, reunindo os melhores cientistas do mundo — gente que atua nos EUA, no Canadá e na Alemanha — para trabalhar de forma conjunta e sinérgica sob a coordenação de Packer.
Veja, eu tinha de fazer alguma coisa. Sempre vivi no Rio Grande do Sul, sou empresário do ramo da construção civil e, além do Frederico, tenho outro filho, o Henrique. Daí que encontrar a cura dessa doença se tornou a missão da minha vida. E estamos avançando a passos largos. Em três anos, conseguimos aprovar dois ensaios clínicos para tratamentos inovadores baseados em imunoterapia na FDA (Food and Drug Administration, a agência regulatória americana), algo inédito, extraordinário e fruto de um intenso trabalho colaborativo. Hoje, os investimentos já somam 10 milhões de dólares e continuo acompanhando tudo de perto. Vamos começar a testar os primeiros pacientes nos EUA e, se der certo, traremos a pesquisa para o Brasil, em primeira mão.
Quanto ao meu filho, em 2022, o câncer voltou novamente, mas ele fez uma cirurgia para a retirada do tumor, e está bem. Aos 17 anos, segue em tratamento. Felizmente, leva uma vida normal, algo diferente de tantos outros jovens que, em decorrência de tratamentos obsoletos, sem chances de buscar outros caminhos, podem apresentar efeitos colaterais graves, como problemas cognitivos ou mesmo um tumor secundário. Por essa razão e pelo meu filho, não vou descansar até achar a cura. Não digo ‘se’, digo ‘quando’ vou achar, porque essa é uma questão de tempo. É fato: nós vamos encontrar, tenho convicção.
Fernando Goldsztein em depoimento a Simone Blanes
Publicado em VEJA de 31 de maio de 2024, edição nº 2895