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“Esperamos ter a vacina em outubro para milhões de pessoas”, diz Pfizer 

Em entrevista exclusiva, Mikael Dolsten, líder científico da Pfizer, fala sobre os planos ambiciosos da empresa para controlar a pandemia de coronavírus

Por Giulia Vidale Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 12 jun 2020, 19h02 - Publicado em 12 jun 2020, 16h49

A aprovação de uma vacina eficaz contra o novo coronavírus é certamente o anúncio mais esperado do ano. A boa notícia é que cada dia que passa, estamos mais perto disso acontecer. Em movimento inédito na história da ciência, seis meses após o início da pandemia, 136 opções de imunizantes estão em desenvolvimento. Entre elas, dez já estão na fase de testes clínicos em humanos. Na edição desta semana, VEJA se debruça sobre essas pesquisas, inclusive sobre a inclusão do Brasil na fase mais avançada e mais importante de estudos clínicos sobre imunizantes, que busca comprovar sua eficácia.

Nessa busca, VEJA ouviu líderes e especialistas de empresas e instituições de pesquisa que estão à frente destes esforços avançados. Um destes especialistas é Mikael Dolsten, líder científico e presidente mundial de pesquisa, desenvolvimento e medicina da gigante farmacêutica americana Pfizer. Em estratégia única, ambiciosa e inovadora, a Pfizer já iniciou a fase de testes em humanos de não apenas uma, mas de quatro opções de vacina, na expectativa de escolher a mais segura e eficaz. Todas foram desenvolvidas em parceria com a BioNTech, empresa alemã de biotecnologia, e usa a inovadora técnica de mRNA, ou RNA mensageiro.

A empresa está entre os cinco projetos selecionados pelo programa Operation Warp Speed ​​do governo dos EUA para receber bilhões de dólares em financiamento e apoio federal antes mesmo de haver provas de que as vacinas funcionam. Além da vacina, a Pfizer também está dedicada em encontrar tratamentos eficazes contra a Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, e não poupa esforços nem investimentos nesta empreitada.

A previsão é gastar até 1 bilhões de dólares (cerca de 5 bilhões de reais) ainda este ano para desenvolver e fabricar uma potencial vacina. Mesmo antes de saber se uma de suas opções de vacina irá funcionar, a empresa já começou a preparar a linha de produção. Apenas nas fábricas e na compra de matéria-prima, o investimento foi de 250 milhões de dólares. Além disso, a empresa garantiu que o retorno do investimento não desempenhará um papel em seus esforços contra a Covid-19.

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Abaixo você confere a íntegra da entrevista exclusiva realizada por VEJA, por telefone, com Dolsten, que é médico e doutor em imunologia tumoral pela Universidade de Lund, na Suécia. Mikael fala sobre o programa Lighspeed, que conseguiu desenvolver diversas opções de imunizante contra o novo coronavírus em tempo recorde. Ele conta também como a empresa pretende cumprir seu objetivo ambicioso de entregar milhões de doses da vacina, caso ela seja aprovada, em outubro.

Quando a vacina da Pfizer estará disponível? Começamos a trabalhar na vacina no início de março, mas já tínhamos algum planejamento no final de fevereiro e eu estou muito orgulhoso de termos iniciado os estudos clínicos há algumas semanas [os estudos clínicos do imunizante da Pfizer começaram no início de maio, nos EUA]. Esperamos, se tudo ocorrer bem nos estudos clínicos e com as conversas com os órgãos reguladores, ter  vacina já disponível em outubro para milhares de pessoas e gradualmente aumentar a quantidade até chegar a 2021 com centenas de milhões de doses. Então é uma linha de tempo muito rápida. Nós chamamos essa linha de produção de Lightspeed (em tradução livre, Velocidade da Luz).

Como foi possível esse tempo tão curto? Há dois anos nós trabalhamos com uma empresa alemã de biotecnologia, a BioNTech, que está usando essa nova, rápida e flexível tecnologia de vacinas chamada mRNA. Quando os casos de Covid-19 se espalharam pelo mundo, pensamos que essa nova tecnologia seria realmente útil para a ameaça global. Esse foi um passo importante para reduzir o tempo. Temos também uma rede de fabricação tremendamente experiente, com polos e colegas na área de terapias biológicas com instalações em todo o mundo para colocar isso em prática. Evidente que tudo isso só será possível, repito, com bons resultados e apoio regulatório. Mas estou otimista dada a nossa experiência e resultados iniciais que têm sido encorajadores.

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Já houve um prazo tão curto assim no desenvolvimento de uma vacina? Nunca vimos algo parecido com o que estamos presenciando nos últimos cinco meses. Tantos cientistas, no mundo todo, trabalhando juntos. Temos hoje cerca de 10 opções mais promissoras de vacinas, 20 diferentes anticorpos monoclonais, provavelmente uns dez antivirais e muitos imunomoduladores. Então estamos falando de um pipeline [produtos que as empresas farmacêuticas ou de biotecnologia têm em processo de desenvolvimento e teste] de 60 projetos mais avançados, e muitos outros menos maduros, em tão pouco tempo.

