Desde que o novo coronavírus começou a se espalhar pelo mundo e o primeiro caso foi confirmado no Brasil na semana passada, as fake news sobre o assunto também se multiplicaram. De acordo com o Ministério da Saúde, entre 22 de janeiro e 2 de março o canal de combate às fake news do órgão recebeu 8.000 mensagens, sendo 90% sobre o coronavírus.
Após a confirmação do primeiro caso de coronavírus no país, no dia 25 de fevereiro, as mensagens aumentaram significativamente: foram 4.000 mensagens entre os dias 28 de fevereiro e 01 de março. As mentiras variam desde a origem do vírus até supostas curas e formas mirabolantes de prevenção. Abaixo, especialistas ouvidos por VEJA esclarecem as principais lorotas pseudocientíficas espalhadas sobre a doença nas redes sociais até agora.
1- Diagnóstico caseiro: circula pelas redes uma “dica” de diagnóstico caseiro. De acordo com a publicação, se você respirar fundo, prender a respiração por mais de 10 segundos e após fazer isso não tossir, sentir desconforto ou congestão, você não está infectado. E, não para por aí. A “notícia” ainda diz que esse é um método desenvolvido por especialistas de Taiwan e que a doença causada pelo novo coronavírus provoca fibrose nos pulmões.
“Essa história é completamente fake news”, diz o infectologista Helio Bacha, o Hospital Albert Einstein. “O autodiagnóstico em qualquer situação está errado. Mas essa é ainda pior porque a orientação não tem o menor embasamento. A Covid-19 [doença respiratória causada pelo novo coronavírus], é muito semelhante a um resfriado comum e não tem como distinguir ou dizer o causador por um exame clínico. O diagnóstico só é feito por um exame caro e sofisticado”, explica o especialista.
Em relação à formação de fibrose no pulmão, o pneumologista Elie Fiss, pesquisador sênior do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, esclarece que a fibrose pulmonar é uma doença inflamatória grave, sem causa definida. “Essa doença tem uma evolução até ser diagnosticada. Não aparece de uma hora para outra e não tem relação com nenhum tipo de infecção viral”, afirma.
2- Beber ou fazer gargarejo com água quente limpa o vírus da sua garganta: Outra notícia falsa que circulou bastante nos últimos dias é a recomendação de beber água quente ou fazer gargarejo com água quente para limpar o vírus da garganta ou elimina-lo do organismo. A suposta explicação por trás da prática é que o vírus não sobreviveria acima de 26ºC ou 27ºC.
“Fazer gargarejo com água quente no máximo provoca ânsia”, afirma o pneumologista Elie Fiss. Uma das respostas do nosso corpo a uma infecção viral, como a causada pelo Sars-CoV-2, é a febre. Ela é produzida pelo organismo para tentar matar o agente infeccioso e eleva a temperatura do corpo, que normalmente é de 36ºC a 37ºC, para 38ºC e 39ºC. E, mesmo assim, não elimina o vírus. Logo, se essa teoria fosse verdadeira, o coronavírus nem sobreviveria dentro do nosso corpo, que já tem uma temperatura normal superior a 27ºC.
“Para começar, se isso fosse verdade, não teria coronavírus na China. Os chineses têm o hábito de tomar água quente de manhã e também bebem muito chá. Além disso, o vírus não está na superfície da garganta. Ele está no interior da célula. Fazer algo que tenha uma ação apenas superficial, não resolve em nada”, explica o infectologista Helio Bacha.
3- Álcool gel não tem eficácia na prevenção, vinagre sim: Um vídeo publicado recentemente traz um “químico autodidata” dizendo que álcool gel não mata vírus nem bactérias, mas vinagre Ý sim, aquele usado para temperar salada – é eficaz. O burburinho foi tão grande que o Conselho Federal de Química (CFQ) publicou uma nota esclarecendo a eficácia do álcool gel para higienizar as mãos.
“O vírus é um organismo unicelular protegido por uma parede lipoproteica. O álcool consegue destruir essa parede, o que causa a morte do vírus. Por isso, o álcool gel é uma estratégia utilizada com eficácia em hospitais”, afirma o pneumologista Elie Fiss.
“Vinagre é bom na salada. Não tem o menor indício científico da eficácia do vinagre como antisséptico”, diz o infectologista Helio Bacha. Os dois especialistas ressaltam a importância de lavar bem as mãos com água e sabão como a estratégia mais barata de higienização e prevenção dessa e de outras infecções respiratórias. De qualquer forma, se você não puder lavar as mãos após entrar em contato com outra pessoa ou sair do trem, metrô ou ônibus, use e abuse do álcool gel.
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4- Chá de erva-doce cura o coronavírus: Outra lorota afirma que o chá de erva-doce é um tratamento contra o coronavírus, pois a planta teria a mesma substância que o Tamiflu (medicamento utilizado para tratar influenza). “Nunca ouvi falar que chá de erva doce cura alguma coisa. Muito menos que tenha Tamiflu nele”, diz o especialista do Hospital Albert Einstein.
Além disso, o Tamiflu é um medicamento específico para o influenza e não funciona para o coronavírus. “O Tamiflu bloqueia uma das proteínas do vírus influenza e não serve contra outros vírus. Além disso, ele não foi sintetizado a partir da erva-doce”, esclarece o pesquisador sênior do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.
5 – Chá de abacate com hortelã ou vitamina D previnem o coronavírus: A única forma de prevenir a infecção pelo novo coronavírus ou por qualquer vírus causador de doenças respiratórias, segundo os especialistas, é pela higiene constante das mãos com água, sabão e álcool gel, etiqueta respiratória (não tossir ou espirrar em cima de outras pessoas e proteger a boca e nariz ai fazer isso), evitar contato com pessoas com síndromes febris respiratórias e evitar aglomerações, se possível.
“Nenhuma vitamina tem valor terapêutico nessas infecções”, diz o infectologista Helio Bacha. Nem a vitamina C, cujo consumo é frequentemente associado à prevenção de gripes e resfriados. “Abacate em excesso engorda e hortelã é gostoso, mas o consumo desses alimentos, juntos ou separados, não tem efeito contra o coronavírus. Vale lembrar que a vitamina D previne osteoporose, apenas.”, ressalta o pneumologista Elie Fiss.
6 – O vírus é resistente em superfícies metálicas, onde pode se manter vivo por 12 horas: Os especialistas afirmam que até o momento, não há um consenso científico sobre quantas horas o vírus sobrevive fora de um ser humano. Além disso, o material da superfície – metálica, madeira, plástico – não tem influencia sobre o tempo de sobrevida.
“Como qualquer vírus, vai ter um tempo que o coronavírus sobrevive fora de um ser vivo, mas se a superfície for limpa adequadamente, não há risco de contaminação”, diz o pesquisador do Hospital Oswaldo Cruz. Mais um motivo para lavar bem as mãos, usar álcool gel e manter superfícies limpas.
7 – Há medicamentos específicos eficazes contra o novo coronavírus: Diversos tratamentos contra o novo coronavírus estão em fase de estudo clínico, mas até o momento, não há nenhum com eficácia comprovada. Mas isso não significa que deve haver pânico. O pneumologista Elie Fiss ressalta que a maior parte dos casos de infecção por coronavírus são leves ou moderados. “É como um resfriado. Hidratação e repouso já são suficientes para passar pela doença”, afirma o especialista.