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Estudo identifica 51 mutações associadas à esclerose lateral amiotrófica

Alterações foram mapeadas por grupo da Unifesp e podem ajudar em diagnóstico; do total, 13 aumentam o risco para a doença e 38 são protetivas

Por Luciana Constantino, da Agência Fapesp
11 set 2024, 09h48
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  • Usando técnicas de sequenciamento, pesquisadores conseguiram associar 51 mutações identificadas no genoma mitocondrial à esclerose lateral amiotrófica (ELA), doença incurável que afeta o sistema nervoso provocando degeneração progressiva e paralisia motora irreversível. Do total das variações, 13 aumentam o risco para ELA e 38 são protetivas. O estudo sugere ainda que essas variantes podem ser importantes para futuros testes e pesquisas sobre a doença.

    Vale lembrar que as mitocôndrias – organelas que produzem energia para a célula – possuem um DNA próprio (mtDNA), herdado somente da mãe. Mutações no mtDNA podem causar diversos tipos de doenças, quase todas afetando processos neuromusculares.

    Publicado na revista Muscle & Nerve, o trabalho analisou 1.965 genomas de pacientes do banco do Centro de Genoma de Nova York – o consórcio ALS, uma parceria de cientistas de 45 instituições mundiais voltada ao sequenciamento e estudo genômico da ELA – e outros 2.547 do grupo de comparação (os “controles”).

    “Identificamos que a nossa pesquisa é a primeira a associar as mutações no genoma mitocondrial à esclerose lateral amiotrófica. Fizemos uma análise interessante, com uma abordagem quantitativa. É difícil ter um volume grande de amostra para a doença. A nossa tem um perfil formado por pacientes americanos, de ascendência do Norte global. A literatura científica aponta que a ELA tem maior incidência em caucasianos e, no caso de afrodescendentes, apesar de não ser alta, geralmente é a forma mais grave, a bulbar”, afirma o biólogo Marcelo Briones, professor da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp).

    Autor correspondente do artigo juntamente com o pesquisador James Broach, da Faculdade de Medicina do Estado da Pensilvânia (Penn State College of Medicine, Estados Unidos), Briones ressalta à Agência Fapesp a importância dos achados.

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    “Não estamos dizendo que essas mutações causam a doença, mas sim que estão associadas. Podem agora fazer parte de painéis de diagnóstico e, quem sabe no futuro, serem usadas para estudos de terapia gênica. Fomos rigorosos nos dados e trabalhamos com valores de significância altos”, diz o professor, especialista em genômica e biologia molecular. O trabalho teve o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

    Olhar meticuloso

    O grupo analisou o genoma mitocondrial, que é um “pedaço” de DNA encontrado nas mitocôndrias das células, as organelas responsáveis pela produção de energia. Também conhecido como DNA mitocondrial (mtDNA), ele é único por ser herdado exclusivamente da mãe, ao contrário do DNA nuclear que é uma combinação dos pais. Entre as causas da esclerose lateral amiotrófica estão fatores genéticos e hereditários – cerca de 10% dos casos são provocados por um defeito genético. Na prática, os neurônios dos pacientes se desgastam ou morrem, deixando de “mandar mensagens” aos músculos.

    No Brasil, são poucos estudos epidemiológicos sobre a doença. Estima-se que o número de casos (prevalência) seja de 0,9 a 1,5 por 100 mil habitantes por ano, com o início dos sintomas ocorrendo, em média, a partir dos 55 anos.

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    Os pesquisadores usaram uma abordagem chamada de estudo de associação genômica ampla (GWAS, na sigla em inglês de genome-wide association study) para identificar pequenas variações genéticas – os polimorfismos de nucleotídeo único (SNVs ou SNPs). Ao comparar a frequência dos polimorfismos, se um SNP específico for significativamente mais comum nos pacientes do que no grupo de controle, ele pode estar associado à doença.

    Com isso, as 13 variações com aumento de risco para a doença foram localizadas em dez genes – HV1, HV2, HV3, RNR1, ND1, CO1, CO3, ND5, ND6 e CYB. As 38 mutações protetivas apareceram nos genes HV1, HV2, HV3, RNR1, RNA2, ND1, ND2, CO2, ATP8, ATP6, CO3, ND3, ND4, ND5, ND6 e CYB. Todas as variações têm valor-p menor que 10-7. As que aumentam o risco têm odds ratio (OR ou razão de risco, medida epidemiológica que estima a chance de um evento ocorrer) maior que 1, e as que diminuem, menor que 1.

    Na grande maioria dos casos, a ELA se caracteriza por não seguir um padrão “mendeliano” de herança genética. O principal fator nesse padrão é a herança citoplasmática, ou seja, fora do núcleo das células, cujo principal exemplo são justamente mutações nos genes do DNA mitocondrial. Essa é outra razão da relevância do trabalho.

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    “Como estávamos procurando associações, o objetivo ao aplicar GWAS foi realmente montar um painel de candidatos, dar um ponto de partida para quem vai procurar os alvos de terapia. Depois se faz um estudo de relação causal”, explica o matemático Fernando Antoneli, também professor da Unifesp e autor do trabalho.

    Ao lado do então doutorando João Henrique Campos e da bióloga Renata Carmona e Ferreira, o grupo foi introduzindo a abordagem na pesquisa. “Na época em que o João entrou no laboratório, começamos a olhar novas técnicas, entre elas GWAS, que estava sendo muito usada. O João, que é formado em enfermagem, foi dominando essas ferramentas e introduzimos na pesquisa. Desde o início dos anos 2000 trabalhamos com uma equipe realmente multidisciplinar”, completa Antoneli.

    Os pesquisadores brasileiros querem agora aplicar inteligência artificial para analisar os dados dos quais dispõem. Além disso, pretendem sequenciar amostras de uma coorte de pacientes do Brasil e comparar com as 51 mutações detectadas no estudo.

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