Como será a distribuição da vacina? Ajustaremos a distribuição às necessidades em tempo real. Lutaremos para distribuir a vacina nas partes do mundo mais afetadas e onde houver mais risco para a sociedade e mais pacientes de risco. Temos uma organização de distribuição em todos os principais continentes e em centenas de países diferentes. Dessa forma podemos rapidamente trabalhar com agências reguladoras e organizações de saúde e elaborar planos de distribuição.

Pode-se dizer, então, que no Brasil, a vacina estará disponível até o início do próximo ano? Sim, provavelmente é uma boa estimativa. O Brasil foi fortemente atingido pela pandemia. Eu sinto muito pela população nesta situação e certamente esperamos que nossa vacina e outras opções terapêuticas possam ser usadas no país.

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LEIA TAMBÉM: A jornada pela primeira vacina contra o coronavírus no Brasil

Alguns especialistas alertaram que esperar uma vacina aprovada em apenas 18 meses é excessivamente otimista. O prazo da Pfizer é ainda mais curto. Como o senhor pretende colocar isso em prática? Creio que muitos especialistas que disseram isso trabalham em universidades ou são consultores que nunca estiveram envolvidos no processo de desenvolvimento de vacinas, como nós na Pfizer e em outras empresas que entregam vacinas para o mundo todo. Como já falei, usamos uma nova tecnologia muito mais rápida que a tecnologia tradicional. Número dois: colocamos em movimento recursos, em uma escala que nunca usamos antes. E é claro que há um objetivo ambicioso incluído. Você sabe, se você voar alto, talvez atinja a meta. Você se estica e consegue alcançá-la. É uma questão de desafiar nossos dogmas e maneiras de fazer e convidar outras pessoas para acompanhá-lo neste programa em velocidade da luz. E até agora, acho que é realmente possível, se os dados que geramos continuarem sendo encorajadores.

Quais pessoas poderão receber a vacina? Começamos os estudos com adultos de 18 a 55 anos e depois passamos para pessoas mais velhas porque sabemos que são os que ficam mais doentes e são mais vulneráveis à Covid-19. Pretendemos ter uma cobertura inicial para adultos de 18 a 85 anos, portanto. Em seguida, procuraremos oportunidades para imunizar crianças e adolescentes.

Uma vacina é de fato mais importante que um remédio nessa pandemia? Não gosto de rankings. Acho que são diferentes propósitos. Uma vacina é importante para poder abrir a sociedade de maneira mais segura. É crucial para que possamos voltar a uma vida normal. Os tratamentos são necessários para os pacientes que já estão doentes e para os quais a vacina é tarde demais. Além disso, sempre haverá pacientes que não foram vacinados ou que não responderam à vacinação. Mas leva tempo para lançar uma vacina para muitos bilhões de pessoas. Então, precisamos de tratamentos para as pessoas que estão morrendo agora. Eu diria que a vacina e os antivirais são os que têm maior chance de reverter e proteger, para que não precisemos de tratamentos em estágio final. Nós mesmos estamos analisando tratamentos como antivirais, imunomoduladores e anticoagulantes que podem ajudar rapidamente esses pacientes. Estamos entre os únicos com essa ampla abordagem, protegendo aqueles que não estão infectados, tratando com antiviral aqueles que estão no início da infecção e tentar normalizar as funções no sistema imunológico daqueles que estão avançando para um quadro grave para reduzir o risco de vida e o prolongamento da estadia no hospital. Mas tudo isso precisa estar alinhado com as medidas de saúde pública como o distanciamento social, controlar cuidadosamente como as pessoas se comportam e garantir que todos estejam cientes de como o vírus se espalha e de agir contra isso. E sempre que alguém estiver infectado, localizar essa pessoa, testar o ambiente à sua volta e isola-la. Então é um conjunto de medidas de saúde pública, vacinas e terapias. Não é um desafio fácil, mas às vezes ganhamos. Esta é a maior pandemia em cem anos. Mas estou convencido de que dezenas de milhares de cientistas em todo o mundo conseguirão encontrar a solução. E tenho muito orgulho de estar entre os pioneiros que trabalham com a Pfizer.

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Em que fase estão os testes com remédios? Os testes com antivirais, que atuam diretamente no vírus, provavelmente começarão em agosto. O foco inicial, como eu disse, será tratar aqueles que estão no hospital e em seguida teremos um segundo composto para tratar aqueles que ainda não estão no hospital, mas que têm febre em casa, correm o risco de piorar e precisar de cuidados hospitalares. Mas isso, acho que só em junho de 2021. Serão dois tipos de tratamento. Naqueles que estão no hospital é uma infusão e nos pacientes em casa seria um comprimido. Além disso, planejamos iniciar testes para os doentes mais graves com imunomoduladores e anticoagulantes e assim tentar impedir a progressão da doença.

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